Ultra ricos estão usando jatinhos particulares como táxi – e turbinando aquecimento global
Emissões de carbono de jatos particulares cresceu 46% em quatro anos, revelou um novo estudo. Brasil aparece em segundo lugar no ranking, só atrás dos EUA.
Se você achava que sua pegada de carbono estava ruim, lembre-se que pelo menos você não usa um jatinho particular para realizar uma viagem da distância entre o Rio de Janeiro e Niterói.
Um novo estudo analisou o impacto que os aviões dos super ricos têm sobre a emissão de carbono na atmosfera, e os resultados são impressionantes.
Só 0,003% da população mundial tem acesso a jatos, um número minúsculo. Mas esses poucos indivíduos estão tratando cada vez mais os aviões como se fossem táxis: cerca de 9.000 voos feitos entre 2019 e 2023 percorreram menos de 50 km, por exemplo. Isso já é suficiente para piorar, e muito, a pegada de carbono humana. Vários jatos levantam voo praticamente vazios, somente para ir buscar alguém ou entregar uma encomenda.
Analisando mais de 25 mil aviões particulares e 18,7 milhões de viagens, pesquisadores da Universidade de Ciências Aplicadas de Munique (Alemanha) e da Universidade de Lineu (Suécia) calcularam as emissões com base no tempo de voo, na trajetória percorrida e na média do consumo de combustível de cada tipo de aeronave. Os dados foram coletados do site ADS-B Exchange platform.
Os resultados mostraram que a aviação privada contribuiu, no geral, com aproximadamente 15,6 milhões de toneladas métricas de dióxido de carbono em 2023 – cerca de 3,6 toneladas métricas por voo, em média.
Esse total equivale a só 1,8% das emissões da aviação comercial, porque essa, por óbvio, forma um mercado muito maior. Mas, ao calcular a emissão por passageiro, os jatos privados têm impacto proporcionalmente muito maior que os voos comerciais.
A equipe concluiu que 50% dos voos percorreu menos de 500 km.
Alguns jatinhos podem emitir mais gás carbônico por hora do que uma pessoa geraria em um ano. Logo, de acordo com o novo estudo, quem se desloca frequentemente nesse veículo VIP pode liberar 500 vezes mais dióxido de carbono do que outras pessoas ao redor do mundo.
Em média, 50 dos bilionários mais ricos do mundo voaram 184 vezes ao ano, e foram responsáveis por produzir mais carbono do que uma pessoa produziria em 300 anos.
Os voos aumentavam quando algum feriado estava perto ou algum evento mundial estava prestes a acontecer. Natais e anos novos registravam mais voos fugindo do inverno do hemisfério norte e chegando em destinos turísticos e tropicais. Nos meses de verão, Ibiza e Nice foram populares durante os finais de semana de Sol.
Em 2022, 1846 aviões particulares pousaram no Qatar para a Copa do Mundo. Outros picos de viagens foram o Festival de Filmes de Cannes, o Super Bowl, a COP 28, conferência do clima em Dubai e o Fórum Econômico Mundial em Davos. Sim, você não leu errado: encontros para discutir o aquecimento global e os impactos das mudanças climáticas levam ao maior uso de jatinhos.
Muitos dos jatos mais usados são ligados a celebridades, como o bilionário da Tesla Elon Musk, o antigo CEO do Google Eric Schmidt, a celebridade Kim Kardashian e o cantor Jay-Z, segundo dados do site data Celebrity Jet. Mesmo assim, o estudo não exclui grandes políticos, outros super-ricos anônimos e donos de grandes negócios.
Em termos geográficos, o líder do ranking foi os Estados Unidos, que concentra 69% dos voos particulares. Mas o Brasil vem logo atrás, com 3,5% de viagens. Canadá, Reino Unido e Austrália também entram no top 10.
Em 2023, o total de emissões derivadas de jatinhos particulares foi de mais de 15 milhões de toneladas – mais do que as 60 milhões de pessoas emitiram na Tanzânia no mesmo período.
Durante a pandemia, em 2020, os números ficaram estáveis, mas, já no ano seguinte, voltaram a crescer – bem diferentes das grandes aeronaves da aviação comercial, que sofreu bastante nos dois anos.
Se estava ruim, ainda tem como piorar: a expectativa é que outros 8.500 jatinhos entraram em circulação em 2024. Os pesquisadores realçam a enorme desigualdade entre as emissões na conta dos ricaços, em comparação com a parcela dos mais pobres.
“Se os muito ricos não têm que reduzir as suas emissões… então não temos qualquer razão para que mais ninguém reduza também, porque todos os outros estão emitindo menos”, disse Stefan Gössling, líder da pesquisa, para a New Scientist.
O pesquisador disse que uma solução para isso seria cobrar dos passageiros dos jatos pelo estrago climático. Cada tonelada de CO2 custaria 200 euros. “Basicamente, parecere justo que as pessoas paguem pelos danos que estão causando pelo seu comportamento”, disse Gössling ao The Guardian.
A pesquisa foi publicada na Nature Communications Earth & Environment.