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Mundo paranormal

Cientistas tentam provar que telepatas e videntes não são fraude. E o que eles acharam intriga o mundo

Por Gisela Blanco
Atualizado em 23 Maio 2017, 13h26 - Publicado em 26 fev 2011, 22h00

“O governo americano começou um programa ultrassecreto: formar um exército de paranormais. Um batalhão de homens capaz de usar o sobrenatural como arma de guerra. É o Projeto Stargate”. Esse trecho poderia terminar com um “Só aqui. No Sony Entertainment Television”. Mas não. Não é ficção.

Existiu mesmo um Projeto Stargate no Exército dos EUA. E a ideia realmente era montar um batalhão sobrenatural, de gente com talento para prever o futuro e usar a clarividência para fazer espionagem, enxergando através de paredes e coisas assim. Primeiro eles testavam entre os soldados quais teriam mais perfil de paranormal. Cientistas da Universidade Stanford faziam testes nos homens. Não, não era nada surreal. Mas testes simples, como pedir que o sujeito adivinhasse que carta de baralho você está escondendo aí na mão. Então pegavam os que acertavam mais (quer dizer, os que erravam menos) e faziam mais testes. Até filtrar um grupo de gente que realmente parecia ter algum sexto sentido. Essas pesquisas duraram mais de 20 anos e consumiram US$ 20 milhões. E o mais intrigante: deram resultado. Agora, cuidado. Você está prestes a cruzar uma fronteira. Você vai cair num lugar onde paranormais prestam serviços à indústria e se afirmam com ajuda da ciência. Um lugar além da imaginação: a realidade.

Era 1977. Militares dos EUA queriam saber o que os russos estavam construindo num galpão misterioso, que os satélites americanos tinham flagrado em algum lugar no norte da antiga URSS. Sem ter como espionar a coisa do jeito tradicional, chamaram um dos soldados que mais tinham se destacado nos testes do Projeto Stargate, o especialista em “visão remota” Joseph McMoneagle. Mostraram a foto do galpão e ele sentenciou: estavam construindo um submarino. Os oficiais não acreditaram. Parecia absurdo, já que a construção ficava a quase um quilômetro da água, um lugar pouco propício para fazer um submarino. Mas Joseph disse que em 4 meses sairia um de lá. E acertou.

O Stargate durou até 1995, quando o governo Clinton pôs fim ao programa, que considerou caro para poucos resultados. Mas não foi a primeira nem a última vez em que os paranormais foram levados a sério por instituições sérias. Seus serviços continuam requisitados, e em áreas até mais inusitadas que a espionagem militar.

Profissão: paranormal

Sabe aquela cigana que vem ler sua mão ou as videntes de bola de cristal dos desenhos do Pica-Pau? Esqueça. A paranormalidade está mais do que nunca no mundo da normalidade mesmo. Na polícia, na medicina, no marketing…

É o caso da americana Noreen Renier. Ela é uma detetive paranormal de verdade, que já participou da investigação de mais de 600 casos. A polícia da Flórida e o FBI estão entre os que costumam consultá-la. Já ajudou a encontrar assassinos foragidos, crianças sequestradas e até um avião desaparecido.

Às vezes, a sensitiva apenas sonha com as pistas que depois relata à polícia. Outras vezes, lança mão da psicometria: o sensitivo pega algum objeto do morto e, a partir dele, recolhe informações sobre a vítima e tenta se colocar no lugar dela na hora do crime. Depois, relata o que acha serem detalhes do crime à polícia – como o local onde o corpo está enterrado ou o nome do assassino.

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Outro profissional do além é Joseph McMoneagle, aquele do submarino. Esse resolveu ir aonde está o dinheiro: se especializou em trabalhar para empresas. Vivendo isolado em seu sítio nas montanhas da Virgínia, onde mora com a mulher e 6 gatos, o sensitivo fundou a própria firma de consultoria e cobra US$ 250 por hora de trabalho. “Geralmente levo pouco mais de duas horas para enxergar alguma coisa”, diz. McMoneagle diz que “vê” quais são os melhores terrenos para companhias de mineração comprarem, por exemplo. E atua em tecnologia também. “Há uns 15 anos uma empresa me perguntou em qual produto deveria investir. Não posso revelar o nome do cliente, mas recomendei que apostasse no mercado de livros eletrônicos”, diz. Além de ter antevisto o Kindle em 1994 (acredite… se quiser), McMoneagle trabalha há 9 anos em um experimento inusitado, pra dizer o mínimo: ele está tentando construir uma máquina a partir de imagens vindas do futuro. “Não sei dizer o que a máquina faz ainda. Só vou tentando enxergar as peças uma a uma por visão remota e montando o aparato. Um dia saberemos o que é.”

