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Fecundação: como evitar este encontro

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h54 - Publicado em 31 jul 1996, 22h00

Lúcia Helena de Oliveira, de Washington

Mais de 60% dos casais do mundo usam algum método para impedir a fecundação. Mas uma falha aqui, outra lá, faz com que metade dos casos de gravidez sejam acidentais. Para acabar com esse tipo de surpresa, os cientistas estão preparando contraceptivos bem mais eficazes

Surgem novos métodos masculinos

De um lado, 400 milhões de representantes do sexo masculino. De outro, uma única representante da ala feminina. O batalhão dos machos pode ficar até três dias à espera dela que, por sua vez, só dá o ar de sua graça durante 18 horas no máximo. Se os dois lados não se entendem durante esse breve período, o negócio desfeito fica para uma próxima ocasião. No entanto, se apesar das dificuldades eles conseguem se encontrar, então o resultado aparece em aproximadamente nove meses. Pois quando espermatozóide e óvulo se unem, nada os separa. Juntos vão formar o embrião de um novo ser humano até o fim. Portanto, para quem não deseja ser pai ou ser mãe, a melhor saída é impedir essa união. Eis a meta dos anticoncepcionais.

Até o presente, quando o tema é evitar a gravidez os homens têm pouca escolha. Ou partem para a chamada vasectomia, a cirurgia que interrompe o canal por onde saem os espermatozóides e que nem sempre é reversível, ou usam camisinha. “Esta última opção poderia ter muitos mais adeptos, mas os usuários reclamam que ela diminui o prazer sexual”, lamenta a fisiologista americana Nancy Alexander. E olha que nos Estados Unidos o uso de preservativos é dez vezes maior do que no Brasil, onde a média anual é uma caixa com três unidades por homem sexualmente ativo. “A camisinha não evita apenas a gravidez, mas a transmissão de doenças como a Aids”, diz a médica. “Não é à toa que os cientistas estejam tão preocupados em driblar a questão da sensibilidade masculina.”

Três vezes mais fina

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Especialista em reprodução humana há vinte anos, desde 1990 Nancy Alexander chefia o Laboratório de Desenvolvimento de Contraceptivos, que ocupa um andar inteiro de um dos 21 prédios dos Institutos Nacionais de Saúde, em Bethesda, nos arredores de Washington. Sua equipe acompanha pesquisas, feitas em diversos laboratórios americanos e mesmo no Exterior, em busca dos anticoncepcionais do futuro. Entre eles, uma nova geração de preservativos, que estarão nas farmácias até o final do milênio (veja quadro à direita).

O atual látex, mistura de resinas e borracha, será substituído por uma combinação de poliuretana forte revestida por camadas de outros polímeros. “Com essa matéria-prima, é possível fabricar uma camisinha até três vezes mais fina, que vai interferir menos na sensibilidade”, comemora a cientista. “Ao mesmo tempo, o novo material tem o dobro de resistência, diminuindo o risco de acidentes.” Outra vantagem é que, diferente do látex, ele não se estraga com o calor ou com certos lubrificantes.

Remédios que agem contra o gameta

Os cientistas também procuram, é claro, uma versão masculina para a pílula, atuando diretamente na linha de produção dos espermatozóides. E que linha: a cada minuto, os testítulos fabricam cerca de 1 000 deles. Mas tudo começa no cérebro, numa área chamada hipotálamo. Nela, as células secretam uma substância de nome complicado, a gonadotrofina, que funciona como uma ordem química para a glândula hipófise, situada ali por perto, no meio da massa cinzenta. A glândula interpreta a presença da substância cerebral como um comando para que passe a fabricar seus dois hormônios. Essa dupla segue pela corrente sangüinea até os testículos, onde disparam a fabricação dos gametas e do hormônio sexual masculino conhecido por testosterona.

Um tiro na cabeça

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Ocorre que, quando a dosagem de testosterona aumenta demais no sangue, o cérebro corta aquela ordem da gonadotrofina para evitar acúmulos do hormônio masculino no corpo. “Mas, com isso, acaba cortando também a fabricação dos espermatozóides”, explica o fisiologista Lee Silver, da Universidade de Princeton, Estados Unidos, uma das instituições que correm atrás da pílula masculina. “Parece lógico que o anticoncepcional do homem deve ter uma boa dose de testosterona.” Lógico, mas não muito simples, por causa dos efeitos colaterais. Muita testosterona no sangue provoca uma tremenda irritabilidade e ainda diminui a quantidade de gorduras de alta densidade, aquelas que não deixam o mau colesterol de se depositar nas artérias. Também provoca o risco de acne, o que, dos males, é o menor.

