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Três anos de fumaça cinza: os bastidores do conclave mais longo da história

Entre 1268 e 1271, os cardeais católicos levaram 34 meses para escolher um novo papa, divididos por uma guerra e por disputas políticas complexas.

Por Eduardo Lima
6 Maio 2025, 19h00

Nesta quarta (7), 133 cardeais da Igreja Católica vão participar do conclave, a eleição secreta para escolher o próximo papa. Eles ficarão confinados na Capela Sistina, no Vaticano (para não sofrer nenhum tipo de influência externa), e farão rodadas de votação até chegar no nome do próximo pontífice.

Para ser escolhido, o candidato deve conquistar dois terços dos votos, no mínimo. Os últimos conclaves até que foram velozes: os cardeais levaram dois dias para eleger Francisco (em cinco rodadas de votações) e Bento 16 (em quatro rodadas). Para comunicar a decisão, os líderes católicos usam a chaminé da Capela Sistina. Fumaça cinza significa que o Colégio dos Cardeais ainda não chegou a uma decisão. Fumaça branca significa que há um novo papa.

O primeiro uso registrado da fumacinha foi em 1903, que elegeu o papa Pio 10. A ideia surgiu no século 19, quando eles queimavam os votos das eleições que davam errado. Já o processo de conclave nos moldes atuais vem bem antes, no século 13, e começou porque a escolha do papa anterior demorou quase três anos.

A eleição papal de 1268 a 1271 foi a mais longa da história da Igreja Católica. Até escolherem o papa Gregório 10, a Igreja ficou sem líder por 34 meses – tudo por causa de disputas políticas internas entre os cardeais. Entenda o que alongou o maior conclave de todos.

Divididos

O papa Clemente 4 morreu em novembro de 1268. Antes de sua morte, as eleições papais aconteciam entre os cardeais, mas sem precisar da confinação e da confidencialidade que marcam um “conclave” (que vem do latim “com chave”). Até 1059, quando foi criado o Colégio de Cardeais, a eleição acontecia com o clero local e os crentes leigos, que não faziam parte da administração da Igreja.

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Tudo corria bem até a hora de escolher o sucessor de Clemente. Os cardeais franceses, partidários da dinastia de Anjou (família nobre do reino da França), eram favoráveis a uma invasão da Itália por Carlos de Anjou, que havia sido coroado rei de Nápoles e da Sicília por Clemente, que era francês.

Dá para imaginar porque o resto dos cardeais que não eram franceses (em sua maioria, italianos) não estavam confortáveis com a ideia de eleger um novo papa francês. Mas essa não era uma questão puramente nacionalista.

Na época, a Igreja estava envolvida em uma guerra. Clemente 4 foi eleito no meio de um conflito com Manfredo, rei da Sicília da casa dos romano-germânicos Hohenstaufen (aqui, vale lembrar que a Itália só se unificou no século 19; antes disso, toda a região da bota era formada por diversos reinos).

Por causa da briga com a dinastia, que não queria aceitar o papa como senhor feudal, Clemente exerceu seu papado na cidade de Viterbo, com medo de entrar em Roma. Depois que Carlos de Anjou conquistou Nápoles e Sicília, em 1266, o pontífice conseguiu viver mais tranquilo.

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Mas a guerra deixou marcas. Muitos criticaram Clemente pelos excessos de crueldade de seu protegido, mesmo que ele tenha desaprovado a violência. Os cardeais italianos não queriam mais influência de Anjou e da monarquia francesa na região, e por isso não queriam uma continuidade dos franceses na liderança da Igreja.

A votação para o sucessor de Clemente estava dividida. Eram 20 cardeais eleitores no total, e o número de italianos era suficiente para impedir uma vitória dos franceses, mas ninguém queria ceder. Demorou tanto que três cardeais morreram antes que os restantes decidissem quem seria o novo pontífice.

De acordo com a tradição, a eleição deveria acontecer na cidade em que o papa havia morrido. Eles votavam em Viterbo todos os dias e depois voltavam para suas casas. No fim de 1269, quando os encontros não tinham levado a nada, o prefeito de Viterbo mandou que os cardeais ficassem confinados dentro do palácio papal até que escolhessem o novo pontífice.

O teto do palácio foi retirado e a dieta dos cardeais foi reduzida a pão e água para tentar acelerar a eleição, provavelmente por ordem de Carlos de Anjou. Mesmo assim, os cardeais não chegavam a uma decisão conjunta. A solução, depois de muita pressão externa, foi escolher um comitê seis membros do Colégio para escolher o novo papa em 1271.

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Nesse petit comité, os apoiadores da dinastia Anjou foram escanteados e outras correntes políticas decidiram o próximo papa: Teobaldo Visconti, que não era um cardeal e estava, na época, na região da Palestina participando da Nona Cruzada. Visconti foi eleito em novembro de 1271, mas só chegou em Viterbo para ser nomeado papa em fevereiro de 1272. Ele escolheu o nome Gregório 10 para seu papado – e virou pontífice antes mesmo de ser ordenado padre.

Gregório 10 trabalhava pela Igreja sem atuar oficialmente como sacerdote. Apesar de italiano, sua eleição foi, em parte, uma vitória para os franceses, já que ele tinha uma grande proximidade com os cardeais da região.

Por causa das dificuldades políticas para escolher um pontífice, ele decidiu instaurar regras para a eleição. Começavam aqui, em 1274, os conclaves mais parecidos com os contemporâneos: na bula Ubi periculum, ele afirmou que todas as futuras eleições papais deveriam seguir o confinamento praticado em Viterbo (mas com telhado e uma dieta mais diversa). A ideia era acelerar a escolha e reduzir influência política externa.

Os papas que vieram depois, porém, não foram muito fãs desses conclaves a sete chaves. João 21, papa por menos de um ano entre 1276 e 1277, revogou seu decreto, e isso causou mais eleições bagunçadas e longas. Por causa disso, alguns papados depois o pontífice Bonifácio 8 restaurou as regras do conclave em 1294. Mas isso não impediu que novas brigas políticas entre representantes dos reinos da Itália e da França levassem a um conclave de 27 meses entre 1314 e 1316.

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Outro conclave longo aconteceu entre 1415 e 1417: a Igreja estava, há 29 meses, com três pessoas reivindicando o título de pontífice, e essa eleição demorada escolheu Martinho 5 para restaurar a unidade do catolicismo.

Entre os últimos dez papas, a eleição mais demorada durou cinco dias. Foi a que escolheu Pio 11 em 1922. Alguns cardeais acreditam que o conclave que elegerá o sucessor de Francisco vai durar de dois a quatro dias. A fumaça cinza não deve durar muito.

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