Enquanto você espera, conheça os novos médicos paranormais. “Novos” porque os velhos, como os Doutores Fritz da vida, já deram o que tinham que dar. A novidade aqui é um grupo de sensitivos brasileiros, do Distrito Federal, que não tenta fazer curas, mas se diz capaz de diagnosticar doenças. Câncer, enfisema, úlcera e problemas circulatórios são algumas das que eles dizem enxergar além dos limites do corpo.

Para testar essas habilidades, a Universidade de Brasília acompanhou os diagnósticos de uma equipe de sensitivos em pacientes do Hospital Universitário. Cada participante tinha apenas 10 minutos na sala com o paciente, sob a vigilância dos pesquisadores. E o paranormal não podia tocá-lo nem se comunicar com ele. A ideia era entender como a percepção extrasensorial funcionava, segundo o físico Álvaro Tronconi, coordenador do experimento. A conclusão do experimento foi de que os sensitivos não conseguiram uma porcentagem de acertos em um nível acima do esperado – ou seja, seus diagnósticos não eram melhores que um simples chute. Mas isso não desanimou os pesquisadores.

Não estranhe esse casamento entre ciência e ocultismo. Existe quase um século de pesquisas sérias sobre clarividência, telepatia, capacidade de mover objetos com o pensamento e tudo o mais que você possa chamar de paranormal – ou parapsicológico, como preferem os pesquisadores. Cientistas de várias áreas se dedicam a estudar os fenômenos da parapsicologia (ou fenômenos “psi”, para encurtar). E, embora nunca tenha havido uma prova por A mais B de que eles existam mesmo, os resultados de algumas dessas experiências são surpreendentes. E podem indicar que talvez exista mesmo algo mais entre o céu e a Terra.

Evidências científicas

A paranormalidade começou a virar ciência com o psicólogo Joseph B. Rhine, o Einstein desse campo. Ele fundou o primeiro laboratório dedicado ao assunto, nos anos 30. E não era num fundo de quintal, mas numa grande universidade dos EUA, a Duke. A ideia de Rhine era criar um método para testar telepatia e clavidência. Como? Com o tipo de teste que o Projeto Stargate acabaria adotando depois: a coisa de adivinhar cartas de baralho. Um voluntário ia colocando cartas na mesa e outro tentava adivinhar o naipe dela – sem ver nada, claro. Metódico, Rhine fazia o máximo para evitar qualquer forma de comunicação entre os dois, como colocá-los em prédios diferentes.

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Logo de início, Rhine já encontrou efeitos que parecem mais do que simples coincidência. O baralho, na verdade, tinha 5 naipes (e não 4 como os comuns). Isso significa que a chance de acertar era de 20%. Bom, de 800 tentativas, cada voluntário acertou, em média, 207 cartas. E o esperado para o chute puro era que acertassem só 160 (ou 20% de 800). Como explicar um resultado tão fora do comum?

Isso intrigou muita gente. Afinal, alguma forma de telepatia podia servir como explicação até para coincidências do dia-a-dia. Sabe quando você está pegando o telefone para ligar para alguém, o telefone toca e… é a pessoa? Então. Os experimentos de Rhine podiam ser o primeiro passo para desvendar isso.

A curiosidade foi crescendo. A parapsicologia também. Logo apareceram testes que prometiam mais exatidão. Como a bizarra técnica de Ganzfeld – “campo total”, em alemão. Utilizada desde os anos 70, consiste em fazer com que voluntários recebam imagens telepáticas transmitidas por outra pessoa que assiste a vídeos em outra sala. No final, os voluntários escolhem 1 entre 4 imagens apresentadas. Quem acertar o que o colega tentou transmitir da outra sala, marca um ponto.

