O IRA e o ETA, unidos, assumissem o ataque aos Estados Unidos?
A presença ostensiva de aviões, tanques e tropas sobre os céus de Madri ou de Belfast criaria um sentimento de revolta popular desastroso para as relações exteriores dos Estados Unidos.
Flávio Dieguez
Considerando todas as possibilidades, o governo americano teve sorte: bombardear o Afeganistão para perseguir assassinos é relativamente fácil. A probabilidade de provocar uma crise política mundial é pequena e contornável – como, de resto, está acontecendo. Mas já imaginou uma caçada contra os terroristas do IRA (Exército Republicano Irlandês, na sigla em inglês) ou da ETA (Pátria e Liberdade Basca, em basco)? Seria preciso um gênio da diplomacia para convencer franceses, alemães, belgas e holandeses da necessidade de despachar mísseis para cima da Espanha ou da Irlanda – com o risco de mutilar ou destruir prédios e monumentos onde está escrita boa parte da história européia. Para dar uma idéia do tamanho do problema: só muçulmanos, ou especialistas ocidentais, lembrariam o nome de um escritor afegão.
Mas, obviamente, não é possível esquecer irlandeses com a estatura de Jonathan Swift, Oscar Wilde e James Joyce, ou espanhóis não menos ilustres, como Miguel de Cervantes, Federico Garcia Lorca e Miguel de Unamuno. Se as torres do World Trade Center tivessem sido derrubadas por terroristas europeus, a busca americana por justiça teria de ser feita por meios menos agressivos e espetaculares. A presença ostensiva de aviões, tanques e tropas sobre os céus de Madri ou de Belfast criaria um sentimento de revolta popular desastroso para as relações exteriores dos Estados Unidos. Mesmo o governo inglês, que tem sido um aliado incondicional de todas as iniciativas americanas nas últimas três décadas, teria dificuldade de apoiá-la, nesse caso. Uma alternativa viável poderia ser uma invasão discreta e bem educada de forças policiais de elite americanas, trabalhando em colaboração estreita com as polícias locais.
A Europa, provavelmente, suportaria alguns meses de transtorno – normas estritas de segurança nos aeroportos de todos os países, para não falar nos museus e nas universidades irlandesas, nas praias e nas praças de touros espanholas. Tudo em nome do combate ao terror que, para o bem ou para o mal, é uma ordem com força universal nos dias de hoje. Mesmo assim, a paciência européia não duraria muito. Os americanos teriam que correr contra o tempo, tentando voltar para casa antes da pergunta fatal: e se, mesmo com a ofensiva, eles não achassem os terroristas (já que as próprias forças de segurança e serviços de inteligência europeus até hoje não conseguiram eliminar os grupos terroristas da Irlanda e da Espanha)? Quem iria pagar o pato?