Antimatéria encontrada em nuvem de tempestade
Por Fábio Marton Talvez você tenha ouvido lá no segundo grau a explicação para os raios: eles se formam pela diferença no potencial elétrico entre o solo e as nuvens. É uma explicação melhor do que “Zeus está bravo com você”, mas é bastante simplista. O fato é que, séculos de anos depois de Benjamin […]
Por Fábio Marton
Talvez você tenha ouvido lá no segundo grau a explicação para os raios: eles se formam pela diferença no potencial elétrico entre o solo e as nuvens. É uma explicação melhor do que “Zeus está bravo com você”, mas é bastante simplista. O fato é que, séculos de anos depois de Benjamin Franklin ter soltado sua pipa, provando que eles produzem uma descarga elétrica, ainda não sabemos dizer exatamente como, por que e quando eles vão se formar.
Às vezes, onde menos se espera [EPA/Antônio Lacerda]
E a explicação acaba de ficar ainda mais complicada. Em 2009, Joseph Dwyer, da Universidade de New Hampshire, e diversos colegas, voavam num jatinho comercial Gulfstream V adaptado para pesquisas meteorológicas. Por acidente, acabaram indo parar no meio de uma forte tempestade. O avião subitamente perdeu altitude e foi jogado de um lado para outro, até conseguir escapar. “Eu realmente achei que iria morrer”, disse Dwyer à Nature.
Mas esse breve momento de terror foi recompensado por uma incrível descoberta científica, que levou a anos de estudo, cujos resultados só estão sendo divulgados agora. Dentro da nuvem, Dwyer e seus colegas passaram duas vezes por áreas cheias de pósitrons – a versão antimatéria do elétron. Depois disso, detectaram uma emissão de raios gama.
Toda a partícula de matéria tem sua correspondente em antimatéria. É basicamente a mesma coisa, com a mesma massa, mas sinal elétrico invertido – o próton é positivo, o antipróton é negativo, e vice-versa com o elétron e o antielétron. Quando essas partículas encontram suas opostas, são aniquiladas, gerando fótons e neutrinos, numa explosão de raios gama.
A ordem dos fatores é que o torna a descoberta relevante. Já era sabido que as tempestades podem causar emissões de raios gama, e essas emissões podem gerar pares de elétrons e pósitrons quando interagem com o ar. Mas o que aconteceu deixou os próprios cientistas perplexos: “Deveríamos ter visto emissões luminosas de raios gamas junto com os pósitrons”, afirmou Dwyer ao Phys.org. “Mas, em nossas observações, primeiro vimos uma nuvem de pósitrons, depois outra sete quilômetros adiante, e só então vimos o brilho dos raios gamas. Então isso tudo não está fazendo muito sentido.”
A banca está aberta para explicações. Os cientistas da equipe de Dwyer estão meio que jogando a toalha: após cinco anos de pesquisa, não chegaram a uma resposta satisfatória. “O fenômeno dos pósitrons pode estar nos dizendo uma novidade sobre como as tempestades se carregam e criam relâmpagos, mas nossa descoberta definitivamente complica as coisas, porque não se encaixa na ideia que estava se formando”, afirma Dwyer.
Entre as teorias, está a de que a antimatéria foi produzida por raios cósmicos, que o próprio avião tenha ficado sobrecarregado de energia e causado a emissão de pósitrons ou – a favorita dos cientistas – que eles tenham visto o começo de um “relâmpago escuro”, uma emissão que produz quase nenhuma luz, mas muita radiação gama e pósitrons.
Dwyer diz que pretende continuar sua pesquisa, mas usando balões meteorológicos. Uma vez basta em arriscar a sorte com a ira de Zeus.
“Se os mortais me representarem com a voz de Morgan Freeman, eu posso até dar uma dica”.