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Efeito estufa: do jeito que está, não dá para ficar

É impossível reduzir as emissões de gases do efeito estufa sem pôr um freio no crescimento da economia, afirma o inglês Tim Jackson

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 19h06 - Publicado em 30 nov 2008, 22h00

Estela Silva

A atual crise financeira global vem tirando o sono de muita gente – de trabalhadores angustiados com o fantasma do desemprego a investidores que amargam prejuízos com a queda da bolsa de valores, de empresários que estão arrancando os cabelos por causa da diminuição de seus lucros a governantes preocupados com a ameaça da recessão. Esse cenário sombrio, no entanto, é uma excelente oportunidade para as pessoas refletirem sobre as armadilhas do atual modelo econômico, baseado na busca obsessiva do crescimento. É o que diz o matemático e filósofo inglês Tim Jackson, professor de desenvolvimento sustentável da Universidade de Surrey, na região de Londres. Para Jackson – um estudioso das relações entre o estilo de vida e o ambiente –, se a economia mundial continuar a crescer no mesmo ritmo dos últimos anos, será impossível garantir a sustentabilidade das próximas gerações. Segundo ele, a atitude mais sensata que cada um de nós pode adotar para um mundo mais sustentável é comprar menos – já que as medidas adotadas até agora têm sido insuficientes para neutralizar as emissões de gases que causam o efeito estufa. “Acreditar que as emissões vão diminuir enquanto a economia continuar crescendo sem limites é a receita do desastre”, afirma Jackson na entrevista a seguir.

Qual é o papel da economia para a sustentabilidade do mundo?

Em geral, a economia trata do gerenciamento de recursos – humanos, naturais e financeiros. Uma sociedade justa e saudável, que viva dentro de limites ambientais definidos, precisa ter sustentabilidade econômica, na qual se concentram os recursos apropriados para várias gerações. No momento, nossa teoria econômica não funciona bem dessa forma.

Como ela funciona?

A crise financeira é um exemplo e um grande alerta. Ela demonstra que ainda não sabemos como lidar com a economia. A única maneira com que fazemos a economia funcionar é estimular cada vez mais consumidores a gastar com coisas de que eles realmente não precisam, o que compromete os recursos naturais e polui o ambiente. O problema financeiro mundial que veio à tona agora mostra que estamos na armadilha de um modelo econômico falido. E também se trata de um desastre em termos ecológicos. A boa notícia é que temos uma oportunidade única de tirar lições da crise e construir algo melhor.

O capitalismo é negativo para a sustentabilidade?

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Sim. Generalizando, a idéia do capitalismo irrestrito é uma das responsáveis por este caos que estamos vivendo. Achar que isso pode ser uma saída é um pensamento extremamente otimista.

Qual é a saída então?

O crescimento é essencial para o desenvolvimento das economias. A idéia de que podemos tirar 2 bilhões de pessoas no planeta da mais absoluta pobreza sem crescimento é claramente problemática. Isso significa que cada país pode continuar crescendo sem limites? Não acredito nisso. No momento, o crescimento é estruturalmente importante. Mas isso acontece porque uma economia em crescimento é estável, enquanto uma economia que pára de crescer corre o risco de entrar em colapso. É realmente importante construir novas macroeconomias, que encontrem uma forma de estabilidade que não esteja baseada no crescimento ilimitado.

Não parece tão simples. Em sua opinião, como deve ser a construção dessas macroeconomias?

Esse é possivelmente o problema mais importante do nosso tempo, mas ainda posso contar nos dedos de uma mão o número de pessoas que estão trabalhando com esse objetivo! A idéia mais aceita é que devemos continuar crescendo, mas isso não faz sentido. A crise financeira nos mostra que nem economicamente faz sentido. Imagine, então, ecologicamente. Para mobilizar uma mudança de fato na economia, o governo tem de liderar a iniciativa de diminuição de consumo e do crescimento. Não faz sentido pensar nisso se não houver uma contribuição das empresas e dos consumidores, pois cada um tem o seu papel. O papel do governo é a responsabilidade pela formulação da macroeconomia. Esta é uma das lições muito claras desta crise: quando as coisas vão mal, o Estado é o agente que está habilitado a resolver.

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É possível fazer a economia crescer e, ao mesmo tempo, reduzir as emissões de gases nocivos?

Sim, acredito que seja possível. Em algumas nações desenvolvidas já podemos observar algumas dessas tendências. Globalmente, o melhor que se observa é algo que está ainda em processo, onde as emissões vêm sendo controladas e seu aumento tem sido mais lento do que o ritmo do crescimento econômico. Temos como exemplo alguns dos países signatários do Protocolo de Kyoto, como o Reino Unido, que vem seguindo as regras de diminuição mundial, mas ainda não está atendendo às expectativas internas. Porém, em alguns segmentos produtivos, como nas indústrias de cimento, metais e bauxita, a tendência é pior que essa. Esses crescem acima da taxa de expansão da economia. Estamos indo para a direção errada! Acreditar que as emissões vão diminuir enquanto a economia continua crescendo é a receita do desastre.

Os recursos tecnológicos criados com o objetivo de diminuir a poluição e as emissões estão esgotados? Como eles podem contribuir para melhorar a sustentabilidade dos países?

