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O homem que inventou o fundo do mar

Quase todo mundo já viu um filme de Jacques Cousteau. Quase todo mundo sabe que ele foi um ecologista de tempo integral e grande explorador dos oceanos. Mas aqui você vai conhecer um outro Jacques Cousteau: o cientista e inventor.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h14 - Publicado em 31 ago 1997, 22h00

Ricardo Balbachevsky Setti

A construção de um sonho passo a passo

Nas primeiras décadas do século, ainda não existia o interesse de hoje em pesquisar os ambientes submarinos. Mas alguns visionários já sonhavam com a possibilidade de desbravar o universo de água salgada. O tenente e ex-piloto de avião da Marinha francesa Jacques-Yves Cousteau, que morreu em junho, aos 87 anos, era um visionário.

Hoje, dá para dizer que foi Cousteau o grande inventor do fundo do mar, tal foi o seu empenho em conhecer os animais e as plantas que moram lá embaixo. Como filmou praticamente tudo o que viu, numa centena de expedições, ao longo de cinqüenta anos, o desbravador francês tornou-se o maior divulgador dos oceanos que já existiu.

Mas ele foi o inventor do fundo do mar por outro motivo: teve que inventar os seus próprios meios de passear pelo lado líquido do planeta. Em meados da década de 30, os equipamentos disponíveis eram caros, coisa para profissionais e de uso militar, fora do alcance dos amadores.

Sua primeira grande idéia, em 1936, nasceu com os óculos de mergulho feitos de resina de conchas pelos nativos do Taiti, na Polinésia Francesa. Depois de ver pela primeira vez o fundo do mar com esse artefato, Cousteau decidiu aprimorá-lo, criando a máscara de mergulho moderna. Depois, num passo mais ousado, bolou a câmera de vídeo submarina, considerada o seu primeiro invento de fato. Mas sua obra-prima só viria em 1943: o aqualung, um tanque de ar comprido, redondo, eficiente e simples. Com ele, o escafandro foi aposentado e entrou em cena o homem-rã, o mergulhador com total liberdade de movimentos.

Cousteau viu que não podia usar oxigênio puro no tanque, mas ar comprimido, e bolou uma válvula perfeita para controlar a saída desse ar para o pulmão do mergulhador. O resultado foi um aparelho genial, cujo desenho básico nunca teve que ser reformulado. Com ele, o francês ficou pronto para transformar o seu sonho de desvendar o oceano numa realidade para todos os homens.

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O cientista autodidata

Ele mesmo testava os efeitos dos mergulhos sobre o organismo.

“Mesmo sem ter publicado trabalhos técnicos, Cousteau ajudou bastante a ciência dos oceanos”, disse à SUPER Gabriel Gammé, médico que vive há dez anos só do mergulho. Para começar, ele investigou e filmou centenas de espécies de plantas, corais e animais subaquáticos, acumulando muitos dados novos. Além disso, fez observações inéditas sobre o organismo humano debaixo d’água. Com ou sem teoria, Cousteau fazia as coisas acontecerem, e muitas descobertas nesse campo só ficaram comprovadas depois dos testes práticos que realizou.

Um bom exemplo foram as tabelas de mergulho da Marinha francesa. Elas previam, entre outras coisas, que um cidadão a 30 metros de profundidade agüentaria a pressão da água por apenas 25 minutos. Aproximando-se mais e mais desse limite teórico, Cousteau comprovou a tabela. E foi o primeiro a experimentar a narcose pelo nitrogênio (que é misturado ao oxigênio nos tanques). Abaixo dos 30 metros, esse gás age como o álcool, dando a sensação de embriaguez. Num mergulho mais ousado, Cousteau conta que viu estranhas criaturas querendo empurrá-lo para o fundo. Tudo alucinação. Ao descrevê-la, e sobretudo por ter descoberto a sua causa no início da década de 40, prestou um inestimável serviço aos mergulhadores.

O oceano em imagens eletrônicas

Como a câmera de vídeo pôde mergulhar.

Logo após experimentar as máscaras de mergulho e passar a enxergar embaixo d’água, o explorador francês decidiu que teria que mostrar ao mundo tudo o que via. Para isso resolveu levar com ele uma filmadora. Em seguida teve a idéia de colocá-la dentro de um tubo de vidro bem lacrado. Para acertar o foco ele criou uma alavanca, usando apenas elástico e alfinete, com a qual podia acionar, pelo lado de fora do vidro, o mecanismo normal da máquina lá dentro. Estava inventada a caixa estanque para as câmeras de vídeo. Os aparelhos modernos, com todas as suas inovações, continuam sendo caixas de vidro com alavancas. A idéia ainda é a de Cousteau.

O jeito certo de navegar sem sujar o mundo

Em 1942, Cousteau comprou o Calypso, um barco superequipado com o qual, durante as quatro décadas seguintes, abriu caminhos para todos os cantos dos oceanos. Só em 1984 o francês e sua equipe resolveram aposentar a velha embarcação e, enquanto viajavam no recém-construído Alcyone, faziam planos para um novo laboratório flutuante, batizado antecipadamente de Calypso II.

