Assine SUPER por R$2,00/semana
Continua após publicidade

O fim da criatividade em Hollywood

As grandes produtoras tentam se salvar investindo praticamente só em sequências, personagens conhecidos e fórmulas manjadas. Mas a história deixa claro: isso é um tiro no pé

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h53 - Publicado em 6 jan 2013, 22h00

Alexandre Carvalho dos Santos

O melhor cartão de visita do planeta tem só 22 letras: The name is Bond. James Bond. Já vêm à cabeça um dry martíni “mexido, não batido” e o arsenal de gadgets mortíferos. Todo o imaginário do agente secreto mais charmoso do mundo, que se firmou ao longo de 50 anos nas telas: de 007 Contra o Satânico Dr. No – a estreia em 1962, com Sean Connery – ao novo Skyfall, com Daniel Craig. São 23 filmes, a maior franquia da história do cinema.

E agora um vilão com mais de 30 anos de tela vai voltar das cinzas – ou da Estrela da Morte: Darth Vader. E pelas mãos do Mickey Mouse. Porque a Disney acaba de fechar um negócio das galáxias, comprando a Lucasfilm – a produtora de George Lucas – por US$ 4 bilhões. A nova dona da marca Star Wars não perdeu tempo em anunciar mais uma trilogia, para 2015. É outra aposta à prova de azar de uma empresa que não quer saber de riscos, investindo em marcas que já chegam ao cinema com um público formado – as outras foram a Pixar e a Marvel (veja mais na pág. 42).

Natural: as franquias são uma aposta segura. Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge alcançou US$ 447 milhões nas bilheterias americanas. Os Vingadores, então, US$ 623 milhões. Para efeito de comparação, o último filme do Woody Allen – Para Roma, com Amor – fez US$ 16 milhões. Na primeira semana de exibição, de cada US$ 3 gastos com ingresso para cinema nos EUA, um ia para o filme com os heróis da Marvel. A tendência é clara: os fãs fazem fila para ver personagens que já conhecem. Caso contrário, preferem ficar em casa com suas TVs de Led.

Continua após a publicidade

Por conta disso, as produtoras decidiram colocar todos os ovos na cesta das franquias. Em 2008, por exemplo, a Warner fechou duas subsidiárias especializadas em filmes independentes – a Warner Independent Pictures e a Picturehouse – alegando foco no “custo x benefício”. A própria Disney, que tinha comprado a indie Miramax em 1993, repassou-a em 2010 para o Filmyard Holdings, um grupo de investimentos. Naquele mesmo ano, outra independente famosa, a Weinstein Company, só se salvou do buraco porque vendeu os direitos de mais de 200 de seus títulos para o grupo Goldman Sachs.

Esse eterno retorno às sequências pode parecer bom no momento para os cofres das produtoras, mas acaba sendo ruim para o cinema – e sobrando para o lado delas também. A falta de renovação, afinal, enfraquece a própria vontade do espectador de sair da sua casa, pagar estacionamento e pipoca para ver mais do mesmo. Ou seja: até os blockbusters acabam sofrendo o baque. Nos EUA, a bilheteria de 2012 foi a pior desde 1995. Com Batman e tudo.

No fim das contas, abdicar da renovação sai caro para a indústria. Nos anos 70, foi um grupo de jovens criativos e ousados que tirou da lama o cinema americano – então num poço sem fundo por conta da concorrência da TV e do conservadorismo dos estúdios, que não acompanhavam a revolução comportamental da época. A venda de ingressos, que em 1946 tinha atingido o auge histórico de US$ 78,2 milhões por semana, despencou para US$ 15,8 milhões em 1971. Esses jovens, veja bem, eram Steven Spielberg, Francis Ford Coppola, Martin Scorsese… e o próprio George Lucas. Eles romperam com a tradição e se arriscaram em filmes “de autor”, à moda europeia, nos quais o estilo do diretor tem de estar acima dos padrões do estúdio. Optaram muitas vezes por atores pouco conhecidos, personagens anti-heróis e tramas sem final feliz. Acertaram na Mega Sena. O principal ingrediente da nova fórmula era justamente a independência (em relação ao que o estúdio imaginava que fosse dar certo). Se os produtores ficassem com a última palavra, o baixinho Al Pacino, por exemplo, não passaria do primeiro ensaio para O Poderoso Chefão. Coppola teve de bater o pé e se fingir de surdo para manter seu Michael Corleone.

Continua após a publicidade

Mas, no começo dos 70, os estúdios estavam tão desnorteados com a crise que toparam deixar a responsabilidade para aqueles hippies com câmera na mão. Resultado: Taxi Driver (Scorsese), Tubarão (Spielberg), além do próprio Chefão – e de Star Wars. Filmes que não tinham nada a ver com a fórmula hollywoodiana dos anos 50 e 60. O público adorou. As bilheterias venderam horrores, e os estúdios foram salvos. Justamente porque contrariaram as próprias regras.

Só que agora as produtoras estão na contramão disso. Em vez de dar espaço para a invenção, elas estão amarrando diretores criativos em padrões já testados. O diretor dos últimos Batman, Christopher Nolan, foi celebrado como um artista original em 2000, com Amnésia, um filme contado de trás para a frente. Na época, o diretor levou só 25 dias para filmar tudo, e desistiu de incluir Paranoid Android, do Radiohead, na trilha sonora porque o custo não cabia no orçamento, de US$ 9 milhões. Agora, dirigindo a franquia do justiceiro de Gotham, ele pôde gastar US$ 250 milhões. Mas com a obrigação de não sair da fórmula do herói blockbuster.

Os estúdios podem usar números recentes para alegar rejeição do público à criatividade. Vencedores do Oscar como O Artista (filme P&B e mudo) e Guerra ao Terror (que desbancou Avatar na premiação) fizeram sucesso com a crítica, mas se deram mal nas bilheterias. Só que, olhando só por esse lado, os produtores talvez estejam sofrendo da mesma amnésia do filme de Nolan. Porque a geração dos 70 mostrou que a liberdade criativa não serve apenas para revelar gênios do cinema: ela também é ótima vendedora de ingressos e de pipoca.

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Super impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 12,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.