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Súditos do Eixo

A Segunda Guerra foi um tempo duro para ser alemão, japonês ou italiano no Brasil; até campos de concentração foram criados.

Por Tiago Cordeiro
Atualizado em 13 dez 2019, 15h07 - Publicado em 18 nov 2019, 15h06

Em Belém do Pará, multidões enraivecidas invadiam as casas dos imigrantes japoneses. Muitos se apresentaram à polícia se dizendo espiões. Não eram. Mas preferiam ir para o campo de concentração, na ilha de Aracá, distante 18 horas de barco da capital do Estado, do que tentar sobreviver ao ódio dos brasileiros.

Em Cerrito, no sul do Rio Grande do Sul, os alemães e descendentes eram perseguidos na rua. Quando surgiu o boato de que um para-raio instalado no teto da igreja local era utilizado para enviar sinais de rádio para Berlim, um grupo de moradores usou de dinamite para botar abaixo a construção.

Entre 1942 e 1945, episódios semelhantes se disseminaram pelo País. Onde quer que houvesse imigrantes alemães, japoneses e italianos, eram registrados casos de perseguição, agressão, ameaças e ataques a comércios e residências. Para piorar a situação, o decreto-lei 4.166, de 11 de março de 1942, determinava o confisco de bens de imigrantes ligados a países do Eixo. Propriedades, heranças, joias e depósitos bancários passavam a partir de então a ser monitorados e expropriados pelo governo brasileiro.

Tortura e suicídio

Em oito Estados (Pará, Pernambuco, Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul), o Ministério da Justiça manteve 31 campos de concentração, para onde foram enviados aproximadamente 3 mil imigrantes suspeitos de colaborar com o Eixo. Os locais foram adaptados a partir de fazendas ou mesmo hospitais (como aconteceu em Joinville, Santa Catarina). Em Pouso Alegre (MG) foram agrupados militares detidos na altura do Recife quando viajavam no navio Anneleise Essberger.

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O campo de Pouso Alegre (MG) reunia presos militares: os 62 marinheiros do navio Anneleise Essberger. (Reprodução/Divulgação)

Em raros casos, os detidos foram enviados para presídios comuns, em especial Ilha Grande e Ilha das Flores, no Rio de Janeiro. Em qualquer um desses locais, submetidos a condições insalubres e trabalhos forçados, os presos só foram liberados, lentamente, a partir do fim da Segunda Guerra.

Os detidos eram forçados a trabalhar, geralmente na agricultura ou abrindo estradas. Cozinhavam a própria comida e lavavam seus quartos e banheiros. Também vestiam uniformes padronizados, com números nas costas, para facilitar a identificação.

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Dentro dos campos, as torturas podiam ser recorrentes. “Em Itajaí e Joinville, eram presos basicamente os homens, que confessavam ser espiões sob tortura. Enquanto isso, há relatos de que as mulheres que ficavam em casa eram estupradas pelos policiais”, afirma o historiador Leandro Mayer, autor do livro O Retrato da Repressão: as Perseguições a Alemães no Oeste de Santa Catarina Durante o Estado Novo.

O pesquisador cita o caso de Antônio Kliemann, o único cidadão reconhecido como anistiado político durante todo o período do Estado Novo. Comerciante da região de Porto Novo, no extremo oeste de Santa Catarina, Kliemann foi preso. Seu caminhão então foi tomado pela polícia e utilizado para carregar outros detentos. Libertado ao fim da guerra, passou por três hospitais psiquiátricos antes de se suicidar.

A perseguição não se limitava aos alemães e japoneses nativos. Os descendentes também pagaram o preço, principalmente se seus parentes ou ancestrais estrangeiros ainda estivessem vivos. Ter relações familiares com Alemanha, Itália ou Japão passou a servir de pretexto para ataques mais sutis. Empresas, clubes, associações e órgãos públicos passaram a dispensar sócios, empregados ou colaboradores de origem alemã, italiana ou japonesa.

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Era difícil manter o emprego ou a vida social. Eram pessoas que haviam chegado ao País, muitas vezes décadas antes, com o sonho de recomeçar a vida. De um dia para o outro, se viram perseguidas. “Ainda hoje, em Porto Novo, aquele é um período traumático. Senhores e senhoras que hoje são idosos lembram com detalhes dos pais sendo presos, das mães atacadas e roubadas por guardas”, afirma Leandro Mayer. “Para essa geração, as feridas ainda estão abertas.”

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