André Santoro
Se o mundo inteiro pusesse cigarros, charutos e cachimbos na ilegalidade de uma hora para outra, milhões de vidas seriam poupadas. Mas é provável que o custo fosse alto demais, já que algo precisaria ser feito com mais de 1 bilhão de viciados e criminosos em potencial. Fabricantes e usuários seriam empurrados para a clandestinidade. “Caso o produto fosse banido, seria criado um mercado paralelo semelhante ao que surgiu com a lei seca, nos EUA”, diz a consultora Vera da Costa e Silva, ex-diretora da Iniciativa por um Mundo Livre de Tabaco, da Organização Mundial da Saúde (OMS). Na década de 1920, quando a venda de bebidas alcoólicas foi proibida em solo americano, o crime organizado aproveitou para encher os bolsos no mercado negro. Os especialistas consideram os benefícios da proibição tão incertos que, mesmo diante da perspectiva de um mundo sem fumaça, eles preferem apostar em medidas mais graduais. “Estratégias para reduzir o consumo, como as mensagens de advertência estampadas nos maços de cigarro vendidos no Brasil, são mais eficientes do que o banimento total do produto”, afirma Stanton Glantz, diretor do Centro para Educação e Pesquisa do Controle do Tabaco, da Universidade da Califórnia em São Francisco. Além disso, uma ação mundial teria de ser aprovada por órgãos internacionais como a ONU ou a própria OMS e soaria como uma declaração de guerra à poderosa indústria do fumo. Entre outros argumentos, as empresas alegam que a proibição criaria legiões de desempregados – na China, por exemplo, 3% dos agricultores trabalham em lavouras de tabaco. Mas um estudo feito pelo economista Kenneth Warner, da Universidade de Michigan, mostrou que, ao menos nos EUA, a compensação viria de postos de trabalho criados em outros setores. Até hoje, só o Butão, um país asiático com pouco mais de 2 milhões de habitantes, conseguiu proibir a venda e o consumo em público de produtos feitos de tabaco.
Convite ao crime
O 1,3 bilhão defumantes estimulariamo comércio ilegal
Rede de abastecimento
Assim como há plantações de coca e maconha, o tabaco seguirá ocupando parte da terra arada. Hoje, os 5 maiores produtores são: China, Índia, Brasil, EUA e Turquia. Caso o fumo fosse proibido, os EUA poderiam rastrear as plantações ilegais – mas não os países pobres. É provável que o maior produtor continuasse sendo a China, que tem, sozinha, 35% das plantações.
Hordas de viciados
Todo mundo teria amigos e familiares “drogados”: os fumantes clandestinos seriam muito mais numerosos que os usuários de outras drogas, já que há 1,3 bilhão de tabagistas no mundo. A ilegalidade e o provável aumento no preço faria muita gente largar o vício. Mas o processo seria demorado e difícil – segundo alguns estudos, a nicotina causa tanta ou mais dependência do que substâncias como a heroína.
Apoio aos dependentes
Doenças relacionadas ao tabaco matam 5 milhões de pessoas por ano. A proibição reduziria drasticamente esses números, mas seria necessária a criação de centros de atendimento aos dependentes, nos moldes dos que existem hoje para usuários de outras drogas ilegais. Também deveriam surgir grupos de ajuda para quem não conseguisse deixar o vício.
Combate ao tráfico
A proibição aumentaria – e muito – o comércio ilegal de produtos de tabaco. Para reprimir o tráfico, seria preciso fortalecer as polícias, criando departamentos especiais para essa função. Além disso, os órgãos de repressão do mundo todo teriam de trabalhar juntos. Para fiscalizar o consumo, só pondo mais policiais nas ruas.
Coisa de bandido
As vendas mundiais das 3 maiores fabricantes de cigarros somam mais de 120 bilhões de dólares anuais. Se o tabaco fosse proibido, traficantes de vários países tentariam ganhar dinheiro com o produto. Como ocorre com todas as drogas ilegais, o comércio de tabaco contribuiria para o aumento da violência nas cidades e no campo.
Cigarros turbinados
Os cigarros comuns, vendidos legalmente, têm mais de 4 mil substâncias tóxicas. Caso o tabaco fosse proibido, os produtores ilegais poderiam fazer cigarros mais mortíferos e com potencial para criar uma dependência ainda maior, como o fumo tipo Y-1, com o dobro de nicotina da planta tradicional.