É pra já!
Mochila voadora, carro sem motorista, teletransporte de pizza: cientistas inventam de tudo para você e suas coisas viajarem mais rápido.
Luís Fernando Klava
Engate a primeira marcha quem nunca, preso em um engarrafamento, sonhou com carros voadores, teletransporte ou outras engenhocas futuristas. Vencer distâncias no menor tempo possível é uma busca incessante da humanidade, ainda mais hoje, quando o trânsito de boa parte das metrópoles está saturado. De que adiantam máquinas que atingem facilmente 150 ou 200 km/h se, em certos horários, é quase impossível passar do famoso primeira-segunda-primeira-segunda?
Pensando nisso, diversas universidades, empresas e governos pesquisam alternativas para tentar garantir, no futuro, o direito de ir e vir, com rapidez, claro. Idéias não faltam: desde mochilas que permitem a uma pessoa voar, carros que não precisam de motoristas até aviões supervelozes, que fazem a ponte aérea entre São Paulo e Tóquio em menos de duas horas.
Muitos projetos ainda estão restritos ao campo da imaginação. Requerem um desenvolvimento tecnológico muito grande. Outros, no entanto, já viraram realidade ou estão muito próximos disso. A seguir, você vai conhecer alguns deles.
Mochilão turbinado
Você está preparando um bolo quando, de repente, se dá conta de que o fermento acabou. Que tal dar, literalmente, uma “voadinha” até o supermercado? Isso mesmo, em breve não serão só os donos de helicópteros que poderão voar para qualquer lugar. Tarefas simples como fazer compras, ir à escola ou à academia poderão ser feitas com o auxílio de mochilas voadoras, também conhecidas como jetpacks.
Na opinião do professor José Alex Sant’Anna, do Departamento de Transportes da Universidade de Brasília, os céus do futuro vão ser tomados por gente voando com mochilas e aeronaves compactadas, parecidas com as usadas pelos Jetsons, personagens idealizados pelos estúdios Hanna Barbera. “O trem e o automóvel foram os veículos dos séculos XIX e XX, respectivamente. O XXI é o século dos transportes aéreos”, acredita Sant’Anna.
O jetpack já existe. No Carnaval de 2001, um dublê de astronauta desfilou com um modelo fabricado pela Nasa. A engenhoca era movida a peróxido de hidrogênio – combustível um tanto caro – e tinha autonomia de vôo de 30 segundos. Bom somente para exibições em desfiles e feiras de gado. Mas a empresa americana Millenium Jet já desenvolveu um aparelho que tem boas chances de se tornar um sucesso comercial. Ainda não se trata de uma mochila, mas permite voar individualmente. O equipamento é uma espécie de helicóptero de pequeno porte. A propulsão se baseia em um motor tradicional, que movimenta duas hélices. O idealizador da engenhoca, Michael Moshier, garante que, quando aperfeiçoada, a invenção poderá atingir a velocidade de 120 km/h.
Saindo da órbita
O transporte aéreo individual é indicado para pequenos trajetos, normalmente dentro de uma cidade. Para deslocamentos maiores, o avião continuaria sendo a melhor opção, só que com uma diferença: eles serão mais rápidos que os atuais.
A indústria aeronáutica comercial passa por um processo de estagnação. Salvo algumas pequenas modificações, as aeronaves são as mesmas dos últimos 30 anos. Voam, no máximo, a 900 km/h. Tecnologia para ultrapassar essa barreira existe faz tempo. O grande problema é o custo. Voar acima dessa velocidade consome muito combustível, o que torna a viagem economicamente inviável.
Uma alternativa são as viagens sub-orbitais. O avião sairia da atmosfera e viajaria em órbita baixa, a cerca de 100 km de altitude. Sem a interferência do ar, é possível desenvolver velocidades altíssimas. Segundo o engenheiro aeronáutico Roberto Michelin, no espaço é possível atingir com facilidade até 25 vezes a velocidade do som. Dessa forma, pode-se chegar a qualquer ponto do planeta em menos de duas horas. Só para efeito de comparação, o Concorde, o avião comercial mais veloz da atualidade, atinge pouco mais de duas vezes a velocidade do som.
