Em tempos de musas fitness, relegada ao papel de inimiga da saúde e da estética, a gordura está cansada de tanta injustiça.
Texto: Camila Oliveira | Edição de Arte: Dois Pontos | Design: Andy Faria
Você ouve essa palavra e, quase imediatamente, imagina um prato lustroso de batata frita e, cena seguinte, o olhar de reprovação do seu médico. Mas esse estereótipo não faz jus à importância que ela tem na sua saúde. Sem ela, você não sobreviveria – mas, também, se a gordura da batata frita é a única que você conhece, está em sérios apuros.
A gordura também é importante
As gorduras compõem toda a estrutura das células do organismo humano, atuando como protetoras dos órgãos vitais, isolantes térmicos e reservas de energia. Para adultos, a gordura deve representar entre 15 e 35% da ingestão diária de calorias.
A falta de lipídios provoca alterações no sistema imunológico, deficiência para formar os hormônios sexuais, facilita as infecções e atrapalha o funcionamento do sistema digestivo. Também causa lesões na pele e queda de cabelo. O segredo é saber escolher quais gorduras vão ter lugar no seu prato.
As vilãs mais famosas são as saturadas, de origem animal – manteiga, queijos amarelos, banha, a gordurinha da picanha. O ideal é limitar seu consumo para 5% ou 6% do total de calorias – é que elas elevam os níveis de colesterol, o que pode levar a doenças do coração.
Mas nem tudo é preto no branco quando o assunto é alimentação: o óleo de coco, formado por 90% de gorduras saturadas, poderia ser bom: pesquisas indicam que quem complementou a dieta com alguns mililitros diários do óleo conseguiu emagrecer mais do que quem ingeriu a mesma quantidade do produto da soja.
Um fator que poderia explicar isso é que o óleo de coco contém mais de 45% de ácido láurico, um ácido graxo metabolizado rapidamente e não fica armazenado no tecido adiposo. Mas atenção: os estudos ainda são inconclusivos.
Já a gordura trans foi condenada. Ela pode ocorrer naturalmente, no intestino de alguns animais. A mais comum, no entanto, é artificial, criada em um processo industrial que acrescenta hidrogênio a óleos vegetais para deixá-los mais sólidos – por isso chamada também de hidrogenada. Comida congelada, biscoitos e margarina podem conter essa gordura, cujo consumo diário não deve passar de 1% do total de calorias.
As insaturadas (divididas em poli-insaturadas e monoinsaturadas) são as queridinhas dos especialistas e essenciais em uma dieta equilibrada. Líquidas em temperatura ambiente, regulam os níveis de colesterol e amenizam inflamações. Elas predominam em óleos vegetais, castanhas e sementes. A ingestão diária de 21% de gorduras poli-insaturadas também contribui para o bom funcionamento do sistema nervoso.
No calor da hora
O grande vilão das gorduras é o calor, que muda a estrutura molecular dos óleos. As moléculas reagem com o oxigênio e produzem aldeídos, que já foram relacionados a doenças do coração e a alguns tipos de câncer. Há aldeídos voláteis, que desaparecem no cozimento, mas há os que permanecem na comida.
Ano passado, a rede britânica BBC fez uma experiência: pediu a voluntários que usassem óleo de girassol, vegetal, de milho, de canola, azeite, manteiga e banha animal para fritar. Depois de usadas, as amostras foram enviadas para o professor Martin Grootveld na De Montfort University Leicester.
Não dá para cortar. As gorduras devem responder por 15% do total de calorias diárias, sob pena de problemas que vão de queda de cabelo a deficiência nos hormônios sexuais.
Os óleos ricos em gorduras poli-insaturadas – de milho e de girassol – geraram níveis altos de aldeídos. Já os óleos de oliva e canola, a manteiga e a banha produziram menos aldeídos, porque são mais estáveis quando aquecidos.
As conclusões foram: use a menor quantidade possível de óleo; opte por um que tenha gorduras monoinsaturadas ou saturadas e seja pobre em poli-insaturadas. O azeite é a melhor opção: tem 76% de monoinsaturadas, 14% de saturadas e 10% de poli-insaturadas.
O ser humano tem uma predisposição a gostar de alimentos gordurosos e isso é instintivo. Na pré-história, o consumo de alimentos calóricos influenciou a evolução dos primeiros humanos. Nosso cérebro se acostumou com isso. À medida que você consome mais gordura, o hipotálamo lateral, por onde drogas como a cocaína passam, é acionado. Ou seja: a gordura vicia mesmo. Quanto menos você exagerar, melhor.