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Hollywood está salva

O 3D é a maior revolução desde a chegada dos filmes coloridos, há mais de 70 anos. E não só por causa dos efeitos visuais mas por ter levado de volta ao cinema um público que já ensaiava abandoná-lo

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h53 - Publicado em 11 mar 2011, 22h00

Texto: Alexandre Versignassi*

Ir ao cinema é chato. É o que dá para concluir quando a gente vê algumas estatísticas: a venda de ingressos nos EUA fica na faixa de 1 bilhão por ano, mais ou menos. Parece bastante. Mas não re-presenta quase nada quando você compara com os anos 30 e 40. Naquela época, sem TV nem metade das opções de lazer de hoje, esse número batia fácil em 4 bilhões (não estamos falando no Brasil porque não existem estatísticas nacionais daqueles tempos). Sem falar que a população americana dobrou de lá para cá. Se as pessoas fossem tanto ao cinema como iam antes, a venda de ingressos seria de 8 bilhões por ano. Hoje é só 12% disso. Ou seja, muita gente arranjou coisa melhor para fazer.

Para piorar, veio a pirataria online de filmes. Logo que ela se estabeleceu, no meio da década, a renda da indústria cinematográfica começou a cair na maior parte do mundo. E a pirataria só cresceu: 3 dos lançamentos mais esperados de fevereiro (Guerra ao Terror, Um Olhar do Paraíso e A Caixa) já podiam ser baixados de graça desde janeiro, com qualidade de dvd ou próxima disso.

Junte isso a TVs de 40, 50, 60 polegadas cada vez mais baratas. Adicione conexões de banda larga que permitem baixar um filme praticamente no mesmo tempo em que a pipoca fica pronta no micro-ondas. Aí complica para a indústria do cinema. Se desse para baixar Big Macs de graça (mesmo que fosse ilegal), o McDonald’s fechava, certo? Se dá para ver filmes novinhos sem pagar e nas telas já bem boas de qualquer apartamento de classe média, o que acontece? O mesmo que ocorreu com outra indústria do entretenimento: a musical. Vejamos.

Enxugando gelo

Você conhece alguém que há anos não compra um cd? Nós também. Muita gente não vê sentido em gastar dinheiro com discos agora que dá para baixar de graça quase toda música já gravada. Fazer isso é ilegal? Sim. Mas isso não impediu que as vendas de cds nos EUA desabassem de 712 milhões de unidades em 2001 para 89 milhões no ano passado.

O que as gravadoras mais fizeram nesse tempo todo foi combater a pirataria com braço forte, chegando ao ponto de processar moleques por terem baixado músicas em sites de troca de arquivos. Mas essa estratégia se mostrou tão eficaz quanto enxugar gelo. A pirataria continuou firme, e agora o comércio de cds está virando um negócio de nicho, voltado para pouca gente, como aconteceu com os discos de vinil. Que descanse em paz.

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E a indústria do cinema, o que fez?

Até outro dia, em vez de arranjar uma solução criativa para o problema, Hollywood empregava a velha (e fracassada) tática da indústria do disco: partir para a briga. Todos os esforços estavam na tentativa de destruir a pirataria. Vale até contratar seguranças com binóculos de visão noturna, para pegar quem estiver gravando o filme. O cerco fechou tanto que, para ver Indiana Jones antes da estreia, jornalistas tiveram de passar por detectores de metal. Nada mais legítimo, afinal, estamos falando sobre defender propriedade intelectual. Mas o gelo não enxuga: os filmes, mais hora, menos hora, fluem para a rede.

E aí, Hollywood? Faz sentido gastar bilhões fazendo filmes se existe a possibilidade de ninguém mais pagar para assisti-los?

Até outro dia, muita gente achava que não. Uma delas era George Lucas: “As primeiras vítimas serão os filmes de orçamento alto. Eles vão acabar”, disse à revista Wired em 2006.

Vacina antipirataria

Quando você toma uma vacina, está recebendo um pouco da doença. Assim seu corpo produz os anticorpos contra a danada e, no dia em que ela atacar de verdade, o organismo já vai saber como se defender.

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A indústria do cinema usou uma lógica parecida para atacar a pirataria. Os estúdios estavam perdendo dinheiro. Para atacar esse problema decidiram… gastar mais dinheiro.

Hoje, o custo médio de um filme de Hollywood é de mais de US$ 100 milhões (em 2001, por exemplo, a média era de US$ 78,5 milhões). O gasto total, na verdade, não subiu tanto. Para compensar o aumento na quantidade de grana por produção, hoje fazem menos filmes. Em 2006, foram lançados 631 filmes nos EUA. Em 2009, 517. Na prática, o que fizeram foi produzir uma quantidade menor de filmes baratos, concentrando a grana toda nas megaproduções.

Por que? Elementar, meu caro Jude Law.

“Com os grandes blockbusters, a experiência de assistir na tela grande é mais intensa”, diz Márcio Gonçalves, diretor do braço latino-americano da Motion Pictures Associaton (MPA), que reúne os maiores estúdios dos EUA. “No caso dos filmes médios, a diferença entre assistir no cinema ou em casa não é tão grande. Aí o efeito da pirataria é mais nefasto. E o risco de perder dinheiro aumenta.”

