Como aumentar a produtividade da sua empresa (e da sua vida)
Manual anti-procrastinação: métodos e ferramentas para te ajudar a ser mais produtivo
Davi Gabriel da Silva é um consultor de métodos ágeis e agente de mudanças organizacionais que atua com projetos de tecnologia há quase uma década. Entusiasta de temas como autogestão, empoderamento e autonomia no trabalho, ele é especialista em aumentar a eficácia de times corporativos usando o método de organização Getting Things Done, ou GTD. Traduzido como “A arte de fazer acontecer”, esse método foi criado pelo especialista em produtividade David Allen e se baseia na ideia de que podemos ser mais produtivos e controlar nosso stress por meio da organização do excesso de pendências que rondam a nossa mente.
“Sempre fui fascinado pela forma como nós, enquanto empresas e indivíduos, nos organizamos para alcançar algo maior”, conta. “Mas foi só quando o time de desenvolvimento de software do qual eu fazia parte falhou miseravelmente que decidi estudar a fundo sobre isso. Depois que comecei a entender mais sobre formação de times, metodologias de gestão e modelos organizacionais, decidi me dedicar integralmente a isso”, diz.
Durante o período em que trabalhamos juntos em uma startup, Davi fez treinamentos que me ensinaram muita coisa sobre organização e produtividade – não apenas dentro de empresas, mas também para a minha vida pessoal. “O trabalho do século 21 é predominantemente criativo e colaborativo, então a comunicação e as relações entre as pessoas são fundamentais. Ainda achamos que somos ‘apertadores de parafuso’ e temos que fazer a nossa ‘função’ bem, mas não paramos para refletir sobre essa função.”
Nesta conversa, discutimos o conceito de produtividade e falamos sobre alguns dos métodos e ferramentas disponíveis para ajudar a buscá-la sem perder de vista nossos reais objetivos.
O que é produtividade para você? E para as empresas?
Para mim, produtividade é ser eficiente (fazer certo a coisa) e eficaz (fazer a coisa certa). A visão das empresas com relação à produtividade ainda está muito pautada no primeiro critério (eficiência) e pouco no segundo (eficácia). Muitas pessoas acham que um dia produtivo é aquele em que você fica o tempo todo na frente do computador fazendo a sua função, sem interrupções. Mas isso é ser eficiente. Não necessariamente você está sendo eficaz, ou fazendo a melhor coisa para você e para a sua organização.
Por que escolheu trabalhar com o método Getting Things Done, ou GTD?
Eu o escolhi por ser muito provocativo – ele desafia algumas recomendações tradicionais de “gestão do tempo” – e por não ser apenas uma ferramenta de produtividade: o objetivo principal dele é reduzir o stress! Existem dois aspectos do método que eu gosto muito.
O primeiro é o chamado de “mente clara como água”. A visão clássica de produtividade é você estar trabalhando em um ritmo alucinado, pegando cada vez mais trabalho. Mas o GTD diz que, para você ser mais produtivo, a sua mente precisa estar tranquila, descansada e “clara como água”. Para isso, você precisa esvaziar completamente a cabeça, de modo a se concentrar no que você está fazendo neste exato momento.
O segundo é “pare de simplesmente criar to-do lists”. Muitas metodologias de “gestão do tempo” dizem que você deve criar listas de coisas a fazer, planejando assim tudo o que você pretende executar em um determinado dia/data. Acontece que é praticamente impossível prever o que você vai fazer ou deixar de fazer hoje ou amanhã. O resultado é que, no final do dia, você acaba adiando diversas tarefas para o dia seguinte, e assim sucessivamente.
Isso é uma fonte de stress. O GTD propõe uma abordagem na qual você cria listas de “próximas ações”, sem especificar “prazos artificiais” para coisas que não têm prazo. Dessa forma, você experimenta uma sensação de tranquilidade. Quando você está “livre”, seleciona uma ação da sua lista de “próximas ações”.
Todas as startups costumam ser fãs de ferramentas de organização de tempo e produtividade, mais do que as empresas convencionais? Por quê?
As startups vivenciam todos os desafios das empresas tradicionais mais a escassez de recursos e a necessidade de encontrar um modelo de negócio escalável. Toda essa “pressão” faz com que a produtividade (fazer bem a coisa certa) seja muito importante.
Como garantir que a busca pela produtividade (tanto na vida pessoal quanto no trabalho) não esteja sobrecarregando os indivíduos?
Focando no segundo aspecto da produtividade: a eficácia. Trabalhar em um ritmo sustentável é importante para que possamos continuar fazendo a coisa certa por um longo período de tempo. Se focamos só em fazer bem uma determinada coisa (eficiência), a tendência é dedicarmos cada vez mais tempo a ela. Mas precisamos trabalhar de forma inteligente também! E isso significa ritmo sustentável.
O que é preciso para validar um método de produtividade? Como você avalia se ele é bom ou não?
Acho que muitos métodos podem funcionar. Prefiro o GTD pela simplicidade e objetividade. Mas, para mim, o método não é tão relevante assim: o que importa é se você vai ter disciplina para segui-lo!