Os avanços tecnológicos e de produtividade, em particular, são absolutamente vitais. Não podemos pensar em sustentabilidade sem eles. Mas eles são limitados em termos da eficiência que podem atingir. A má notícia é que, apesar dessas melhorias, não estamos diminuindo nossas emissões ou o consumo de recursos que impactam o ambiente. Seria necessário concentrar mais esforços numa política de investimentos para aumentar essa eficiência, a fim de substituir produtos e processos mais poluentes por outros menos poluentes.

Quanto deveria ser o crescimento mundial por ano para um ambiente sustentável?

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Muito difícil responder. O crescimento é claramente necessário por várias décadas ainda na maioria dos países em desenvolvimento, mas o ambiente de negócios atual, que acredita que o crescimento econômico deve ser 10 vezes maior até 2100, não tem credibilidade em termos ecológicos. Atualmente, já estamos acima do limite de emissões, já que, de acordo com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), deveríamos reduzir as emissões de carbono em 80% em relação à quantidade do ano de 1990 para prevenirmos a interferência no clima mundial.

Há muitas diferenças entre os países desenvolvidos e os em desenvolvimento?

Sim, as diferenças são enormes. Os países desenvolvidos deveriam assumir a liderança na busca de soluções reais para os problemas de sustentabilidade. Afinal, eles ainda são os maiores consumidores per capita de recursos e em emissões de poluentes. Os países pobres lutam com os poucos recursos que têm para aumentar os padrões básicos de sobrevivência. Os países ricos precisam dar o exemplo de crescimento às nações em desenvolvimento, se quisermos viver num mundo sustentável onde as pessoas possam ter um padrão de vida decente em qualquer lugar do planeta.

Você concorda com a maneira como os políticos vêm lidando com a questão da sustentabilidade?

Não, eles não têm feito o suficiente pela sustentabilidade. Embora as mudanças climáticas, finalmente, estejam recebendo a atenção merecida, ninguém está tratando com seriedade as limitações de recursos, como a biodiversidade, a segurança da água, o uso da terra, a segurança alimentar, o gerenciamento das florestas ou a conservação dos oceanos. E, certamente, estamos longe de dar atenção aos impactos sociais das economias não sustentáveis.

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Qual seria sua proposta para promover sustentabilidade e evitar a recessão global?

Ninguém sabe ao certo, mas alguns caminhos ajudariam, como redesenhar toda a economia, principalmente a macro. Não podemos acreditar num sistema de aceleração de consumo com o aumento de dívidas. Poderíamos também buscar mais equilíbrio entre consumo e investimento, mais flexibilidade no mercado de trabalho para facilitar o pleno emprego sem a necessidade de contínuo crescimento. Seria importante também desenvolver instituições internacionais fortes para regular o fluxo econômico e dar amplo apoio às nações em desenvolvimento na transferência de tecnologias que ajudem na diminuição de emissões. Outra sugestão seria ajustar procedimentos contábeis, nacionais e internacionais, para que se tornem adequados e beneficiem tanto as finanças quanto o ambiente, e reestruturar a sociedade para dar suporte aos produtos e serviços importantes para as comunidades, que devem estar capacitadas para prosperar – dentro de limites ecológicos claros. Talvez a recessão não seja o pior que vá acontecer para nós….

O que poderia ser pior que a recessão?

Pergunte à Rússia e à África. Um colapso no sistema social realmente traz perdas para o bem-estar humano, diminuindo a expectativa de vida, aumentando a mortalidade infantil e trazendo perdas para a unidade social, entre outros problemas. A longo prazo, isso é o que teremos de enfrentar se não construirmos um sistema econômico robusto e sustentável em termos ecológicos.

O que as pessoas podem fazer individualmente para que isso não aconteça?

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Comprar menos, ser mais eficiente no uso da energia, viajar menos de carro e de avião, economizar, fazer investimentos éticos e protestar!

Faça a sua parte

Como você pode contribuir para um mundo mais sustentável, segundo Tim Jackson

Compre com moderação

Pense duas vezes antes de comprar um produto. Você realmente precisa dele? Consumir menos é a atitude individual mais importante que você pode tomar para diminuir as emissões de gases causadores do efeito estufa.

Dedique-se a ações comunitárias

Não se deixe influenciar pelos anúncios publicitários. Para tirar da cabeça a idéia de fazer compras, você pode, por exemplo, passar mais tempo com a família e dedicar-se a atividades comunitárias.

Escolha bem os produtos

Já que vai comprar, dê preferência a produtos sustentáveis, como os eletrodomésticos que consomem menos energia. Evite o uso de sacolas plásticas e colabore para aumentar a reciclagem de embalagens.

Selecione o fabricante

Consuma produtos éticos, fabricados por empresas reconhecidas por adotar boas práticas no seu relacionamento com os parceiros de negócios, aí incluídos os clientes, os funcionários e os fornecedores.

Use o transporte coletivo e caminhe

Evite o transporte individual e utilize mais o transporte público. Se tiver de usar o carro para locomover-se no dia-a-dia, procure compartilhar a viagem com outras pessoas que fazem o mesmo roteiro. Caminhe mais.

Tim Jackson

• É mestre em filosofia pela Universidade de Western Ontario, no Canadá, e Ph.D em física pela Universidade de St. Andrews, na Escócia.

• Publicou estudos sobre a relação entre consumo, estilo de vida, bem-estar e ambiente.

• Desde 2000 é professor de desenvolvimento sustentável da Universidade de Surrey (a primeira instituição na Grã-Bretanha a criar um departamento voltado para questões de sustentabilidade).

• Paralelamente ao trabalho científico, é um premiado autor de dramas para rádio, as peças radiofônicas.

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