Deu certo, a princípio. Filmes “que não valem a pena ver em casa”, digamos assim, foram muito bem, obrigado. Homem de Ferro (orçamento de US$ 140 milhões) ultrapassou a marca dos US$ 500 bilhões de faturamento. Cavaleiro das Trevas (US$ 185 milhões) raspou em US$ 1 bilhão. A quantidade total de ingressos vendidos, porém, ficou na mesma. No ano de lançamento desses dois filmes, 2008, a venda de ingressos foi de 1,36 bilhão. Pouco menos que o 1,37 bilhão de 2005.

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“E agora, quem poderá nos ajudar?”, devem ter se perguntado alguns chefões de Hollywood. Mas antes que o Chapolin Colorado pudesse se manifestar, apareceu outro herói: James Cameron. Seu Avatar reinventou o cinema. E, de quebra, tirou a indústria cinematográfica da UTI.

O novo colorido

Sejamos justos. O maior mérito aí não é exatamente de Cameron, mas do próprio 3D. Desse 3D moderno, livre de imagens borradas e tão realista quanto sair na rua. Ele surgiu em 2005, explodiu em 2009 e faz hoje pelo cinema algo comparável ao que a chegada dos filmes coloridos fez – justamente nos anos 30 e 40. Está atraindo multidões.

Tanto que 2009 foi um ano excepcional para os produtores de filmes. A indústria americana teve seu melhor ano na década, com faturamento de US$ 10 bilhões. O 3D, note bem, colaborou com quase R$ 2 bilhões desse bolo. E foram só 15 lançamentos contra os 517 da indústria toda. Ou seja: 3% dos filmes responderam por 20% da grana. A quantidade total de bilhetes vendidos saiu daquela pasmaceira em que tinha ficado até 2008: fechou 2009 com 1,44 bilhão de ingressos. Um aumento de respeitáveis 7,5%, se levarmos em conta que a população não aumentou, e que esse foi o ano da maior crise econômica nos EUA desde a 2a Guerra Mundial.

O 3D, enfim, virou sinônimo de dinheiro. E foi exatamente o que aconteceu quando as cores chegaram. Tem até outra coincidência nessa história. Pitoresca, até. As primeiras superproduções coloridas eram filmes de criança, como Branca de Neve e os Sete Anões (1937) e O Mágico de Oz (1939). Com o 3D moderno não foi diferente. Praticamente todos os filmes eram infantis: Chicken Little (o pioneiro, de 2005), Era do Gelo 3 (2009), UP (2009). Mas aí veio uma novidade. Em 1939, digo. Era E o Vento Levou, um dos primeiros filmes coloridos para adultos. A história de Scarlet O’Hara foi responsável por fazer com que muito marmanjo visse cores pela primeira vez fora da vida real. Até por isso, ou principalmente por isso, ele virou o filme mais rentável da história do cinema: US$ 3 bilhões de bilheteria (em valores corrigidos pela inflação – nos dólares do ano de seu lançamento, foram US$ 390 milhões).

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E aí veio uma novidade. Agora, em 2009. Era Avatar, um dos primeiros filmes 3D com apelo também para adultos. A história dos Na’vi foi responsável por fazer com que muito marmanjo visse 3 dimensões pela primeira vez fora da vida real. Até por isso, ou principalmente por isso, ele virou o 2o filme mais rentável da história com apenas 3 semanas de exibição: foi US$ 1,13 bilhão, contra US$ 1,8 bi-lhão do campeão Titanic. Bom, levando a inflação em conta, as coisas ficam um pouco diferentes.

Mas isso não impede um fato: estamos, sim, diante de um novo E o Vento Levou. Com Avatar, pela primeira vez um 3D virou O filme, aquele que todo mundo precisa ver. Isso foi só um primeiro passo. O próximo é a 3a dimensão invadir as produções para gente grande de verdade. E ele já foi dado: em abril chega Alice, de Tim Burton. É a estreia do 3D no mundo dos filmes de arte.

Depois disso será um pulo até os Tarantinos, Scorceses e Lars von Triers da vida começarem a experimentar o formato – como Hitchcock e ou-tros gênios experimentaram a cor lá atrás. E o mais provável é que qualquer grande filme, no sentido artístico da palavra, será pensado desde o início como uma obra em 3 dimensões. Todos saem ganhando: os diretores passam a ter mais possibilidades artísticas ao explorar a dimensão extra, o público tem uma experiência bem mais intensa e a indústria volta a bater recordes de faturamento.

Mas uma dessas festas tem data para acabar: a da indústria. As primeiras TVs 3D chegam ao mercado neste ano – e até o meio da década devem custar a mesma coisa que as Full HDs de hoje. E aí os downloads piratas vão entrar com força no mundo tridimensional. E será o começo de um novo fim. Ou não. Olhando por outro lado, vemos que o cinema sobrevive há um século como umas das opções de lazer mais queridas, em todas as culturas do planeta, independentemente da concorrência. Ir ao cinema, de um jeito ou de outro, É legal. E você sabe por quê.

*Adaptada de reportagens originalmente publicada nas edições 253 e 275 da Superinteressante.

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