A diferença desse teste em relação ao de adivinhar cartas é que o “receptor” fica num ambiente controlado, o tal “campo total”, que supostamente aumentaria seu poder de concentração: deitado, ouvindo um som monótono (tipo estática de TV) e com olhos vendados por duas metades de uma bola de pingue-pongue, que transformam o mundo em uma grande mancha branca. Os resultados? Como nos experimentos de Rhine, são melhores do que as estatísticas previam.

Essas experiências provam que a telepatia existe? Bom, isso vamos analisar melhor depois. Por enquanto, fiquemos com uma experiência cujo resultado é ainda mais surreal.

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O cientista por trás agora é Garret Moddel, um físico da Universidade do Colorado que segue a trilha aberta por Joseph Rhine. Seu objeto de pesquisa: a capacidade de mover objetos com a mente, ou telecinese. A princípio seria algo fácil de detectar: bastaria pedir que vários autoproclamados paranormais fizessem uma cadeira levitar. Se ninguém conseguisse, nunca, estaria tudo resolvido: a telecinesia não existe e pronto. Só que Moddel, por motivos mais do que óbvios, sabia que não adiantaria fazer isso. Ele imaginava que a mente pode ter algum efeito sobre o mundo exterior. Não sobre a matéria, já que nunca houve registro de alguém que movesse algo com a força do pensamento. Mas sobre a energia. Então resolveu testar a telecinesia usando raios luminosos.

Entre 2006 e 2007 Moddel usou um canhão de luz e uma chapa de vidro para testar sua ideia. A chapa, em condições normais, deixava 92% da luz passar e refletia 8%. “Quando os voluntários olhavam para a luz desejando que ela fosse mais ou menos refletida, os medidores eletrônicos detectaram, sim, uma mudança sutil nos índices de reflexão” afirma Moddel. E põe sutil nisso: ela pulou de 8% para 8,005%. Mas de novo: mesmo assim é algo que, em tese, está fora da nossa capacidade de compreensão.

Se telecinesia e telepatia já são aberrações para a ciência, o que dizer de consciência fora do corpo? Edward Kelly, psiquiatra da Universidade da Virgínia, acha que não. E pede que seus pacientes identifiquem objetos que teriam visto em lugares distantes enquanto faziam suas “viagens” extrasensoriais. O objetivo principal de Kelly é medir o comportamento do cérebro dos sujeitos enquanto eles dizem ter esse tipo de experiência. Mas só o fato de ele também pesquisar se a coisa acontece mesmo já é insólito o bastante.

Insólito como o estudos do psicólogo Daryl Bem. Ele pesquisa a existência de premonições em seu laboratório, na Universidade Cornell. Para verificar se dá mesmo para prever o futuro, ele fez o seguinte: numa primeira etapa, colocou 100 estudantes voluntários para tentar memorizar uma lista de 48 palavras. Cada uma aparecia na tela do computador por 3 segundos. Depois, eles tinham de escrever numa lista as palavras de que se lembravam. Até aí, nada de mais. Mas a segunda parte revelou algo aterrador. Depois que os voluntários já tinham feito suas anotações, o computador escolhia aleatoriamente 24 palavras daquelas 48 e colocava na tela. Aí, surpresa: a coincidência entre os números que o micro escolhia e aqueles de que as pessoas se lembravam era grande demais para ser ignorada. Em outras palavras: isso indicava que, de alguma forma, um evento do futuro (a seleção aleatória que o computador faria) afetava a memória dos voluntários.

Não podia ser mais estranho: a chance de que existissem naturalmente tantas coincidências quanto o experimento mostrava era pífia: de 1 em 111. “Isso é o equivalente a jogar uma moeda 7 vezes seguidas e acertar cara ou coroa em todas elas”, diz Daryl Bem. Alguma coisa tinha de estar por trás disso.

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Disso e de tudo o mais que envolva paranormalidade. Dizer que ela está “além da imaginação” e pronto não adianta. Metade da física está “além da imaginação”. E está certa. A mecânica quântica, por exemplo, ensina que existem partículas capazes de ficar em dois lugares ao mesmo tempo. E não são excentricidades loucas. Você mesmo é feito dessas partículas. Em outra frente, a da física que explica a geometria do espaço e do tempo, está provado que o tempo da forma como o percebemos simplesmente não existe. “A distinção entre passado, presente e futuro é uma ilusão, ainda que persistente”, disse Einstein.