Em vez de contar apenas com turbinas, o avião teria de ser equipado também com foguetes. Para decolar, a aeronave usaria turbinas convencionais e, em determinada altitude, os foguetes entrariam em cena. “Tecnologia disponível existe”, afirma Michelin. Um dos problemas que os engenheiros vão precisar resolver é o aquecimento da fuselagem. Quando estiver reentrando na atmosfera, o avião vai esquentar por causa do atrito com o ar. Hoje, os ônibus espaciais, quando pousam, ficam parados na pista por cerca de duas horas até a temperatura do invólucro externo se normalizar. Só então as portas são abertas para o desembarque dos astronautas.
O avião suborbital provavelmente vai demorar pelo menos 20 anos para se tornar realidade. Para um futuro mais próximo, no entanto, as novidades estarão mais focadas nos sistemas de navegação dos jatos tradicionais. Boa parte das aeronaves, atualmente, não pode voar em linha reta porque precisa se orientar por alguns equipamentos instalados no solo. Uma nova tecnologia, chamada RNAV, sigla em inglês para navegação de área, dispensa o uso dessas referências terrestres. Dessa forma, é possível diversificar as rotas e completar a viagem em menos tempo.
Motoristas em extinção
Em termos de transporte urbano, uma das principais apostas dos especialistas são os carros que se deslocam sozinhos. Guiados por sensores instalados nas ruas e avenidas, além de sistemas de posicionamento via satélite, esses veículos aposentariam de vez os motoristas, principais responsáveis pelos acidentes. Experiências nesse sentido já estão sendo colocadas em prática em diversas partes do planeta. Na Europa, por exemplo, um consórcio formado por 14 membros, entre empresas e universidades, está trabalhando em um projeto chamado Cyber Move.
Quando alguém precisar se deslocar, bastará pedir, via computador de mão, um veículo. Depois, é só digitar o destino e curtir a viagem. Com uma vantagem, ou desvantagem para alguns: não vai ter um chofer ao volante para conversar sobre o tempo.
“Precisamos mudar o conceito atual do transporte. Os carros devem ser encarados como um serviço e não como um bem pessoal”, diz o professor Jorge Dias, da Universidade de Coimbra, em Portugal, uma das participantes do consórcio europeu.
Segundo o professor, a tecnologia disponível hoje já permite que automóveis circulem sem a interferência humana, mas barreiras ainda precisam ser derrubadas. A velocidade e a autonomia dos carros são algumas delas, já que é consenso entre os especialistas o uso de energias limpas, como a elétrica. Atualmente, a maioria dos automóveis elétricos atingem, no máximo, os 80 km/h. Apenas alguns protótipos ultrapassam essa marca. O Relâmpago Branco, desenvolvido pelo engenheiro americano Ed Dempsey, atingiu 381 km/h mas, para isso, precisou de mais de 6 mil baterias.
No modelo adotado no Cyber Move, teoricamente os problemas de segurança e fluidez seriam resolvidos. Com menos carros nas ruas (cada unidade atenderia dezenas de pessoas) e um tráfego automatizado, mesmo nos horários de pico os congestionamentos seriam evitados. Em três anos algumas cidades da França, da Suíça, da Áustria e da Holanda devem colocar em prática experimentos baseados no conceito Cyber Move. “Vamos identificar as falhas e tentar resolvê-las. Temos consciência de que esse é um projeto de longo prazo, para pelo menos 20 anos”, explica Dias.
Além da Europa, também existem planos para a instalação de sistemas de transporte automatizados nos Estados Unidos e na Ásia. Para o professor Jerry Schneider, do Departamento de Urbanismo e Planejamento da Universidade de Washington, nos Estados Unidos, dois modelos de transportes urbanos vão predominar no futuro: o PRT (sigla, em inglês, de Transporte Rápido Pessoal) e o DMT (também em inglês, sigla de Transporte de Modo Duplo).
O PRT é um sistema de transporte individual baseado em trilhos. A principal vantagem, em comparação com as ferrovias atuais, é que os passageiros não vão mais perder tempo com paradas desnecessárias. Os veículos, que terão o tamanho de um carro de passeio, só vão parar na estação de destino.