Para fugir dos efeitos colaterais, cientistas da Organização Mundial de Saúde estão incluindo o chamado progestin na fórmula de uma injeção anticoncepcional masculina. O progestin é uma versão sintética do hormônio progesterona das mulheres. “Não se sabe bem o porquê, mas ele permite que a gente use doses menores de testosterona, diminuindo aqueles efeitos desagradáveis”, conta Nancy Alexander. A mistura está sendo testada em seis países e parece oferecer uma proteção que dura três meses.

No entanto, as experiências mais ousadas não interferem nos hormônios. Os pesquisadores estão cada vez mais convencidos de que a cabeça é a grande arma do espermatozóide para penetrar no óvulo. Ela vem sendo estudada em detalhes, pois cada molécula descoberta pode ser o alvo de um novo anticoncepcional, capaz de agir somente no gameta masculino, sem outras conseqüências no corpo (veja infográfico à esquerda).

O sistema de defesa entra na jogada

No campo do controle da natalidade, a maior promessa para o século 21 são as vacinas. “Hoje, cientistas do mundo inteiro buscam um modo de fazer o sistema de defesa do corpo atacar proteínas fundamentais à reprodução, como se elas fossem vírus ou bactérias”, conta a médica Nancy Alexander. “Em tese, seria possível fazer isso tanto em homens quanto em mulheres.” Na prática, os testes mais avançados são os de vacinas femininas. Uma delas, desenvolvida pelo Instituto Nacional de Imunologia da Índia, faz as células imunológicas se revoltarem contra as substâncias que fixam o ovo recém-fecundado no útero.

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Por ser considerada abortiva, a fórmula indiana tem sido recebida com menos entusiasmo do que a vacina pesquisada em cinco países europeus e nos Estados Unidos, com o apoio da Organização Mundial de Saúde. Ela induz as moléculas defensoras, os famosos anticorpos, a grudarem ao redor do óvulo, formando uma barreira impenetrável para os espermatozóides. Mas a grande dúvida é se uma vacina dessas poderia atuar por acidente em outros cantos do corpo, fazendo o sistema imunológico declarar guerra contra vários órgãos. Como são necessários muitos testes até se obter essa segurança, ninguém espera uma vacina desse tipo nos próximos quinze ou vinte anos (veja quadro à direita).

Contra o esquecimento

Muito antes de as vacinas surgirem, as mulheres já encontrarão no mercado novas alternativas de contraceptivos, alguns deles hormonais. Uma das novidades é um anel, para ser encaixado na vagina feito um diafragma. Ele vai liberando hormônios aos poucos, como se a usuária estivesse engolindo uma pílula por dia. O método tem duas vantagens. A primeira delas é acabar com o esquecimento que, segundo uma pesquisa realizada pelo governo dos Estados Unidos, é a causa de um terço das gestações acidentais nesse país. A segunda vantagem é diminuir efeitos desagradáveis, ao entregar os hormônios em um ponto próximo do endereço em que devem agir.

Como qualquer remédio, os hormônios de um anticoncepcional não funcionam como uma espécie de míssil teleguiado que vai direto ao seu alvo – no caso, os ovários, onde os óvulos são preparados. Eles caem no sangue e vão agindo pelo caminho. “É cedo para saber se os novos contraceptivos vão diminuir ainda mais a dosagem dessas substâncias e seus sintomas”, opina o ginecologista Thomas Gollop, diretor do Instituto de Medicina Fetal, em São Paulo. “Mas é isso o que a gente espera.”

Velhas opções estão sendo aperfeiçoadas

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Na mesma linha do anel, nos próximos anos deverá surgir uma nova espécie de dispositivo intra-uterino (DIU), capaz de lançar hormônios durante três a cinco anos. Passado esse prazo, ele será retirado pelo ginecologista. Mas algumas versões semelhantes devem dispensar até mesmo essa consulta médica. São dispositivos biodegradáveis que, uma vez terminada a vida útil, podem ser absorvidos pelo organismo.

“Os contraceptivos tipo DIU existentes precisam de um aperfeiçoamento”, justifica Nancy Alexander. “Eles causam inflamações e aumentam o fluxo menstrual, além de não serem totalmente eficientes em mulheres que nunca engravidaram antes, não se sabe direito por quê. Mas a adição de hormônios femininos parece resolver esses problemas.”

Os pesquisadores querem melhorar também os espermicidas. Até agora, essas substâncias são detergentes que dissolvem o espermatozóide. É uma tarefa fácil, já que o gameta masculino é revestido por moléculas de colesterol, ou seja, é gorduroso. Só que certas bactérias inofensivas, habitantes da vagina, também são cobertas de gordura e os espermicidas acabam destruindo esses germes por tabela. Sem as bactérias benéficas, a vagina se torna menos ácida, facilitando a proliferação de microorganismos causadores de doenças. Sem contar que 20% a 25% das mulheres são alérgicas aos espermicidas.

