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A dura vida do software educativo no Brasil

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h38 - Publicado em 28 fev 2001, 22h00

Marília Coutinho

Software educativo no Brasil tem futuro? Tem, mas é preciso vencer muitos obstáculos. Quem nos conta isso é Eduardo Mace, diretor da Edulink/Log On. Mace está há 17 anos desenvolvendo software educacional. Começou em 1983, com um laboratório de informática educativa e um possante Apple II. Sua empresa, a Log On, localizada no Rio de Janeiro, nasceu há 11 anos e tem um extenso catálogo de títulos em CD-ROM, que inclui o Diplomacia Brasileira, uma história completa das relações exteriores do Brasil e 500 Anos da Pintura Brasileira, um CD com biografias e imagens que contam toda a história da pintura no país. Apesar dos títulos de sucesso, ele considera a Edulink seu produto mais importante: é a única revista brasileira dedicada à aplicação da tecnologia na educação. É essa experiência que ele compartilha com os leitores da Super.

 

Super – Como se faz um bom software educativo/informativo?

Eduardo Mace – Um bom software tem as mesmas características de um bom livro: interface simples, conteúdo relevante e bem apresentado, boa impressão (no caso de software: bom design e compatibilidade) e, acima de tudo, deve ser marcante. Para um bom software educacional/informativo, é isso. Agora, para um software educacional excelente é preciso mais (ainda pensando em relação ao livro): interface simples e inteligente (para ajudar a navegar pela informação), conteúdo único, rico e relevante (a ponto de ter saído com mérito dos testes que fazemos em escolas). Um bom desenho de software permitirá a integração com o ambiente do sistema operacional (DOS ou Windows, por exemplo) e com outras aplicações (outros programas presentes na máquina do usuário).

Acima de tudo, é preciso usar tecnologia para entregar alguma coisa que só seria possível no computador (seja pela enormidade/variedade/profundidade do conteúdo, seja pela apresentação inovadora de alguns conteúdos, como mapas, simuladores etc.). Como se isso não astasse, o software tem de ser aberto, para que professores e alunos o adaptem ao que quiserem. E, hoje, é imprescindível a conexão com a internet, para atualizações e cruzamento de conteúdos multidisciplinares.

 

Isso é um bom software, ok. Mas do que você – o desenvolvedor – precisa para projetá-lo. Falando de outro jei-to, qual é a sua “receita de sucesso”?

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Tempo, dinheiro, informação, talento e muita perseverança fazem qualquer coisa ficar boa. Mas, no caso de software, é sempre necessário dar um certo tempo para testes no campo (o lugar onde se vai usar o que foi desenvolvido). Isso quer dizer testá-lo em diversos ambientes operacionais (fazendo programas de testes com usuários avançados) e, acima de tudo, esmiuçar o conteúdo até que não se agüente mais olhar tanto para ele quanto para o projeto todo. Essa ressaca é fundamental para entender que se chegou ao limite do conteúdo. Obviamente, novas versões vão trazendo novas idéias e mais conteúdo. Portanto, às vezes é bom medir se o software já está no ponto, tentando criar um material de divulgação para ele. Aí, fazemos uma comparação com a concorrência. Se ele perder, deve ter um preço inferior ou até não ser publicado. Nós aqui da Log On temos uns 18 softwares na gaveta, prontinhos, que nunca foram lançados porque não passaram no teste do panfleto.

Se nesse teste ele ficar empatado ou ganhar, você tem alguma chance. Isso se correr para fechar o programa e vendê-lo…

 

Como se faz para “ganhar” o consumidor?

É certamente o mais difícil, mas existem diversos tipos de consumidores. Se o consumidor for um aluno, é preciso que o software seja relevante e abrangente o suficiente para atraí-lo, mostrando que é necessário para as pesquisas escolares. Se o consumidor for a própria escola, é necessário que o software seja imprescindível para alguns itens do currículo, que, sem ele, não ficariam muito bem cobertos, e que seja interessante para alunos e professores em situação de sala de aula. Se o consumidor for um adulto, o software deve principalmente chamar a atenção, criar o interesse ainda na caixa e colocar-se como sendo relevante para algum problema que não está resolvido. Mais importante é estar onde o consumidor tem a chance de comprá-lo. Hoje, a distribuição é definitivamente mais importante que todos os quesitos acima e é porque esses meios de distribuição são de difícil acesso que temos poucos softwares educacionais/informativos que vendem bem no Brasil.

