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Respostas para as perguntas que surgem entre a primeira e a última página e outras notas de rodapé sobre livros fundamentais – e outros nem tanto. Por Pâmela Carbonari

Por que a diversão é tão útil para a humanidade

Por Pâmela Carbonari Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 4 set 2024, 15h38 - Publicado em 2 Maio 2018, 18h34

Quem ama o tédio, divertido lhe parece. Apesar da diversão ser um conceito tão relativo quanto a beleza, a paródia do ditado é tão verdadeira quanto a de que a necessidade é a mãe da invenção.

Para muita gente, o prazer está nos intervalos entre as obrigações, no escritório das 8 às 18h, no caminho entre pagar as contas. Para outros, a diversão está justamente nesses momentos que podemos antecipar na agenda, a caminho deles e enquanto podem ser mais que uma massa de músculos e ossos sentada na mesa de um bar, correndo em um parque ensolarado ou imóvel diante da escuridão de uma tela de cinema. O mundo é uma fonte inesgotável de diversão – e ela, por si só, também move o mundo.

O escritor de ciência americano Steven Johnson acredita que o prazer é o motor da inovação. Em seu décimo livro, O poder inovador da diversão: como o prazer e o entretenimento mudaram o mundo, lançado no Brasil pela editora Zahar, ele mostra a importância da música, dos jogos, da mágica, da comida, do sexo e de outras formas de diversão para chegarmos onde estamos e para que tipo de futuro esses passatempos nos levarão.

“Às vezes as pessoas inventam coisas porque querem se manter vivas ou alimentar seus filhos ou conquistar uma aldeia próxima. Mas, frequentemente, novas ideias surgem no mundo simplesmente por serem divertidas. E o mais estranho de tudo: muitas dessas invenções divertidas, mas aparentemente frívolas, acabaram por desencadear transformações muito importantes na ciência, na política e na sociedade.”

Do jogo de dardos veio a estatística. A flauta de osso pode ser a ancestral do computador que você lê este artigo. As caixas de música serviram de inspiração para os teares. Com uma prosa leve e bem-humorada (à prova de hipocrisias), Johnson explica como tecnologias fundamentais para o nosso tempo nasceram e evoluíram de objetos e engrenagens que não tinham outro objetivo senão entreter. Ele nos convence de que não existe uma história da política, outra da religião ou das grandes revoluções tecnológicas, mas várias versões, com diversos agentes que contam uma só: a nossa – e que a necessidade de sentir prazer também faz parte dela.

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Em entrevista à SUPER, o autor conta qual a utilidade do que nos parece inútil.

Steven Johnson
(Steven Johnson/Divulgação)

Somos naturalmente hedonistas. E, como você diz, a diversão ajudou a moldar a humanidade. Você acha que o prazer é a chave para a inteligência?
Eu não diria que o prazer é “a” chave para a inteligência, mas sim que é um elemento subestimado de inteligência. Em outras palavras, tendemos a supor que pessoas inteligentes usam suas habilidades mentais em busca de problemas sérios que tenham clara utilidade ou recompensa econômica por trás deles. Mas o pensamento inteligente é muitas vezes desencadeado por experiências mais lúdicas, como os nossos ancestrais do Paleolítico que esculpindo as primeiras flautas de ossos de animais descobriram como posicionar os buracos para produzir os sons mais interessantes. Essas inovações exigiram uma grande dose de inteligência – dado o estado do conhecimento humano sobre a música e o design de instrumentos há 50 mil anos – mas esse tipo de coisa não era “útil” em nenhum sentido tradicional.

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A história da diversão sempre esteve à margem dos registros históricos mais sérios e práticos, como guerras, poder e igualdade, por exemplo. Você acha que a diversão estava implícita nesses eventos ou foi ignorada pelos historiadores?
Acho que tem sido amplamente ignorada pelos historiadores. E quando foi observada e narrada, os relatos históricos foram muito limitados: há histórias sobre moda, jogos ou temperos, mas como narrativas separadas. Olhamos para a longa história da civilização de maneira diferente se contarmos a história do comportamento “lúdico” como uma categoria mais abrangente – esse era meu objetivo ao escrever O poder inovador da diversão. Essa história é muito mais importante que a maioria das pessoas imagina.

Nesse seu último livro, você diz que os prazeres inúteis da vida geralmente nos dão uma pista sobre futuras mudanças na sociedade. O que podemos prever para o futuro a partir dos nossos prazeres mais comuns agora?
Provavelmente o melhor exemplo recente foi a mania de Pokémon Go. Eu posso imaginar-nos olhando para trás em 2025, quando muitos de nós estarão usando regularmente dispositivos de realidade aumentada para resolver “problemas sérios” no trabalho, e vamos perceber que a primeira adoção dominante dessa tecnologia veio de pessoas correndo pelas cidades capturando monstros japoneses imaginários em seus telefones.

Na ficção, costumamos imaginar o futuro como algo distópico, triste, apático, sem sentimentos positivos ou prazeres. Você acredita que isso pode, de fato, acontecer?
É muito importante imaginar futuros onde estamos mais felizes, onde há mais prazer e mais experiências lúdicas em nossas vidas. Mesmo que esses futuros imaginados sejam utópicos – e é improvável que se tornem realidade –, imaginá-los nos dá algo para nos orientarmos como sociedade.

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O impulso por novidades e surpresas nos move e nos expõe a riscos. O que você acha das redes sociais, que nos condicionam a sempre saber mais sobre a vida dos outros e nos expor a uma existência sem privacidade?
Sou relutante em colapsar todas as diferentes plataformas em uma única categoria de “rede social”. Acho que o Twitter e o Facebook, para abordar as duas principais redes que uso, são completamente diferentes – em parte devido a diferenças em sua arquitetura. Twitter para mim é uma fonte maravilhosa de surpresa e serendipidade – até quando 50% da minha linha do tempo é sobre Trump! Estou constantemente tropeçando em algum link fascinante ou em um tweet hilário sobre algo que eu não tinha ideia de que me interessava. O Facebook, por outro lado, não tem o mesmo sentimento de prazer para mim.

Por que a humanidade precisa se divertir?
Esta é uma questão verdadeiramente profunda. Algumas coisas que consideramos divertidas (sexo, comida, por exemplo) têm claras explicações evolutivas sobre por que nossos cérebros devem achá-las prazerosas. Mas o tipo de diversão que descrevo em O Poder Inovador da Diversão – o prazer de ver uma boneca robô imitar um humano, ou a diversão de jogar um jogo de tabuleiro – é mais difícil de explicar. Eu acho que tem a ver com a experiência de novidade e surpresa; uma parte significativa de nossa inteligência vem do nosso interesse em coisas que nos surpreendem desafiando nossas expectativas. Quando experimentamos essas coisas, temos um pequeno estímulo que diz: “Preste atenção nisso, isso é novo”. E assim, ao longo do tempo, os sistemas culturais se desenvolveram para criar experiências cada vez mais elaboradas para surpreender outros seres humanos: desde as primeiras flautas de osso, até os novos e brilhantes padrões de tecido de chita, todas as formas de Pokémon Go. É uma história antiga; temos muito mais oportunidades e tecnologias para nos surpreender do que nossos ancestrais.

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