Se o mundo da física moderna é praticamente uma realidade paralela, é nele que os estudiosos da paranormalidade se fiam para encontrar a raiz dos fenômenos que pesquisam.

Vamos ver. Como a ciência convencional poderia explicar a precognição, por exemplo? Para a astrofísica Elizabeth Rauscher, que já deu aulas na Universidade Stanford, foi consultora da Nasa e hoje se dedica à “psiência” (sim, a ciência dos fenômenos psi), quem pode explicar isso é o próprio Einstein.

Sua Teoria da Relatividade mostrou que o tempo não é o que parece, certo? Então. No mundo de Einstein, o mundo como ele é de verdade, é como se toda a história do Universo estivesse em um rolo de filme. O primeiro frame seria o momento do big-bang. Lá no meio estaria o nosso presente. E o futuro completaria o resto do rolo. Só tem um detalhe: os frames que formariam o futuro já estão lá. Você não sabe se vai sair no fim de semana ou não? Quem pudesse olhar o Universo pelo “lado de fora” saberia. Isso já está definido, gravado nos “frames” do espaço-tempo. Desde o início dos tempos. Não parece, mas a realidade é assim mesmo.

Bom, se os eventos do futuro já estão impressos de alguma forma, a gente não poderia ter algum sentido capaz de captar o que está por vir? Alguma forma de enxergar, ou de sentir, o que está nos frames lá na frente? É exatamente isso que Rauscher e outros entendidos em física e chegados em parapsicologia ao mesmo tempo imaginam. Se o futuro já está escrito, alguém poderia nascer com o talento de ler o que está lá. Enquanto Einstein fica com a explicação para as premonições (e se revira no túmulo por isso), telepatia e telecinese se apoiam na mecânica quântica. Mais precisamente no fenômeno mais inexplicável desse ramo da ciência: uma espécie de telepatia entre partículas. Os físicos chamam a coisa de “entrelaçamento quântico” – uma propriedade que, apesar de estar 100% comprovada, ainda parece obra do além.

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Funciona assim: os físicos pegam duas partículas fundamentais (como elétrons) e, quando mexem em uma delas, a outra se move também. Instantaneamente, sem que haja nada as unindo. Isso funciona mesmo se um elétron estiver no Brasil e o outro na Groenlândia.

Pergunte para qualquer físico por que essa conexão existe. E ele será leviano se disser algo além de “não faço ideia”. É um mistério.

E um prato cheio para alguns parapsicólogos. Se elétrons podem se comunicar (ou seja lá o que for) a distância, então as partículas do cérebro também poderiam interconectar-se com as do mundo exterior. E, por que não, fazer com que raios de luz se movam, transmitir pensamentos… “Pela teoria do entrelaçamento, as experiências psi não são mais vistas como poderes que, como mágica, transcendem os limites físicos. Viram uma consequência inevitável de nossa realidade interconectada”, diz o parapsicólogo Dean Radin, um dos defensores mais ferrenhos dessa “paranormalidade quântica”, em seu livro Mentes Conectadas.

Então tudo certo. A paranormalidade já está praticamente provada por várias pesquisas e, de quebra, as teorias mais sofisticadas da física ajudam a explicar como telepatia, telecinesia, premonição e cia. funcionam. E é isso aí.

Agora pare.

O que você leu até aqui é verdade. Mas não toda a verdade.

O lado dos céticos

Vamos voltar às experiências pioneiras de paranormalidade, as de Joseph Rhine. De 800 tentativas, seus voluntários acertaram 207 – contra 160 do que a estatística esperava. Ou seja: 26% contra 20%. Mas tem um problema aí: a estatística prevê esses 20% para um número infinito de tentativas. Quanto menos houver, maior a chance de desvio no resultado. Por exemplo: se você faz o teste e consegue acertar 10 vezes o naipe da carta escondida, vai ter um índice de 100%. Absurdamente maior do que as chances naturais. Conforme você tenta adivinhar mais vezes, a tendência é que o número vá se aproximando dos 20%. E fica a questão: até que ponto 800 tentativas com 26% de acerto são o suficiente para dizer que você leu a mente de alguém? Isso vale alguma coisa? Para qualquer cientista que não leve a sério a parapsicologia (a imensa maioria), a resposta é não.

