Lítio pode ser peça-chave no tratamento do Alzheimer, sugere estudo de Harvard
Cientistas descobriram que os cérebros com demência têm pouco desse metal – e que suplementos revertem a perda de memória em camundongos.
Mais lembrado por seu papel nas baterias, o lítio também é um velho conhecido da medicina: é usado no tratamento de depressão e transtorno bipolar, por exemplo. Agora, um novo estudo de cientistas da Universidade Harvard sugere que esse metal também pode ser uma peça-chave promissora na prevenção e no tratamento do Alzheimer.
Um estudo publicado na revista Nature mostra que pessoas com a doença apresentam menores concentrações de lítio nos tecidos cerebrais. Além disso, a suplementação do elemento reverteu os sintomas do declínio cognitivo entre camundongos, indicando assim uma nova linha de pesquisa que pode levar a novos tratamentos.
O lítio é o terceiro elemento da tabela periódica e é encontrado na natureza em doses baixas. O metal entra no nosso corpo pela dieta e pela água potável e, por razões que ainda não entendemos muito bem, funciona como um estabilizador de humor. Por isso, medicamentos à base de lítio são usados há décadas na psiquiatria para tratar depressão e outros transtornos.
Pesquisas feitas nos últimos anos já mostravam que o lítio poderia ter efeitos neuroprotetores e combater Alzheimer e outros tipos de declínio cognitivo, mas a questão permanece em aberto.
Em 2024, por exemplo, um artigo que contou com cientistas brasileiros descobriu que, em regiões onde a água naturalmente contém maiores concentrações do metal, os níveis de demência também são menores. Outros estudos mostraram que pessoas com transtorno bipolar que consomem remédios à base de lítio apresentam um envelhecimento mental mais lento. Mas foram poucos os ensaios clínicos que testaram esses medicamentos contra o Alzheimer, e eles apresentaram resultados mistos.
Agora, o novo estudo dos pesquisadores de Harvard traz a evidência mais forte até então sobre a relação entre o lítio e o Alzheimer. Por anos, os cientistas analisaram os tecidos cerebrais de pessoas idosas que morreram, incluindo indivíduos saudáveis, com Alzheimer e com declínio cognitivo leve, que costuma preceder um quadro mais grave de demência.
A equipe concluiu que o único elemento químico que variava entre os cérebros saudáveis e aqueles com declínio era o lítio, que aparecia em menor quantidade nos órgãos adoecidos. Não se sabe exatamente qual a função do metal nos nossos neurônios, mas é possível que ele tenha um papel importante.
Curiosamente, nos cérebros com Alzheimer, o pouco lítio que estava presente aparecia próximo das placas amiloides, os acúmulos de proteína característicos em órgãos com a doença. Apesar de décadas de estudo na área, ainda não sabemos exatamente o que causa o Alzheimer, mas a placa amiloide é uma das protagonistas da doença.
Uma hipótese levantada pelos cientistas do novo artigo é que as placas amiloides “suguem” o lítio do cérebro para si, e a falta do metal no restante do tecido cerebral cause, de alguma forma, o declínio cognitivo da demência.
Para testar a relação entre o lítio e o Alzheimer, os cientistas induziram as placas amiloides e os sintomas da doença em camundongos por edição genética. Depois, suplementaram a dieta dos bichos com uma substância chamada orotato de lítio. A suplementação impediu a formação de novas placas no cérebro dos roedores, mostraram os resultados. E não só: o declínio cognitivo dos camundongos – medido com testes que usaram, por exemplo, labirintos –, foi revertido após o tratamento.
Além disso, em camundongos cuja dieta era propositalmente pobre em lítio, os sintomas de Alzheimer e as placas amiloides apareceram mais cedo, e com mais força, do que em camundongos com uma dieta padrão.
Um detalhe importante: os resultados positivos só foram observados quando o suplemento usado era o orotato de lítio. Carbonato de lítio – a forma mais comum em medicamentos para bipolaridade e depressão – não teve um efeito considerável, possivelmente porque era “sequestrado” pelas placas amiloides. Isso pode explicar, inclusive, porque estudos anteriores que exploraram a relação entre lítio e Alzheimer foram inconclusivos: a maioria usou essa versão do elemento.
O novo estudo sugere que a investigação do lítio pode abrir um caminho para novos tratamentos contra a demência, doença que afeta quase 60 milhões de pessoas no mundo (o Alzheimer é a forma mais comum). Mas vale lembrar: o estudo foi feito em camundongos, que são muito diferentes dos humanos. Este é o primeiro passo de uma linha de pesquisa promissora, mas ainda incipiente.
Nada de suplementar lítio por conta própria, então: os medicamentos à base do metal usados na psiquiatria, por exemplo, podem ter efeitos colaterais graves.
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