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Como Sebastião Salgado plantou uma floresta do zero – e salvou 2 mil nascentes

Em 1998, o fotógrafo e sua esposa começaram um projeto para recuperar a fazenda onde ele havia nascido. Hoje, o Instituto Terra é uma das mais importantes ONGs brasileiras.

Por Bela Lobato
Atualizado em 26 Maio 2025, 11h47 - Publicado em 23 Maio 2025, 18h24

Em 1998, depois de uma temporada no exterior para a produção do projeto Êxodos, o casal Sebastião Salgado e Lélia Wanick retornou ao Brasil. A essa altura, o trabalho de Salgado já era reconhecido mundialmente pela sensibilidade de suas fotografias. Eles haviam visitado 35 países, alguns deles palcos de guerras, genocídios, e outras tragédias humanitárias, para contar histórias de pessoas e povos forçados a se deslocar. 

Ao visitar suas famílias, o casal não estava preparado para o que encontraria na Fazenda Bulcão. A propriedade onde Salgado cresceu em Aimorés, no interior de Minas Gerais, havia sido completamente degradada pelos pastos; o solo estava árido e exposto. 

Onde antes havia rios, sombra e animais, só se via secura. A eventual chuva não trazia alívio, já que provocava uma enxurrada agressiva que arrastava a terra e fazia buracos. Depois de anos vendo e retratando guerras e sofrimento humano, o casal chorou diante da enxurrada na terra natal.

Wanick, comovida, sugeriu ao marido: “vamos plantar uma floresta aqui?”. A ideia mirabolante, que ela c0nsidera a melhor de sua vida, se provou cada vez mais complexa. 

Fotografia de Sebastião Salgado e Lélia Wanick Salgado.
O casal Sebastião Salgado e Lélia Wanick Salgado. (Christian Ender/Getty Images)

“Claro que naquela hora, na minha cabeça, a gente sairia de férias para plantar um bando de árvores. De repente, não era nada disso” contou Wanick em uma entrevista de 2015. “Plantar uma Mata Atlântica é muito difícil, depende de muito tempo, muitas variáveis, muitos fundos e, sobretudo, muita gente para ajudar.” 

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Em um primeiro cálculo, um engenheiro florestal apontou que seriam necessárias 2,5 milhões de árvores para encher os 700 hectares da Fazenda Bulcão. O casal não desistiu: a plantação começou com dez mil mudas em novembro de 1999, data que marca o nascimento do Instituto Terra.

Se no início a equipe era composta apenas pelo casal, um engenheiro florestal e dois vaqueiros, hoje são 126 colaboradores e inúmeros doadores e patrocinadores. Mas os humanos são poucos diante da quantidade de novos moradores que a fazenda ganhou. 

Só de árvores, foram mais de 7 milhões de mudas que se transformaram numa “floresta criança”, como Wanick gosta de chamar. Salgado concordava com as analogias familiares para a mata que criaram.

 “Plantar uma árvore é como ter um filho. Tem que tomar conta para ele sobreviver até ser um adulto. Tem que plantar, proteger de formiga, do fogo, das ervas daninhas, do capim. Tem que tomar conta até os cinco anos de idade, aí sim ela é um ser livre”, disse Sebastião Salgado na mesma entrevista de 2015.

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Embora ainda não sejam árvores maduras e frondosas, as mais de 300 espécies típicas da Mata Atlântica trouxeram junto uma sequência de impactos positivos.

Os animais que se alimentam diretamente dos vegetais – insetos, aves, pequenos mamíferos – foram os primeiros a voltar. Eles atraem outros predadores, que atraem outros ainda maiores e, aos poucos, a cadeia alimentar vai se completando. É por isso que a comunidade festejou quando, em 2011, constataram que uma família de jaguatiricas estava vivendo na área da fazenda.

Treze anos depois, a celebração se repetiu quando foram detectadas famílias de onças-pardas e lobos-guará. A presença de predadores de topo de cadeia indica um ecossistema complexo e auto suficiente.

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Há ainda outros animais que indicam a saúde da floresta: os mais vulneráveis. O sagui-da-serra, por exemplo, é um primata da Mata Atlântica que está em perigo crítico de extinção, mas encontra na Fazenda Bulcão um lar seguro.

Mais impressionante ainda: o reflorestamento dos 600 hectares trouxe de volta mais de 2 mil nascentes para a bacia do rio Doce. Eles haviam sumido porque os afloramentos de água precisam de condições delicadas para sobreviverem: sombra, solo protegido, vegetação nativa ao redor. Sem essas proteções, as pequenas nascentes não têm como competir com o sol de rachar mineiro.

Fotografia comparativa da Terra Aimorés em 2001 e 2019.
(Instituto Terra Aimorés - MG via Youtube/Reprodução)

O retorno dos corpos d’água impactou diretamente as famílias da região, especialmente os pequenos produtores rurais, que também sofriam com a secura e a degradação do solo. Hoje, o Instituto Terra promove programas de educação ambiental para a comunidade local, com foco no desenvolvimento sustentável e agroecológico da região.

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Em 2024, quando os 700 hectares originais já haviam sido quase totalmente restaurados, o Instituto expandiu seu território para mais de 2 mil hectares. Hoje, o Instituto também é responsável por programas de educação ambiental para todas as idades, pesquisas científicas, cultivo de mudas e abelhas nativas.

O trabalho no Instituto Terra também rendeu frutos na carreira de fotógrafo de Salgado. Ele conta que, depois de terminar Êxodos, estava deprimido e desesperançoso com o futuro da humanidade. Então, assistir o retorno das espécies em Aimorés fez com que ele sentisse de novo fé e vontade de fotografar.

Foi quando começou o projeto Gênesis, em 2013, que fez o casal viajar pelo mundo para retratar a conexão da natureza e dos povos indígenas. 

“Eu terminei o Gênesis muito mais otimista não em relação à espécie humana, mas ao planeta”, conta Salgado “As espécies das formigas e das baleias são tão importantes quanto a espécie humana. Eu percebi que, de qualquer forma, o planeta vai viver.”

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