O mesmo valeu até hoje para todas as pesquisas sobre a paranormalidade. O desvio de luz de Garret Moddel, do ponto de vista dos outros cientistas, estava dentro da margem de erro de seus equipamentos. E o resultado das experiências com premonição de Darryl Bem, apesar de parecerem fortes (com 1 chance em 111 de acontecer), podem ser lidos de outra maneira: ele conseguiu 53% de acertos contra chances estatísticas de 50%. Lendo dessa forma, a coisa não parece tão surpreendente. “Os índices de acerto nessas pesquisas sempre ficam na borda da base estatística”, afirma o neurocientista Renato Sabbatini, da Unicamp, fundador da Sociedade Brasileira de Céticos e Racionalistas.

Mas e a relatividade e a mecânica quântica, não dão uma força aos fenômenos psi? A resposta aqui é uma questão de fé. Fé que aconteça uma revolução do conhecimento tão grande a ponto de derrubar certezas científicas de hoje. Uma dessas certezas, comprovadas por mais de um século de pesquisas, é que as loucuras quânticas só funcionam no microcosmo das partículas – e põe microcosmo nisso: se um elétron tivesse o tamanho de uma bola de pingue-pongue, você seria um pouco maior que o diâmetro do sistema solar. E a teoria quântica aceita que coisas como o entrelaçamento só podem acontecer mesmo nesse mundo infinitesimal.

Na escala das coisas grandes efeitos desse tipo evaporam. Deixam de existir. Imaginar, então, que algo enorme como um cérebro conseguiria “conectar-se” com outro por entrelaçamento não faz sentido para a ciência convencional – pelo simples motivo de que as experiências de laboratório indicam o contrário.

Com a justificativa física para a premonição é a mesma coisa. A relatividade mostra, de fato, que o espaço e o tempo são como um grande rolo de filme, em que o futuro já está impresso. Mas não há nada na teoria nem fora dela mostrando que dá para o cérebro ter acesso a regiões do espaço-tempo que não sejam o que chamamos de presente. Futuro e passado continuam inacessíveis. Nada disso significa que os pesquisadores dos fenômenos psi sejam charlatães ou burros. O ponto é que, no estágio em que ciência está hoje, ainda não existe nada que corrobore suas teorias. E seus experimentos, que não têm nada de desonestos, precisam de resultados mais consistentes do que os que apareceram até hoje para que a ciência convencional os leve realmente a sério. Os próprios estudiosos da paranormalidade concordam. Mas também se defendem: “Só porque não sabemos como um fenômeno funciona, não é o bastante para parar de estudá-lo”, diz Garret Moddel.

Outra coisa que não ajuda é a profusão de picaretas. Os paranormais mais famosos, como o entortador de colheres Uri Gueller e Thomaz Green Morton, o cara do “Rá!”, foram desmascarados há tempos. Sem falar que até hoje ninguém conseguiu o prêmio de R$ 1 milhão que o mágico James Randi oferece há décadas para o primeiro que conseguir demonstrar poderes paranormais nos laboratórios de sua fundação.

Tudo isso, porém, não muda um fato: a ideia de paranormalidade fascina. E boa parte das pessoas continua vendo exemplos do sobrenatural em coisas do dia-a-dia mesmo. Principalmente nas coincidências, como se elas teimassem em dizer que, sim, existe algo mais entre o céu o e a Terra. Mas isso também tem motivo.

Veja: alguns sonhos são muito comuns (sim, sabemos que você já sonhou que foi para a escola sem roupa). Outros são menos. Desastres de avião, por exemplo. Se você sonhar com a queda de um e isso acontecer no dia seguinte, a sensação de que você teve uma premonição vai ser mais forte do que qualquer vontade de não acreditar em premonições. Mas será uma ilusão. “Supondo que existam uns 2 mil temas de sonhos razoavelmente comuns e que desastre de avião seja um deles, basta que apenas 10% dos cerca de 200 milhões de brasileiros se lembrem dos sonhos que tiveram na noite anterior e já temos uma chance de pelo menos 10 mil pessoas sonhando com aviões caindo todos os dias”, diz o estatístico Osame Kinouchi, da USP. Ou seja, improvável mesmo seria ninguém “prever” a queda de um deles.

