Call of Duty x Super Mario: só um deles faz bem para o cérebro
Passar algumas horas por semana jogando videogame pode ser benéfico ou traumático - e isso depende do tipo de jogo que você escolhe
É normal que jogos ao estilo FPS (sigla em inglês para “tiro em primeira pessoa”) deixem os pais mais zelosos com os dois pés atrás. Será que o fato de os filhos ficarem imersos em um mundo onde se deve matar para não morrer os deixará mais violentos? Até agora, a ciência diverge sobre a resposta. Apesar de pesquisas garantirem que sim, quem joga pode ficar até 4% mais agressivo, outras defendem que isso depende mais de fatores como histórico familiar e a saúde mental.
O problema é que mesmo os gamers mais pacíficos não saem totalmente ilesos quando optam por esse tipo de diversão. Um estudo publicado no jornal Molecular Psychiatry descobriu que o ato de jogar FPS pode fazer uma parte importante do cérebro diminuir de tamanho. A região que encolhe é o hipocampo, responsável por coordenar a orientação espacial, memória e os níveis de estresse.
Seria a demonização definitiva dos videogames – não fosse o fato do efeito contrário aparecer em jogos, digamos, menos intensos. Se você sempre preferiu as trilhas da saga Super Mario ao barulho de granadas e tiros, pode comemorar. Games estrelados pelo encanador bigodudo da Nintendo se mostraram uma forma eficaz de melhorar a cognição: em vez de perder massa cinzenta, quem preferiu salvar a princesa Peach registrou um aumento considerável na mesma área cerebral.
Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores fizeram dois experimentos diferentes. No primeiro, perguntaram a 33 fãs de FPS o tempo que gastavam jogando. Quem declarou passar pelo menos 19 horas por semana em frente às telas tinha o hipocampo menor, se comparado a uma pessoa que não tem costume de jogar.
A diferença no tamanho cerebral também apareceu quando os dois tipos de jogos foram comparados. 43 pessoas sem contato nenhum com os videogames aceitaram o desafio de passar 10 semanas jogando. Metade gastou suas 90 horas em títulos 3D da saga Super Mario, e os outros foram para a guerra com os famosos jogos de tiro em primeira pessoa Call of Duty, Killzone e Borderlands 2.
Diferentemente dos jogos mais simples, os FPS não exigem tanto do hipocampo – que, sendo menos estimulado, perde células e se torna menor. A área cerebral que fica mais ativa com os jogos de tiro, na verdade, é outra: o núcleo caudado. Esta parte do cérebro se relaciona o nosso sistema de recompensas. Por causa dela sabemos com precisão quando é hora de comer, dormir, ou outras coisas desse tipo, que nos mantém vivos e felizes.
O núcleo caudado também tem outra função importante: colocar nosso cérebro em “piloto automático”. Isso serve, por exemplo, para nos levar em segurança para casa pelo caminho habitual – sem ele, precisaríamos pensar toda vez qual o ônibus certo para pegar ou qual estação de metrô descer.
Durante os jogos de ação mais complexos, é como se ativássemos o recurso. Com o GPS indicando o local correto e com um caminho das pedras para cumprir o objetivo, não precisamos perder tempo memorizando caminhos e rotas. A tarefa é bem mais difícil quando a muleta é retirada: quem jogou Super Mario se deparou com um maior número de áreas e mapas a serem explorados – que os obrigavam a ir e voltar várias vezes ao mesmo lugar na mesma fase, procurando passagens e itens escondidos sem ajuda alguma. Isso os fazia ter de planejar mais a sua exploração, ao invés de se guiar só pelo que aparecia indicado na tela.
Segundo os pesquisadores, para que essas funções cerebrais não sejam prejudicadas pela jogatina, é ideal que os novos jogos não ignorem completamente a relação do jogador com o espaço – nem que isso signifique eliminar algumas facilidades tecnológicas. “Hoje os jogadores podem navegar sem problemas por uma rota totalmente adaptável, sem precisar marcar lugares e se lembrar de caminhos – o que é fundamental para o posicionamento espacial. Jogos de ação criados sem a função de GPS e facilidades que quem joga apenas segue, podem melhorar o senso de localização de quem joga”, defendem os pesquisadores a conclusão do estudo.