Individualmente, como uma pessoa pode avaliar se uma ferramenta serve para ela ou não? Como saber se é hora de persistir ou abandoná-la?
Acredito que a melhor forma de avaliar é testando. Eu já usei diversas ferramentas e até costumo trocá-las com uma certa frequência. Um bom critério de avaliação é se ela comporta todas as informações que você precisa registrar. Eu gosto de anotar o nome da tarefa, a lista/categoria, o contexto (local) e eventualmente uma data. Uma ferramenta sem esses quatro campos é inviável para mim. Outra coisa que eu acho importante é a capacidade de repetir (tornar recorrentes) as tarefas. Acho que as pessoas não devem investir esforço em usar uma ferramenta específica (se exige esforço, não serve), mas focar na disciplina de ter um registro.
A rotina de trabalho de oito horas vem sendo questionada, inclusive porque pesquisas mostram que trabalhar menos horas pode ser mais produtivo. Qual é a sua opinião sobre essa discussão?
Acho que isso entra na mesma linha da questão da eficiência X eficácia. Trabalhar menos, mas trabalhar nas coisas certas e com maior qualidade, vai certamente tornar você mais produtivo. As empresas brasileiras ainda focam a sua atenção muito na eficiência, achando que manter todos ocupados o tempo inteiro é a coisa mais importante em uma organização.
Você é a favor do home office?
Sim, sou a favor do home office. Mas eu acho que ele pode ser desvantajoso em equipes onde a interdependência entre as atividades de pessoas diferentes é grande. Mesmo usando todas as ferramentas de comunicação disponíveis hoje em dia (videoconferência, ferramentas de compartilhamento de arquivos, mensagem instantânea, etc.), ainda não temos tecnologia que possa substituir de forma satisfatória a comunicação face a face com um quadro branco. O home office pode tornar você mais eficiente, mas às vezes também o torna menos eficaz (pela falta de comunicação).
Pela sua experiência, que hábitos ou práticas têm sido eficientes em ajudar as pessoas a se tornarem mais focadas e organizadas?
O método GTD pode nos ajudar a registrar todas as nossas pendências, de modo a esvaziarmos a cabeça e nos tornarmos mais concentrados na atividade que estamos fazendo agora. Para isso, a aplicação de um “sistema confiável de organização” (que é a proposta do GTD) é vital. Eu tenho o meu sistema (uso o Remember the Milk) no qual registro todas as pendências da minha vida. Toda vez que lembro de alguma coisa importante, anoto lá e esqueço. Dessa forma eu consigo esvaziar a cabeça, pois confio que ele vai me avisar quando necessário.
Costumo utilizar uma técnica de priorização de quatro critérios: contexto, tempo disponível, energia e importância. Primeiro, avalio se estou no contexto adequado para executar uma tarefa: em casa, no trabalho, na internet, no cliente etc. Depois, vejo quanto tempo a tarefa pode levar e verifico se tenho o necessário. Por exemplo, entre uma reunião e outra, posso selecionar uma tarefa que leve menos de cinco minutos. O terceiro critério é o mais negligenciado e corresponde à energia disponível. Quando queremos executar algo com qualidade, precisamos avaliar se dispomos da energia mental ou física necessária. Por exemplo: costumo deixar as tarefas mais chatas para a parte da manhã, quando estou mais disposto. Também gosto de fazer exercícios nesse horário. Por último, temos o critério da importância, em que escolhemos qual o projeto ou ação mais relevante de acordo com outros fatores.
Você tem alguma história para contar de como conseguiu ajudar com o GTD uma empresa que estava com processos muito desorganizados?
Sim. Em muitas organizações as pessoas têm um hábito terrível de se comprometer com datas o tempo todo. É o famoso “o-quê-para-quando” (what by when). O que acontece é que essas pessoas ficam aceitando várias tarefas com prazos artificiais para criar um tipo de “compromisso consciente”. O problema dessa abordagem é que, quando aceitamos um projeto para uma determinada data, não olhamos toda a nossa lista de pendências e verificamos se a nova missão é possível e prioritária em relação ao resto. Pior ainda: muitas vezes nem sequer anotamos o que nos comprometemos a fazer. Em uma organização para a qual prestei consultoria, esse era um hábito terrível e muito frequente. Muito compromisso com datas e poucas entregas. Eu confrontei esse hábito fazendo diversas palestras e workshops de GTD, reforçando a importância de adotarmos um sistema confiável de registro e termos o hábito de “capturar” as pendências.
Algumas empresas tentam disseminar o uso de ferramentas de chat corporativo para diminuir o uso do e-mail. Você acredita que o e-mail atrapalha a produtividade?
A principal dificuldade do e-mail está associada ao fato de ele ser uma ferramenta assíncrona. O chat corporativo e as mensagens instantâneas são ferramentas de comunicação síncrona, o que permite maior agilidade na troca de informações. Acredito que por esse motivo o chat pode ser mais produtivo. Por outro lado, ele pode causar mais interrupções e desvio de atenção.
Este conteúdo foi originalmente publicado no livro Seja mais produtivo. Agora, da jornalista Ana Prado.