Por isso, a tendência é essas substâncias serem trocadas por outras, que atuam de um modo diferente. A equipe do Instituto Nacional de Saúde está analisando uma droga que não deixa o espermatozóide se livrar de sua cápsula de colesterol. Essa é uma medida que ele toma, logo em seguida à ejaculação. Faz isso como quem tira um casaco pesado para correr melhor. Carregando o colesterol, a trajetória do espermatozóide até o óvulo vai ficar muito mais difícil. O remédio deverá ser testado em duzentas americanas, até o final do ano, na forma de pomada para ser aplicada instantes antes da relação sexual.

Em outra experiência, o que se pretende é agir bem no ponto de encontro entre óvulo e o espermatozóide – ou seja, nas trompas. É ali que um hormônio feminino, a progesterona, dá a maior força para a célula sexual masculina, abrindo seus canais de cálcio. Agora, aparecem medicamentos que acabam com a troca de gentilezas entre macho e fêmea, bloqueando as moléculas do hormônio. Com os seus canais fechados, o espermatozóide ficará sem absorver o cálcio do ambiente. E, então, não conseguirá cavar um túnel na casca amarela e dura feito isopor da célula feminina. Depois de tanto nadar, irá morrer de cansaço diante do óvulo.

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PARA SABER MAIS

NA INTERNET:

Access to Voluntary and Safe Contraception, https://www.avsc.org/avsc

Atlanta Reproductive Health Center https://www.ivf.com/contrac.html

Três opções em teste

Três opções em teste

1 – Antiaderente

Algumas moléculas funcionam feito cola, para o gameta masculino não desgrudar mais do óvulo ao alcançá-lo. Mas há substâncias que podem bloquear esses aderentes. O espermatozóide escorregaria em vão na superfície de seu alvo.

2 – Sem proteção

Na membrana de revestimento espalham-se substâncias que protegem contra os radicais livres, moléculas capazes de liqüidar a célula masculina durante seu trajeto até o óvulo. Uma idéia é impedir essa defesa.

3 – No meio do caminho

Algumas drogas podem barrar verdadeiros corredores, pelos quais as moléculas de cálcio entram no espermatozóide. Sem cálcio, ele não consegue completar reações químicas essenciais para penetrar na célula feminina. Dá com a cabeça na parede ovular, sem sucesso

O que os homens podem esperar do futuro

Por volta do ano 2000

As camisinhas serão mais finas e, ao mesmo tempo, muito mais resistentes.

Por volta de 2005

Injeções de hormônios com poucos efeitos colaterais vão interromper a produção de espermatozóides durante três meses.

Por volta de 2015

Vacinas estimularão o sistema de defesa do corpo a matar os espermatozóides. Esse efeito irá durar um ano.

Depois de 2015

Remédios irão agir na cabeça do espermatozóide, tirando sua capacidade de fecundar.

Ação em duas etapas

.

Fase folicular

Os métodos hormonais agem nessa primeira fase, quando o óvulo amadurece dentro do ovário. No sangue, doses mais altas do que o normal do hormônio feminino progesterona são interpretadas como uma suposta gravidez. De modo que o ovário interrompe o amadurecimento do novos óvulos até terminar a falsa gestação, que é uma ilusão criada pelo remédio.

Fase luteinizante

O óvulo, nessa fase, está pronto para ser fecundado. O folículo se transforma em uma substância amarela, o corpo lúteo, que mais tarde formará a placenta. Muitos métodos procuram tornar a cobertura do óvulo maduro impenetrável para o espermatozóide. Existem ainda algumas vacinas sendo testadas que poderiam destruir o corpo lúteo, deixando o gameta feminino sem condições de gerar um embrião.

O que as mulheres podem esperar do futuro

Por volta do ano 2000

Dispositivos que, implantados no corpo, liberam hormônios aos poucos durante três a cinco anos. Eles devem ser facilmente removíveis, ao contrário dos implantes que já foram lançados até hoje.

Por volta de 2005

Espermicidas muito mais eficientes que o atuais e capazes de matar agentes de algumas doenças sexualmente transmissíveis, como a hepatite B.

Por volta de 2010

Implantes de dispositivos biodegradáveis que liberam doses de anticoncepcionais durante três anos e, então, são absorvidos pelo próprio corpo.

Por volta de 2015

Vacinas com ação de um ano que não mexem com os hormônios, mas com o sistema imunológico do organismo, induzindo as defesas a atacar os espermatozóides como se fossem bactérias ou vírus estranhos.

Depois de 2015

Devem surgir remédios que agem na cabeça do espermatozóide, impedindo que ele se ligue ao óvulo. Esses medicamentos precisam ser aplicados diretamente na vagina, instantes antes da relação sexual. A partir de 2015 também pode se esperar pílulas que precisam ser engolidas apenas uma vez por mês.

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