Já o DMT, como o próprio nome sugere, vai usar veículos híbridos, que circulam pelos trilhos e também nas ruas, com rodas normais. “O DMT é uma maneira de conservar a funcionalidade do automóvel, mas de uma forma muito mais rápida e segura”, acredita Schneider.
Nos Estados Unidos, algumas empresas têm investido tempo e dinheiro para transformar o PRT e o DMT em realidade. Um exemplo é a MegaRail, sediada na cidade de Fort Worth, no Texas. “Embora esses conceitos sejam inovadores, a tecnologia necessária já existe. Bastam apenas disposição e dinheiro para colocar a idéia em prática”, explica Kirston Henderson, presidente da companhia.
Carga pesada
Não é só no transporte de passageiros que os pesquisadores estão preocupados. Afinal, o barril de chope sempre precisa chegar ao bar. Alguns acreditam até que a movimentação de produtos vai ser mais importante do que a de pessoas. “Com o crescimento de tecnologias como a internet e a teleconferência, a tendência é que as pessoas saiam de casa cada vez menos. Boa parte do sistema de transporte vai ser usado para a entrega de mercadorias”, acredita José Alex Sant’Anna, professor da Universidade de Brasília.
A Universidade de Cambridge, na Grã-Bretanha, por exemplo, está desenvolvendo, junto com algumas empresas do setor, o caminhão do futuro. “Estamos trabalhando em um veículo que pode viajar automaticamente, com o auxílio de sensores colocados no asfalto”, explica David Cebon, coordenador do estudo. Outro objetivo dos pesquisadores é encontrar formas de minimizar os estragos no piso, além de aumentar a segurança e o conforto dos motoristas. Isso mesmo, segundo Cebon, os caminhoneiros não vão desaparecer. A tecnologia vai ajudar o homem a conduzir melhor a máquina.
Outra idéia para o transporte de cargas é o uso de balões dirigíveis. A empresa CargoLifter, da Alemanha, desenvolveu um zepelim que funciona como um guindaste flutuante em portos ou terminais de carga. No futuro, pretende usar balões para distâncias bem maiores. Mas, para isso, os sistemas de controle dessas aeronaves ainda precisam ser aperfeiçoados.
O sonho do teletransporte
Sonho de 11 entre dez motoristas presos em um engarrafamento, além dos fãs do seriado Jornada nas Estrelas, o teletransporte pode estar mais próximo do que muitos imaginam. O primeiro passo foi dado recentemente por cientistas australianos que conseguiram “teletransportar” um feixe de laser. Eles destruíram a luz e a recriaram a pouco mais de 1 m do local de origem.
Essa tecnologia poderia ter aplicações muito interessantes. Imagine aquela encomenda urgente, que precisa ser entregue ontem. Basta levá-la até a agência dos Correios e, em questão de segundos, ela estará no destino, em qualquer parte do planeta.
“Precisamos aprender muito sobre o teletransporte, mas não acho impossível ele se tornar realidade. Com certeza nem eu nem meus filhos vamos aproveitar essa tecnologia, mas, quem sabe, os meus netos”, acredita Ping Koy Lam, chefe da equipe de pesquisadores da Universidade Nacional da Austrália.
Não é o que pensa Fábio Gandour, gerente de Novas Tecnologias da IBM Brasil. Segundo ele, em algumas décadas já será possível enviar objetos inanimados por teletransporte. A coisa fica mais séria quando o assunto é o envio de seres vivos – e, mais particularmente, de humanos. Isso porque a tecnologia que se vislumbra hoje não pode, a rigor, ser chamada de transporte. Para ser teletransportada, uma pessoa precisaria ser escaneada partícula a partícula. A matéria seria, então, transformada em energia e transmitida para o destino, onde ocorreria o processo inverso. A criatura original deixaria de existir e o que surgiria no final seria uma réplica dela. “Aí saímos do domínio da física para entrar na metafísica”, diz Gandour. Para ele, é pouco provável que alguém concorde com a idéia de fazer uma experiência assim consigo mesmo ou com um parente próximo. “Só para pôr um pouco mais de lenha na fogueira: é preciso botar fé demais nas linhas de transmissão.”