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O trânsito parou. E agora?

A velocidade média nos horários de pico é de 13 km/h. E o transporte coletivo no Brasil, pelo que oferece, não vale nem os centavos que sobram na carteira. A solução? Pôr a cabeça para funcionar. E, de quebra, virar as cidades do avesso

Por Natália Garcia
Atualizado em 31 out 2016, 18h54 - Publicado em 26 set 2013, 22h00

 

Sabe aquela brincadeira de que o trânsito um dia ainda ia parar de vez? Esse dia chegou. Parou tudo. E os aumentos nas tarifas de ônibus acabaram funcionando como a gota que faltava para levar milhares de manifestantes às ruas em 2013.

O problema central, você sabe, não foram exatamente os centavos a mais. Mas outro bem maior: o colapso da mobilidade urbana. Ter de passar duas, três horas por dia abdicando da condição humana para assumir a de sardinha em lata até dá. Mas pagar caro por isso é dose. Todas as grandes cidades do País estão parando. Só vamos usar São Paulo nos exemplos adiante pelo simples fato de que há mais estudos sobre o travamento do trânsito na capital paulista. Para começar, ir de carro ou de ônibus para o trabalho já não é tão mais vantajoso do que ir a pé para os paulistanos: nos horários de pico, o trânsito rasteja a uma velocidade média de 13 km/h.

A gordura nas artérias do trânsito você conhece bem: os carros. O número de veículos quase dobrou em dez anos nas 12 maiores cidades do Brasil: foi uma subida de 77% entre 2001 e 2011. A de São Paulo dobrou mesmo: e hoje são 7,4 milhões de automóveis entupindo a circulação urbana. Nada mais anacrônico, diga-se: no mundo desenvolvido, as pessoas dirigem cada vez menos. Em Tóquio, por exemplo, existem 308 carros para cada mil habitantes. Em Londres, 225. São Paulo tem 630. Aí não adianta buzinar.

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Se não está fácil para o Sr. Volante, pior ainda para o Sr. Andante: de 2004 para cá, as viagens de ônibus cresceram 80% em São Paulo, impulsionadas pelo Bilhete Único (que permite fazer até quatro viagens em 3 horas). O Bilhete, em si, é uma solução ótima: transforma todos os pontos de ônibus da cidade em terminais, em que você não paga para tomar um segundo ônibus. Mas o fato é que o sistema não estava preparado para esse aumento na demanda.

E agora? “Uma das soluções é modificar a prioridade das vias, que está errada”, diz o superintendente da Associação Nacional dos Transportes Públicos (ANTP), Luiz Mantovani Néspoli. Apenas 20% dos paulistanos se locomovem em automóveis, mas ocupam 80% das vias públicas. Claro que esse abacaxi todo não se resolve da noite para o dia. Para começar, todos os sistemas de transporte precisam ser coordenados em uma rede integrada. Metrô, ônibus, vias para carros, ciclovias e até calçadas têm de ser pensadas como parte de um organismo.

Quem pensa nesse organismo, no caso de São Paulo, é o Plano Integrado de Transporte Urbano (PITU). O último PITU, de 2005, tinha planejado construir, até 2012, 90 km de infraestrutura para os ônibus. Só pena que, ao final do prazo, fizeram zero quilômetro. Mas ok. Vamos por partes.

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Parte um: metrô. Quanto mais metrô, melhor, como bem sabem os chineses, que construíram 454 quilômetros de linhas em Xangai só de 1995 para cá. Mas metrô é caro, lógico: a linha 4 do Rio de Janeiro, que está em obras e ligará Ipanema à Barra da Tijuca, está orçada em R$ 8,5 bilhões (o BNDES precisou bancar a metade, emprestando para o Estado do Rio).

Por outro lado, o trânsito não é nada barato: R$ 40 bilhões por ano, segundo um estudo do economista Marcos Cintra, vice-presidente da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Seriam R$ 10 bilhões em “gastos diretos” (como combustível queimado enquanto os carros e ônibus estão parados), mais R$ 30 bilhões em gastos indiretos, como negócios que demoram a ser fechados porque as partes envolvidas estão engarrafadas, cada uma num canto da cidade.

Mas ok. O Brasil não é a China, e metrô não dá em árvore. Mas criatividade dá. E basta um pouco dela para tornar os ônibus, a parte dois do problema, mais eficientes. É o caso do sistema BRT (Bus Rapid Transit), que funciona em Curitiba há mais de 20 anos: os passageiros pagam o bilhete na entrada de uma plataforma de embarque, que fica no mesmo nível dos ônibus, e entram nele por todas as portas. Com um fluxo de pessoas e veículos mais rápido e menos profissionais trabalhando (não há cobrador no BRT), o sistema fica mais barato e eficiente.

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Agora, a parte três: os carros. O gasto com a manutenção da infraestrutura para o transporte individual no País todo é de R$ 12,6 bilhões por ano (segundo a ANTP). A infra do transporte público custa R$ 900 milhões. Ou seja: carros custam 14 vezes mais para os cofres públicos. Bom, a forma mais democrática de coibir o uso do automóvel é o pedágio urbano, a exemplo do que acontece em Londres. Quer ir de carro? Ok. Mas pague também, como pagam os usuários de ônibus. Isso inibiria o uso desnecessário. E desafogaria um pouco as vias.

Só que nada vai resolver o problema se não repensarmos as próprias cidades. O fato de as pessoas trabalharem no centro e viverem nas periferias, por exemplo, cria distorções absurdas. Só na zona leste de São Paulo, uma turba equivalente à população do Uruguai se desloca todos os dias até o centro. São 3 milhões de pessoas. Para propiciar conforto aí, só com teletransporte mesmo.

Ou com inteligência: cobrar menos impostos municipais de empresas que se instalem na periferia é um caminho – um que a própria prefeitura de São Paulo está seguindo. Para que tudo dê certo, porém, talvez seja necessário um abatimento também nos impostos estaduais e federais. Precisamos, então, de muita coordenação política. Mas que seja: a função da política é garantir o bem da maioria. E foi justamente para lembrar os políticos desse detalhe que as pessoas saíram às ruas, atrapalhando o tráfego.

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