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Astrônomos flagram possível planeta orbitando uma anã branca

A descoberta é intrigante porque, no processo de formação de uma anã branca, planetas próximos deveriam ser destruídos – e ninguém sabe como esse sobreviveu

Por Bruno Carbinatto
Atualizado em 17 set 2020, 17h11 - Publicado em 16 set 2020, 20h30

Uma equipe de cientistas da Nasa anunciou na revista científica Nature o registro de algo inédito: um possível planeta intacto orbitando uma anã branca. Chama-se “anã branca” o núcleo compacto e denso que resta após a “morte” de uma estrela parecida com o nosso Sol. A detecção é intrigante porque, no processo de formação de uma anã branca, qualquer planeta em volta deveria ser destruído – o porquê deste em questão não ter sumido do mapa permanece um mistério.

O tal planeta resiliente se chama WD 1856 b e está a 80 anos-luz da Terra, na constelação de Draco. Ele foi encontrado por cientistas da Nasa utilizando o Transiting Exoplanet Survey Satellite (TESS), satélite especialista em encontrar exoplanetas, e tem uma massa próxima de Júpiter, o maior planeta do Sistema Solar. Esse gigante está em órbita de uma anã branca que é sete vezes menor que ele, ou seja, tem apenas 40% maior que a Terra, e seu tempo de translação é de apenas 34 horas – 60 vezes mais rápido do que Mercúrio, o mais veloz planeta do Sistema Solar.

Mas nada disso é muito impressionante. O mais interessante sobre o WD 1856 b é sua própria existência: nenhum outro planeta conhecido orbita uma anã-branca.

Anãs-brancas são um dos possíveis estágios finais de estrelas no Universo, e também o mais comum. O nosso Sol, por exemplo, se tornará uma anã-branca daqui uns 5 bilhões de anos, mais ou menos. Usando uma metáfora, é como se uma anã-branca fosse o “cadáver” de uma estrela com até dez vezes a massa do Sol. É o que resta depois que elas não conseguem mais produzir energia e começam a esfriar, ou seja, “morrem”.

Essa “morte” da estrela acontece quando o combustível para o processo de fusão nuclear acaba – no caso, os átomos de hidrogênio que são combinados para formarem átomos de hélio. Sem conseguir fundir mais átomos, a gravidade da própria estrela faz ela colapsar sobre si mesma, e suas camadas mais externas de gás são expandidas e, depois, ejetadas no espaço em uma violenta explosão que destrói quase tudo ao seu redor.

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O que sobra é um remanescente pequeno (do tamanho da Terra, mais ou menos), porém muito denso e pesado. É esse antigo miolo de estrela que chamamos de anã-branca: um cadáver que apenas esfria. 97% das estrelas da Via Láctea terão ou já tiveram esse destino. Algumas outras estrelas, por terem mais do que dez vezes a massa do Sol, passam por um processo diferente e resultam nas chamadas estrelas de nêutrons depois que o combustível para a fusão nuclear se esgota. Por fim, estrelas massivas podem dar origem a buracos negros quando “morrem”, mas isso é uma outra história.

O que importa aqui é que, quando uma estrela morre e vira uma anã-branca, a expansão de suas camadas exteriores de gás engole e destrói qualquer planeta próximo. Planetas que orbitam a estrela em distâncias maiores podem ter a chance de sobreviver a essa etapa do processo, mas também são destruídos quando a estrela explode definitivamente. E mesmo depois que uma anã branca já passou por todo esse processo e está calma e esfriando, nada deveria conseguir chegar muito perto dela sem ser destruído por causa de imensa gravidade.

Por isso, acreditava-se até então que era impossível a existência de planetas em volta de anãs brancas. Nos últimos anos, algumas pesquisas criaram modelos teóricos e até encontraram indícios de que talvez essa ideia estivesse errada, mas a primeira observação direta só veio agora, com o WD 1856 b. A descoberta ainda precisa de uma confirmação oficial: astrônomos ainda não têm 100% de certeza de que se trata mesmo de um planeta e não outro objeto astronômico – apesar de existirem vários indícios disso.

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A descoberta foi acidental: a equipe utilizava o TESS, satélite que detecta quando um objeto passa na frente de estrelas e bloqueia sua luz momentaneamente, para estudar possíveis detritos pequenos que sobraram de planetas destruídos pela anã branca. Foi um choque quando eles viram que havia algo muito maior bloqueando a luz da estrela – provavelmente um planeta intacto. Como era algo inédito, a equipe pediu a confirmação de vários outros telescópios, tanto em terra firme como espaciais, para verificar a observação e checar se o objeto talvez não fosse uma outra estrela, mas os dados não mostravam emissão de radiação típica de estrelas com essa massa.

Ainda não se sabe como o possível planeta sobreviveu estando tão próximo da estrela defunta, mas a equipe já criou algumas hipóteses. Uma delas é de que o WD 1856 b era um planeta mais distante, que não foi consumido quando a estrela expandiu no início de sua morte. Outros planetas mais próximos, porém, foram destruídos, e a retirada deles do sistema pode ter causado uma desestabilização na órbita do WD 1856 b, fazendo ela se tornar extremamente elíptica.

Quando a estrela explodiu, o planeta possivelmente estava em um ponto dessa elipse longe o suficiente para sobreviver ao impacto. Bilhões de anos depois – os cientistas calculam que o sistema todo pode ter 10 bilhões de anos, algo muito mais antigo que nosso Sistema Solar –, com a anã branca esfriando, a órbita do planeta voltou a se normalizar e voltou a ser circular, padrão que se encontra até hoje.

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Em um vídeo em inglês, a Nasa simulou como seria a órbita desse planeta, antes e depois de sua estrela morrer.

O cenário, porém, é apenas uma hipótese, já que o planeta acabou de ser detectado. Segundo a equipe, muitos outros estudos deverão ser feitos para coletar mais dados sobre o planeta, a anã-branca e o sistema em geral – incluindo a procura por outros possíveis planetas que também tenham sobrevivido. Como o WD 1856 b não está tão longe da Terra, é bem possível que observações futuras consigam investigá-lo mais a fundo.

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