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O último tirano

O comunismo havia tombado, mas ainda não terminara no inverno romeno. Apesar do frio e do medo, as pessoas encheram as ruas de protesto e enfrentaram a natureza cruel do ditador que já durava 24 anos no poder: Nicolae Ceausescu

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h24 - Publicado em 19 fev 2011, 22h00

Texto Celso Miranda

17 dezembro / Timisoara
Ao saber de mais um protesto por direitos humanos, Ceausescu ordenou que militares e a Securitate, a polícia política secreta, reprimissem a manifestação. Os soldados abriram fogo contra a multidão desarmada, provocando mais de 90 mortes. Por 3 dias, o general Stan­culescu promoveu um banho de sangue dos manifestantes. Os rumores do genocídio foram espalhados e o país todo foi tomado pela revolução popular. Segundo relatórios da CIA, a partir daí houve “um ciclo crescente de motins e de contrarrebeliões fomentadas pelo governo que foi aumentando de intensidade até que toda a aparência de ordem simplesmente desapareceu”, justificando a necessidade de evacuar o pessoal da embaixada dos EUA em Bucareste para a vizinha Bulgária.


21 dezembro – 12h31 / Bucareste

m resposta aos acontecimentos em Timisoara, Ceausescu convocou um comício que reuniu mais de 100 mil pessoas no centro de Bucareste (foto), acreditando que isso daria um fim à crise. Ele começou seu discurso na sacada do Comitê Central, transmitido ao vivo pela rede de TV estatal para todo o País.

Com 8 minutos de discurso, os ânimos mudaram, milhares de pessoas começaram a sair, a vaiar ou a gritar “Timisoara”. O povo nunca havia desafiado o ditador. Prevendo nova carnificina, muita gente que assistia pela TV resolveu que não iria admitir outra demonstração de truculência. Uma multidão cercou o Comitê Central e restou às tropas do Exército e da Securitae proteger o ditador e sua família. A TV estatal ainda transmitia quando se registrava a voz do Nicolae pedindo silêncio à multidão e, voltando-se para a mulher, Elena, dizia: “Sente-se e fique calma!”

22 dezembro – 12h00 / Bucareste
Ao meio-dia do dia seguinte os soldados que defendiam a entrada já se confraternizam com os manifestantes. O general Stanculescu retirou o casal Ceausescu do prédio às 12h09 de helicóptero enquanto manifestantes já no telhado observavam a fuga. Após o pouso, o casal caminhou até uma estrada onde Elena e conseguiu um carro para seguirem viagem. Enquanto isso os manifestantes tomaram a TV estatal e às 13 horas o poeta Mircea Dinescu anunciava que Ceausescu havia fugido. Capturado pelas forças armadas, o casal foi levado para um quartel em Targoviste, a 50 quilômetros de Bucareste.
Nos 3 dias que se seguiram, uma batalha feroz foi travada em várias cidades, entre a Securitate, fiel ao ditador, e os manifestantes, agora apoiados pelo Exército. Finalmente, os soldados e o povo dominam a Securitate, e muitos de seus membros são executados. Uma contrarrevolução ficou improvável.

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25 dezembro – 13h00 / Quartel de Targoviste
Nicolae e Elena rejeitaram por 3 dias as mirradas refeições que os soldados lhes traziam. Ceausescu nunca foi informado se estava preso ou estava ali para sua própria proteção. Na véspera, o líder da Frente de Salvação Nacional, Ion Iliescu, reunido com o general Stanculescu, sugeriu um julgamento civil, mas o general insistiu em um julgamento militar. Opção aceita pelos políticos após 3 horas de deliberações.
Ao meio-dia, 5 helicópteros com os oficiais do Exército e o próprio Stanculescu chegam a Targoviste. O que se segue é uma farsa. Meia hora depois, os soldados retiram Ceaucescu do carro blindado e o levam para uma sala de aula, onde ele passa por exames médicos, devidamente filmados para mostrar que o ditador estava bem de saúde antes de seu julgamento. Até aquele momento, o agora ex-ditador parecia acreditar que a chegada dos helicópteros tinha como objetivo tirá-lo dali em segurança junto com esposa.

25 dezembro 13h00 / Quartel de TargovisteA corte é reunida e começa o julgamento do casal. O ex-ditador não reconhece a legitimidade da corte e ri dos protocolos, afirmando: “Não sou réu, sou o presidente da Romênia”. A acusação é por genocídio em Timisoara e pelo roubo de propriedades, enquanto o povo estava na miséria. Elena, que quando o marido chegou ao poder era semianalfabeta e agora possuía os títulos de engenheira, cientista e acadêmica, reage ainda mais violentamente que ele. O julgamento dura 55 minutos e a corte decide por um curto recesso e retorna para a sentença: pena de morte. “Querido, não se preocupe, já estamos velhos”, diz uma Elena resignada. Os dois são amarrados e ouve-se a voz de Elena: “Não nos amarre. Não nos ofenda. Não me toque”. E Nicolae: “Tenho o direito de fazer o que quiser. Não nos amarre. Não!” Chorando, as últimas palavras foram de Elena, aos soldados: “Que vergonha! Cuidei de vocês como uma mãe! Parem!” Os tiros já tinham começado. O casal foi atingido mais de 100 vezes. Quando os disparos cessam, um médico se aproxima e examina os cadáveres. A câmera filmava Ceausescu e seu rosto para documentar ao povo romeno a morte do ditador. Elena não foi filmada morta. Era o final violento de uma ditadura num dia de Natal.

 

 

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