Embora nunca tenha ficado pronto, esse projeto deu a Cousteau a chance de resolver um dilema importante. É que ele tinha adquirido uma aguda percepção de que era indispensável preservar os mares e, desde o princípio, quis que sua futura embarcação fosse totalmente ecológica. O que excluía a possibilidade de usar motores, uma fonte de poluição. Mas a alternativa óbvia, a das velas, pecava pela baixa eficiência. Assim, acabou criando uma inovação no campo da engenharia naval: o turbosail, que apresentava desempenho excelente sem emporcalhar o mundo (veja o infográfico).

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O turbosail aproveita muito melhor a força do ar porque o vento não tem que inflar as velas, como no sistema tradicional. Em vez disso, faz girar uma série de pás metálicas, ligadas a uma grande turbina. Experimentado pela primeira vez em 1983, o turbosail hoje movimenta o Alcyone.

A morte, em junho, interrompeu essa notável carreira de inventor, que Cousteau começou a exercitar aos 13 anos, ao tentar construir um carro elétrico. Pouco antes de morrer, ele declarou que ainda tinha muitos projetos por realizar. Mas eles vão ser tocados. É a promessa da Sociedade Cousteau, que ele fundou e agora fica nas mãos de sua mulher, Francine. E não só os projetos de engenharia. Segundo Francine, a sociedade vai dar continuidade também à missão de proteger os mares e conscientizar a população mundial.

Para saber mais

Cousteau – Uma Biografia, Axel Madsen, Campus, Rio de Janeiro, 1989

Na Internet

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Cousteau Societyhttps://acin.edi.fr/cousteau/cstius.htm

Liberdade ainda que tardia

Depois de muita pesquisa finalmente ficou pronto o aqualung.

Esmagamento gradual

Veja nesta escala que a pressão do ar na superfície é de 1 atmosfera, e que a cada 10 metros de água a pressão cresce de 1 atmosfera.

Segurando a pressão

O ar é colocado dentro do tanque com uma pressão de 200 atmosferas (200 vezes maior do que a pressão atmosférica ao nível do mar).

O papel deste primeiro estágio é reduzir a pressão a um nível intermediário, de 10 atmosferas. A saída do ar 1 fica fechada. Uma mola faz força para abri-la 2 mas é compensada pela pressão do ar na câmara da frente 3. Ao respirar, o mergulhador tira o ar da câmara, deixando a mola abrir a saída do ar.

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Enfim no pulmão

O segundo estágio é que coloca o ar na pressão ambiente. Chegando dez vezes mais forte do que o normal ele é impedido de passar por uma válvula 1. A respiração do mergulhador é que puxa o diafragma 2 e este, por sua vez, abre a válvula. Na superfície, a válvula deixa passar o ar a exatamente 1 atmosfera. Mais ao fundo, a água entra na câmara 3 e pressiona o diafragma, fazendo com que deixe passar mais ar.

Do ar para o mar

Jacques-Yves Cousteau nasceu em 11 de junho de 1910, em Saint André de Cuzbac, região vinícola da França. Sua primeira obra de engenharia foi aos 13 anos, quando inventou um carro movido a bateria. Aos 16 anos fundou sua primeira produtora de cinema. Começou na Marinha como aviador e um acidente de carro o tirou dos aviões. Ele saiu do ar para o mar. Em 25 de junho deste ano, morreu em Paris, de parada cardíaca.

As aventuras do barco mais famoso do mundo

Da marinha até as mãos de Costeau, o Calyspso já foi até balsa

Inicialmente criado para procurar e desativar minas na água, o barco J-826, da Marinha francesa, ficou sem utilidade depois do fim da guerra. Assim, foi vendido para o governo, que o empregou como balsa e o rebatizou de Calypso (apesar do que dizem as lendas, esse nome não foi escolhido por Cousteau).

Foi só em 1950 que o barco foi vendido ao explorador francês, que reformou-o para usá-lo em pesquisa. Era velho e construído de madeira. Em 1996, após uma barbeiragem no porto de Cingapura, o Calypso afundou. Resgatado, foi levado para a França, onde está em exposição.

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Ao morrer, Cousteau sonhava com o seu Calypso II totalmente ecológico, onde até o desenho do casco era feito para não ferir criaturas marinhas. A Cousteau Society promete terminá-lo até o fim de 1998.

Do aqualung ao turbosail

Veja como funciona uma revolucionária propulsão a vento.

Novo conceito de vela

Assim como os veleiros, esse motor aproveita a força do ar. Mas sua forma arredondada é capaz de captar as brisas de qualquer direção, sugando-as pelas grandes fendas laterais 1

Ventilador gigante

Estas grandes pás 2 são as primeiras a se mexer. E como estão dispostas em forma de parafuso, criam um movimento de ar ascendente dentro da “chaminé” 3.

Tensão no cano

Um grande cano passando por dentro das turbinas faz com que elas girem em alta rotação 4.

Pás externas

As pás externas das turbinas servem para puxar a água pela proa do barco e jogá-la para trás. Assim ele se desloca para a frente 5.

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