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O que você quer dizer com “difícil acesso”? É caro distribuir software?

Olha, hoje na área de software educacional temos mais de oito meios de distribuição. Todos são seletivos e necessitam de investimentos. Dou quatro exemplos:

1) Vender por meio de bancas de jornais. Para entrar no mercado, você precisa fazer uma tiragem de pelo menos 30 000 exemplares. Isso se quiser distribuir apenas no Rio, em São Paulo e em algumas outras capitais, e só em bancas selecionadas. É caro e demora mais ou menos 60 dias para você começar a receber, sendo que a distribuidora fica com 50% do preço de capa e o encalhe, normalmente, é de mais de 55% da tiragem.

2) Vender de porta em porta. Estruturas de vendas desse tipo têm milhares de vendedores e precisam de um grande investimento em estoque e de muita vontade do empreendedor para lidar com montes de problemas de pessoal. Além disso, o dinheiro é incerto, pois a inadimplência é alta. E existe ainda a necessidade de parcelar as vendas em seis vezes ou mais, o que faz com que o dinheiro demore ainda mais para entrar.

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3) Vender no varejo. O acesso é muito difícil, pois o varejo de software está concentrado e normalmente não se entra nele sem um catálogo variado e forte de produtos. É preciso também apostar junto com o parceiro varejista, para girar o estoque nos pontos-de-venda. Além de tudo, o prazo de pagamento, no Brasil, é dilatado demais, isso quando não se é forçado a fazer as chamadas “consignações brancas”, atendendo o varejista que quer devolver aquilo que comprou e não vendeu, em troca de mercadorias mais “fresquinhas”.

4) Vender direto para as escolas. É mais fácil de vender, mas a compra vem pingada e demora para fechar, isso quando fecha, já que nas escolas a prática da pirataria de software é mais arraigada que a xerox de livro. Para você ter uma idéia: em visita a uma escola de São Paulo, deparei-me com mais de 100 micros instalados e funcionando em quatro salas diferentes, todos em excelentes condições. Em uma das salas, eles tinham um servidor com seis unidades de CD-ROM, cada uma com um software permanente, três dos quais da nossa editora. Ou seja, cada software era usado por mais de dez máquinas incessantemente, sem que a escola nunca tivesse adquirido mais de uma cópia de cada um. A coordenadora disse que tinha achado um software excelente, que permitia rodar qualquer CD remoto como se fosse local, e que, por esse achado, só estavam adquirindo uma cópia de cada produto. Vá dormir com um barulho desses!

 

Qual a saída, então, para distribuir um produto?

O principal problema para quem quer produzir software é colocá-lo no mercado. Isso está cada vez mais caro, pois exige mais estoque, tempo, pro-paganda e combate à pirataria. Obviamente, são problemas que qualquer indústria enfrenta, mas, no caso de software educacional, o problema é pior do que o do cinema pois os investimentos para se ter um software bom são altos (e incluem muitos especialistas diferentes), o canal de distribuição só fecha alguma coisa se o produto for novo (ou atualizado) e estiver pronto, os meios de distribuição comem boa parte da margem (50% ou mais) e, além disso, o produtor tem de estar atento às mudanças tecnológicas, para não deixar seu produto obsoleto. Isso tudo em um segmento totalmente descapitalizado e com muitos pequenos produtores…

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O caminho é claro e já se repetiu diversas vezes em outras indústrias: seleção natural e fusão. Até esses problemas estarem resolvidos, teremos ainda uns dois ou três anos pela frente. Será que até lá dá para viver e competir com produtores estrangeiros que exportam software para o mundo inteiro? Nós achamos que dá, se conhecermos bem o nosso mercado.

 

Como é o consumidor de software educativo/informativo no Brasil? Já deu para sentir?

Sim, deu para sentir. Mas seria uma resposta tão grande que acho bom só comentar que o perfil desse consumidor reflete exatamente a separação de classes na sociedade.

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Frases

“O software tem que ser aberto para que professores e alunos possam adaptá-lo”

 

“O maior desafio para quem produz software é achar uma forma de colocá-lo no mercado”

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