Cérebros de músicos clássicos e de jazzistas funcionam de formas diferentes
O jazz está mais preocupado com a escolha de notas. Já música clássica se concentra em como tocá-las. E isso se revela na atividade cerebral dos músicos
Começar posts com citações é meio careta, mas nesse caso vale a pena. O pianista Dave Brubeck teria dito, certa vez, que “o jazz deve ser a voz da liberdade: vá lá, improvise, se arrisque e não seja perfeccionista – isso é coisa de quem toca música clássica”.
Seis anos após a morte do músico, sua afirmação foi posta a prova no laboratório. Em um artigo científico publicado em dezembro de 2017, pesquisadores do Instituto Max Plank, na Alemanha, colocaram pianistas dos dois gêneros – jazz e clássico – para tocar com a cabeça enfiada em uma máquina de eletroencefalograma.
Eles queriam descobrir se, observando a atividade cerebral dos voluntários em um gráfico, seria possível identificar diferenças na maneira como os dois tipos de músico pensam. Em outras palavras, se o perfeccionismo é mesmo coisa de fã de Mozart.
Para fazer isso, colocaram os músicos para tocar sequências de acordes estranhas e inesperadas, que raramente aparecem em peças comuns. Para entender melhor: acordes são grupos de três ou mais notas que servem de alicerce para as canções. Quando você ouve uma peça que só tem voz e violão, a voz faz a melodia, e o violão, os acordes. Todo músico profissional, quando vê um acorde, sabe intuitivamente qual será o próximo – ou pelo menos tem uma lista mental de possíveis candidatos.
O pop e o rock usam muitas sequências óbvias e previsíveis – conheça algumas aqui. Mas gêneros como o jazz e bossa nova são conhecidos justamente por quebrarem as expectativas. Os acordes costumam ter bem mais do que três notas, e são colocados em sequências muito sofisticadas. Sua chance de adivinhar o que vem depois é tão alta quando a de ganhar na loteria. Em resumo: para tocar jazz, tem que ser muito bom de improviso.
Os músicos clássicos, por sua vez, estão acostumados a seguir suas partituras à risca. E quando você já sabe de antemão qual nota tocar, o jeito de tocar se torna mais importante. Tudo conta: a intensidade com que a tecla é pressionada, variações sutis no andamento da peça e até a ordem em que os dedos serão usados em cada frase. É disso que falava Brubeck.
Na hora de analisar os exames, essa diferença fundamental na maneira de abordar a música se sobressaiu nos gráficos de atividade cerebral. De forma simplificada, os pianistas de jazz reagiram mais rápido às mudanças de acordes estranhas, mas nem sempre posicionavam os dedos da melhor maneira possível para tocá-los. Já os músicos clássicos eram bem mais lentos no gatilho, mas quando finalmente reagiam, seus dedos se moviam com mais precisão.
É claro que essas são sutilezas difíceis de perceber se você for leigo. Mas ainda dá para entender um dos passatempos favoritos de jazzistas talentosos: mudar a sequência de acordes que vai embaixo de uma música de brincadeira, só para fazer algo familiar soar estranho. No vídeo aí embaixo, por exemplo, um músico demonstra 10 jeitos diferentes de tocar Parabéns para Você. Pule para o minuto 3:00 e divirta-se.