Síndrome inflamatória pode ter causado a pausa nos testes da vacina de Oxford
Afirmação é do jornal "New York Times", que cita uma fonte anônima relacionada aos testes; a interrupção é um procedimento de rotina, até que fique claro se os sintomas foram causados pela vacina ou por outra razão
Os testes da vacina feita em parceria entre a Universidade de Oxford e a empresa farmacêutica AstraZeneca foram pausados após um voluntário apresentar reações adversas. Dentre as nove vacinas que se encontram na fase 3 de testes, a de Oxford é considerada a mais avançada nas pesquisas.
A AstraZeneca não informou qual foi o efeito colateral. Em nota enviada à imprensa, a empresa diz que a pausa é um procedimento de rotina, obrigatório sempre que surge “uma potencial doença inexplicada” em um dos testes. Essa interrupção permite que os pesquisadores investiguem o efeito adverso e revisem os dados de segurança da vacina.
Segundo o jornal The New York Times, que cita uma fonte anônima ligada ao teste da vacina, um dos pacientes que participava da fase 3 no Reino Unido teria sido diagnosticado com mielite transversa, uma síndrome inflamatória que afeta a medula espinhal e pode ser desencadeada por infecções virais. Não se sabe quando esse diagnóstico teria sido feito, nem se houve relação direta com a aplicação da vacina.
A mielite transversa afeta a transmissão de impulsos nervosos, podendo causar fraqueza muscular e perda de sensibilidade tátil. Na maior parte dos casos, a causa da doença é desconhecida, mas pode estar relacionada a infecções. A AstraZeneca não confirmou se a interrupção nos testes ocorreu em razão dessa síndrome inflamatória. Ao NYT, a empresa disse que a situação está sendo investigada por um comitê independente e é muito cedo para cravar um diagnóstico específico.
O pesquisador Paul Griffin, da Universidade de Queensland (que não está envolvido no estudo, mas já participou de outros testes de fase 3) destacou à Nature o seguinte: em testes do tipo, muitas ocorrências médicas podem ser classificadas como “evento adverso” -por exemplo, a hospitalização de um participante por algum motivo não relacionado à vacina-, e levar à interrupção automática dos testes. O protocolo adotado pela AstraZeneca não foi divulgado.
A vacina de Oxford usa um adenovírus de chimpanzé, geneticamente modificado para não causar doenças em humanos e expressar as proteínas spike. São elas que o Sars-Cov-2 usa para se ligar às células humanas. A ideia é que o corpo tenha esse primeiro contato com as proteínas e aprenda a identificá-las rapidamente e gerar uma resposta imune quando de fato encontrar o coronavírus.
Mais de 17 mil voluntários ao redor do mundo estão participando dos testes da vacina de Oxford, inclusive no Brasil. Segundo a Unifesp, que conduz os testes no país, 5 mil brasileiros já receberam a vacina e não apresentaram reações adversas graves.
Em testes de larga escala, realizados com dezenas de milhares de pessoas, é comum que alguns indivíduos fiquem doentes e tenham sintomas por outros motivos. No entanto, é importante que os cientistas avaliem cuidadosamente se o efeito tem ou não relação com a vacina, o que não se sabe até o momento.
Também é possível que alguns efeitos colaterais de uma vacina só apareçam quando ela é aplicada em um número grande de pessoas, justamente porque são muito raros. É para isso que se realizam os testes de fase 3 antes que a vacina possa ser liberada para a população.
No estudo referente aos resultados das fases 1 e 2, publicado em junho, os pesquisadores reportam que 60% dos participantes apresentaram sintomas leves ou moderados. Entre eles estão dor muscular, fadiga, dor de cabeça, calafrios e, em alguns casos, febre. No entanto, nenhum dos sintomas foi considerado grave e todos puderam ser tratados com analgésicos.
A AstraZeneca iniciou os testes de fase 3 nos Estados Unidos no fim de agosto, onde devem participar mais 30 mil voluntários. Além dela, outras oito vacinas encontram-se na fase de testes em larga escala.