Outras coisas que parecem absurdas são bem mais possíveis do que parecem. Por exemplo: num bar com 23 pessoas dentro, qual a probabilidade de que duas delas façam aniversário no mesmo dia? Errou quem chutou baixo. A matemática da coisa é um tanto complexa para caber aqui. Mas garante: são gordos 50% de chance.

E quando você escreve um e-mail para um amigo e, na hora de dar o send, pipoca uma mensagem dele na sua tela? Parece telepatia, principalmente se vocês não trocam mensagens frequentemente. Mas, pelos cálculos de Kinouchi, as chances de que duas pessoas que trocam míseros 6 e-mails por ano enviem suas mensagens um para o outro no mesmo minuto é de apenas 1 em 100 mil. “É mais fácil que ganhar na Mega-Sena, algo que sempre acontece para alguém. Ou de ser morto por um raio, coisa que mata 200 pessoas por ano”, afirma. Se considerarmos que existem 1 bilhão de usuários de e-mail no mundo (na verdade são mais), essa incrível coincidência acontece para cerca de 10 mil pessoas a cada ano, ou 27 por dia.

Agora que tal ganhar na loteria duas vezes? Segundo matemáticos da Universidade Harvard, num universo de milhões de pessoas que compram vários bilhetes cada, a chance de que alguma delas fature duas vezes é de 1 em 30. Resumo da ópera: a estatística prova que coisas fora do comum acontecem com uma frequência relativamente… comum! Não têm nada de transcendental. Mas tem outra: apesar de tudo isso, uma coisa nós podemos garantir: você ainda vai ser paranormal.

Tecnologia paranormal

Vai sim, pelo menos no que depender da tecnologia. O estudante de engenharia biomédica Adam Wilson já realizou um feito aparentemente incrível frente a milhares de testemunhas: pela primeira vez na história, escreveu e enviou uma mensagem pela internet usando apenas o cérebro. Não foi truque.

O que Wilson usou foi um capacete com eletrodos, capaz de ler ondas cerebrais exatamente como os aparelhos de eletroencefalograma, ou EEG. Conectado a um computador, quando as letras que o cientista queria digitar apareciam na tela, a máquina reconhecia uma alteração nas ondas cerebrais e passava a informação adiante. Foi assim que ele postou a frase “usando EEG para enviar mensagem” no Twitter. A ideia é possibilitar que pessoas que perderam a fala e os movimentos voltem a se comunicar.

Antes de isso virar um produto, já vai dar para movimentar objetos com o poder da mente. Graças ao Force Trainer, um brinquedo que também usa o capacete de eletrodos. Com ele na cabeça, basta se concentrar – não importa em quê – para fazer uma bola subir ou descer. Quanto mais você se concentra, mais ela sobe. Se distraiu? Ela cai. O truque mora aqui: quando você se concentra, seu cérebro emite ondas dentro de um certo padrão, diferente do normal. Aí, quando o sistema detecta isso, faz um ventilador se mover. E ele levita a bolinha.

O brinquedo dá uma pequena amostra do que pode ser feito com a neurotecnologia. Combinando engenharia e medicina, essa área da ciência inaugurou a era da telecinesia eletrônica. Basta lembrar da tentativa de chute inicial da Copa do Mundo de um jovem usando um exoesqueleto controlado pelo cérebro, iniciativa da equipe do laboratório que o brasileiro Miguel Nicolelis dirige, na Universidade Duke (coincidência: a mesma onde Joseph Rhine começou suas pesquisas). “Com essa interação cérebro-máquina, vamos fazer pessoas que perderam os movimentos andar em menos de 30 anos”, disse o pesquisador brasileiro. Gostou? Ah, você ainda não viu nada.

