Metas climáticas apresentadas pelo Brasil não são suficientes, alertam especialistas
Caminhando para um ano 1,5°C mais quente que o esperado, as metas propostas na COP29 poderiam ser mais ambiciosas, dizem cientistas
Na última quarta-feira (13), o vice-presidente Geraldo Alckmin apresentou as novas metas climáticas brasileiras para a redução do efeito estufa nos próximos 10 anos. O projeto prevê reduzir de 59% a 67% em 2035, em comparação com as taxas registradas em 2005. O anúncio foi feito na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP 29), em Baku, Azerbaijão.
Segundo os cálculos do governo federal, a meta equivale a uma redução de 850 milhões a 1,05 bilhão de toneladas de gás carbônico até o prazo futuro.
O documento foi anunciado em antecipação na sexta-feira (8), às vésperas do evento, e as páginas foram entregues para a ONU essa semana. Os países tinham uma data limite até fevereiro de 2025 para apresentarem suas metas, conhecidas como Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs). Elas serão discutidas na próxima conferência, que ocorrerá ano que vem aqui no Brasil, em Belém (PA).
Porém, desde que as metas nacionais foram divulgadas, especialistas alertam que não são ambiciosas o suficiente – e que o Brasil poderia fazer bem mais. Um relatório publicado pelo Grupo de Consultoria sobre a Crise Climática (CCAG) diz que as NDCs apresentadas atualmente se distanciam do cumprimento do Acordo de Paris.
“As NDCs de Alta Ambição devem refletir cotas justas, com os países desenvolvidos assumindo maior responsabilidade por meio de cortes mais profundos, e um aumento no apoio a nações em desenvolvimento”, diz Mercedes Bustamante, membro do CCAG e professora da Universidade de Brasília (UnB) para a Agência Bori.
“Estamos à beira de mudanças irreversíveis, mas também diante de uma oportunidade sem precedentes para redefinir nossa abordagem à ação climática”, afirma Bustamante.
Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, maior aliança de ONGs climáticas do país, disse ao jornal O Globo, que o Brasil tem o potencial de ir além do prometido. “Precisamos de mais ousadia e ambição”, afirmou.
Necessidade de mudança
Esse ano segue a todo vapor para bater uma outra meta: 2024 pode se tornar o primeiro ano completo com temperaturas 1,5°C acima dos níveis pré-industriais (1850-1900). Os dados foram fornecidos pela Copernicus, Berkeley Earth e UK Met Office, na COP29.
O cientista climático Mark Howden, da Universidade Nacional da Austrália, alerta que, caso os líderes mundiais e as indústrias não diminuam rapidamente suas emissões, estaremos caminhando para um mundo de 3°C acima dos níveis “normais”.
“Já vimos impactos significativos em todo o mundo, em quase todos os sistemas e em todos os lugares, com, grosso modo, 1,25°C a cada década”, explica em uma coletiva de imprensa.
Seguindo essa lógica, Karen Silverwood-Cope, diretora do Clima do instituto de pesquisa WRI Brasil, argumenta ao O Globo que o número sugerido na meta climática “vai do razoável ao insuficiente”. Outros ambientalistas também se manifestaram, classificando a sugestão como “pouco ousada” e “fraca”.
Além disso, ainda comentam que é necessário propostas que discutam a redução dos impactos causados pela agricultura, pecuária e exploração de energias. Eles apontam que ainda existe a preocupação com a falta de compromisso do governo em realizar a transição dos combustíveis fósseis, uma vez que a produção de petróleo e gás no Brasil continua aumentando a cada ano.
Por isso, especialistas apresentaram alguns princípios mais ambiciosos para a proposta.
Algumas das mudanças incluem: um olhar prioritário para a equidade, protegendo comunidades vulneráveis e garantindo benefícios de transição energética; planos mais bem detalhados, que digam como transformar as metas em ações concretas e como lidar com danos provocados pela mudança climática; um financiamento público e privado voltado para soluções climáticas e a atenção maior para tecnologias que já existem para a luta contra as mudanças climáticas – mas sem deixar de buscar por outras respostas.
“Essa ideia de que a tecnologia vai nos salvar no futuro é uma ilusão. A crise é agora”, disse a diretora executiva do Greenpeace Brasil, Carolina Pasquali, em comunicado.
“Acelerar a resposta global à crise climática é uma escolha política que devemos fazer agora. Temos as soluções ao nosso alcance, mas o progresso é constantemente obstruído pela indústria de combustíveis fósseis. As próximas NDCs vão definir o rumo para os próximos cinco anos; os últimos cinco ficaram muito aquém do necessário”, afirma David King, presidente do CCAG, à Bori.