Gaudí no lugar do WTC
Já apareceu arquiteto propondo trocar as torres por uma área agradável, arborizada, de predinhos e pracinhas.
Denis Russo Burgierman
Você já deve ter ouvido falar do problema: ninguém sabe o que fazer do terreno de onde subia o World Trade Center. Por um lado, é uma propriedade nobre numa área nobre da cidade que é considerada a capital do mundo. Teoricamente, é o tipo de terreno que todos gostariam de poder explorar. Mesmo assim, virou o grande abacaxi do planeta.
Já apareceu arquiteto propondo trocar as torres por uma área agradável, arborizada, de predinhos e pracinhas e um comércio chique e animado. Algo feito para as pessoas, coisa que o WTC não era. Imenso, dava ao pedestre uma sensação desagradável de insignificância. O espaço entre os prédios canalizava o vento do mar e tornava impossível ficar na praça que havia no meio do complexo. A idéia do novo minibairro parecia perfeita para mostrar ao mundo que Nova York não só superou o choque, mas saiu melhor dele.
Acontece que alguém lembrou que os prédios levaram com eles nada menos que 20% do espaço para escritórios do sul da ilha de Manhattan. Muitas das empresas que se alojavam lá, infelizmente, vão quebrar. Outras tantas vão continuar existindo e precisarão de uma nova sede se o WTC virar um minibairro (ou um parque, ou um monumento pela paz). Essa lembrança foi a senha para que até as organizações ambientalistas, tradicionais inimigas dos arranha-céus, saíssem em defesa da reconstrução do complexo. O motivo: as empresas sem teto se espalhariam por Nova York e pelo Estado vizinho, Nova Jersey, levando trânsito, poluição, lixo e gente. É provável que aproveitassem a situação de exceção para desmatar as poucas áreas verdes da região.
OK, faça-se o arranha-céu então. Mas quem construiria um outro WTC? Para começar, o novo prédio pareceria tábua de tiro ao alvo. Sem falar nos boatos de poltergeist que viriam junto com o edifício erguido sobre restos humanos (não, não vão conseguir remover tudo). Nenhuma empresa iria querer alugar escritório lá. E as que quisessem teriam uma baita dificuldade de atrair funcionários e clientes.
O dono do leasing do WTC sugeriu que se fizessem quatro torres de 50 andares, em vez de duas de cento e tantos. Mas, convenhamos: que anticlímax. Trocar aqueles gigantes no horizonte por quatro predinhos a meio-pau… Teve até um maluco que propôs que se construíssem réplicas das torres, só que ocas, inteiramente deso-cupadas. Algo como um imenso dedo médio estendido para os terroristas.
Já que está aberta a temporada de palpites, a Super resolveu dar sua colaboração. Descobrimos, no Centro de Estudos Gaudinistas (CEG), em Barcelona, Espanha, uma série de desenhos de um arranha-céu projetado pelo grande arquiteto catalão Antoni Gaudí. O prédio teria sido encomendado em 1910 ou 1911 por empresários americanos que queriam um grande hotel em Nova York, mas o projeto nunca foi colocado em prática e se perdeu. Sobraram só alguns desenhos feitos pelo escultor Llorenç Matamala i Piñol, amigo e colaborador de Gaudí. Os desenhos mostram um edifício que seria o maior de Nova York em sua época: 310 metros de altura, 60 menos que o Empire State, construído em 1931, e 100 menos que o WTC. Que se concretize o maior delírio de um dos mais brilhantes arquitetos do nosso tempo! (A ilustração à esquerda, realizada pelo ilustrador Newton Verlangieri, baseou-se no desenho de Matamala).
“A idéia me parece absurda”, diz o arquiteto Luis Gueilburt, diretor do CEG. Poxa, professor Luis, por quê? Pense bem: com sua grande torre, cercada de oito menores, o Grande Hotel de Gaudí poderia alojar, se não todos, pelo menos grande parte dos escritórios destruídos. Há, no mundo, centenas de especialistas na obra de Gaudí – uma comissão dos melhores deles poderia descobrir as intenções do arquiteto por trás dos desenhos e refazer o projeto à luz dos dias de hoje. E, com a tecnologia moderna, seria possível terminar a obra num prazo razoável (a obra-prima do catalão, o Templo da Sagrada Família, em Barcelona, começou a ser erguida em 1894 e não deve ficar pronta antes de 2020). “Isso é verdade. A construção é tecnicamente possível, ainda mais nos Estados Unidos”, admite Gueilburt.
Sem falar no valor simbólico do prédio. Gaudí, embora fosse um católico convicto, tinha um enorme respeito pela cultura islâmica, tanto que suas obras estão cheias de mosaicos coloridos e pátios agradáveis inspirados na arquitetura dos árabes, que ocuparam a Espanha no século VIII. Sem falar que, com suas formas orgânicas, o prédio seria um lugar muito mais agradável que qualquer edifício de aço e vidro – e atrairia inquilinos e turistas. “É. Até que é uma idéia divertida”, diz Gueilburt, entregando os pontos, minutos antes de admitir à Super que toparia o desafio de refazer o projeto.
Para completar, o prédio é cheio de formas curvas, ideais para a construção de templos. O térreo poderia ser inteiro reservado para usos religiosos – uma igreja católica, um templo protestante, um budista, um hindu, uma sinagoga, uma mesquita. Afinal, Nova York é a cidade mais multicultural do mundo. É isso que eles têm que o Afeganistão do Taleban não tem. Nós da Super duvidamos que alguém tivesse coragem de bombardear um prédio tão cosmopolita, tolerante e pacífico.
Se você gostou da sugestão da Super, deixe seu nome já no abaixo-assi-nado que colocamos no nosso site – https://www.superinteressante.com.br. A lista será depois enviada, junto com uma cópia desta reportagem, para as autoridades que irão decidir o que será feito no espaço do WTC. Se a idéia for aprovada, você vai ficar sabendo pela CNN