Nada como o colar telepático. Ele manda mensagens direto da sua mente para um celular, sem que você precise falar nada. O colar capta sinais da sua garganta e os manda diretamente para um computador que converte os impulsos em palavras, que são pronunciadas por uma voz computadorizada pelo telefone. Isso porque só de pensar em dizer alguma coisa, seu cérebro já manda sinais nervosos para as cordas vocais. Por enquanto o aparelho é só um protótipo e não é fácil fazê-lo interpretar exatamente o que você quer dizer. Mas, se ele evoluir bem, poderá fazer gente que perdeu a voz voltar a falar. Pelo menos por telefone ou com alto-falantes. E o mesmo princípio está por trás do projeto militar americano Silent Talk (conversa silenciosa), já que telepatia pode ser bem útil no campo de batalha. O governo do país reservou US$ 4 milhões para a pesquisa (bem menos do que tinha gasto procurando paranormais de verdade!). Como disse o escritor de ficção científica Arthur Clarke: “Qualquer tecnologia avançada o suficiente é indistinguível de mágica”. Pois é. E agora isso vale para a paranormalidade também. Sem mistério.

Desmascarado – Dr. Fritz

O que faz: Vários médiuns dizem incorporar o espírito do Dr. Fritz. E fazem “cirurgias” enfiando tesouras nos pacientes. O mais conhecido deles é Rubens de Faria Jr.

Como foi desmascarado: Acusações de provocar mortes durante as cirurgias e uma condenação por danos a um paciente minaram a credibilidade de Rubens, que já não era essas coisas.

Desmascarada – Sylvia Browne

O que faz: É a Mãe Dinah dos EUA. Prevê o futuro na televisão.

Como foi desmascarada: Não chegou a ser, já que aí é uma questão de fé do público. Mas ficou chamuscada depois de errar algumas previsões, como a de que Bush pai ganharia as eleições de 1992 nos EUA (deu Clinton) e que Michael Jackson acabaria preso por pedofilia (foi absolvido).

Desmascarado – Uri Geller

O que faz: Entorta talheres e conserta relógios com o poder da mente.

Como foi desmascarado: Depois de uma apresentação, uma equipe de perícia encontrou nas colheres que Geller havia entortado amostras de uma solução de nitrato de mercúrio, que amolece metais. Os relógios? Ele trocava os quebrados por novos.

Desmascarado – Thomaz Green Morton

O que faz: Produz luzes coloridas quando grita “Rá!”

Como foi desmascarado: Parapsicólogos visitaram o sitio de Morton munidos de filmadoras. Com vídeo em câmera lenta, viram que tudo não passava de ilusionismo. Ele usa flashes de máquina fotográfica escondidos pelo corpo para produzir suas luzes “mágicas”.

A colher do diabo
Entortar talheres virou símbolo de paranormalidade. E de safadeza. Existem várias técnicas. Algumas tão simples que dá para fazer em casa. Dá para fazer em casa.

Manual do charlatão, lição 1: como dobrar colheres com o poder da mente.

Passo 1

Prepare as colheres dobrando-as para a frente e para trás várias vezes. O objetivo é enfraquecer o metal, mas sem quebrar a colher. Você vai perceber que a parte mais fina dela vai ficando quente e cada vez mais frágil.

Passo 2

Dobre a colher de volta à posição inicial, para que ela pareça normal. Chame seu público e segure-a pelas pontas. Se ela estiver quebradiça, mantenha a mão em movimento para que ninguém perceba.

Passo 3

Segure a colher pelo meio e esfregue gentilmente por 20 segundos, até que aquele ponto já “amaciado” esquente. Dê também uma empurradinha na haste, discretamente.

Passo 4

A esta altura, a colher já deve estar dobrando. Solte a ponta e mostre como seus poderes paranormais funcionam. Caso a colher quebre, explique que isso é um efeito colateral da sua força telecinética.

* Não fique chateado se o truque não funcionar de primeira. Os bons ilusionistas praticam muito antes de apresentar seus truques. Alguns profissionais também usam talheres preparados com soluções de nitrato de mercúrio e halogenação com flúor, bromo, iodo ou cloro, para deixar os metais mais maleáveis.

Para saber mais

Parapsychology and the Skeptics
Chris Carter, Paja.

Extraordinary Knowing
Elizabeth Lloyd Mayer, Bantaress.

Science of Love: The Wisdom of Well-Being
Thomas Jay Oord, Templeton Foundation Press.

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