Eldorado fica no Egito: expedição descobre ouro em cidade submersa
Após dois meses nas ruínas de Heracleion e Canopus, arqueólogos descobriram jóias e moedas de ouro que datam do Império Bizantino.
Heracleion – também chamada de Thonis, seu nome para os egípcios – permaneceu intocada por séculos, sob as águas da baía de Abu Qir, no delta do rio Nilo, até ser redescoberta em 2000. Desde então, arqueólogos mergulham de tempos em tempos para mapear as ruínas dessa cidade submersa. Você pode ver muitos dos artefatos encontrados por lá sem sair da cadeira, acessando este mapa interativo.
Heracleion foi uma cidade grande, e algumas cidades menores, que ficavam em seu entorno e dependiam dela economicamente (uma espécie de região metropolitana), também estão submersas até hoje. Uma delas se chama Canopus, e foi visitada na série de mergulhos mais recente – que durou dois meses.
A grande descoberta foi que, no quesito cidades míticas, Canopus está mais para Eldorado do que Atlântida: a cidadezinha estava repleta de itens de ouro maciço. Coisa de filme da Disney, mesmo. Os resultados foram divulgados pelo Ministério de Antiguidades do Egito.
Cidades como Heracleion e Canopus não estão encobertas só pela água, mas também pelos sedimentos que se acumulam no leito do rio. Ou seja: em muitos lugares, as ruínas estão camufladas por uma camada de terra e areia – só depois vem a camada de água. Assim, os pesquisadores precisam usar uma espécie de radar ou sonar para detectar as ruínas lá embaixo. Na varredura mais recente, esses aparelhos de detecção encontram prédios inéditos, que aumentam em 1 km a extensão de Canopus.
O motivo da manchete, porém, é que a equipe também encontrou diversas jóias e moedas de ouro que datam do Império Bizantino – o sucessor do Império Romano no leste da Europa e no Oriente Médio, que durou até um fim da Idade Média. Além disso, há uma coleção de cerâmica e moedas de bronze entre os destroços que data do período Ptolemaico, entre os anos 305 a.C. e 30 a.C.
Essa enorme janela de tempo (do período Ptolemaico até o Império Bizantino, que pertencem a períodos históricos completamente diferentes) sugere que a cidade foi habitada por mais de mil anos, entre o século 4 antes de Cristo e a era islâmica, no século 7 depois de Cristo.
Até aqui, falamos só de Canopus. Mas Heracleion, a cidade principal, também guardava surpresas. Os arqueólogos encontraram novas partes do templo de Amon, o principal da cidade, que hoje está completamente destruído. Havia também restos de um pequeno templo grego, colunas, navios antigos e cerâmica dos séculos 3 a.C. e 4 a.C. – além de moedas de bronze do reinado de Ptolomeu II (que vai de 283 a.C. a 246 a.C.)
A Atlântida egípcia
Essas cidades, é lógico, não nasceram debaixo d’água – e não há consenso entre os cientistas sobre a maneira como elas foram parar no leito do Nilo. Até a descoberta das ruínas, em 2000, muita gente pensava que Heracleion era lenda. Referências a ela só existiam em textos gregos e egípcios e inscrições encontradas aqui e ali por arqueólogos.
O historiador grego Heródoto (que viveu uns 500 anos antes de Cristo) falou de uma potência marítima situada na foz do o delta do rio Nilo, que abrigava um grande templo, construído exatamente no local onde o famoso herói Hércules (ou Héracles) pôs os pés no Egito. Daí veio o nome Heracleion. O historiador também relata a visita de Helena e Paris à cidade antes da Guerra de Troia.
Canopus também já era conhecida pela literatura. Sua primeira menção está em um poema de Sólon, (sim, o estadista que fez várias reformas em Atenas também era poeta). Em um poema de Nicander, no século 2 , o marinheiro Canopus, timoneiro de Menelau, rei de Esparta, foi mordido por uma víbora nas areias de Thonis e morreu na cidade. Daí teria vindo o seu nome.
Hoje, historiadores acreditam que, antes da fundação de Alexandria em 331 a.C, Heracleion vivia tempos gloriosos – já que possuía o único porto do Egito usado por todos os os navios vindos do mundo grego. Acredita-se também que a cidade tinha uma importância religiosa por causa do templo de Amon. Ela só foi parar nas profundezas do Mediterrâneo muito depois, no século 7.
Uma das hipóteses fala de uma subida gradual do nível do mar e de um súbito colapso do solo instável em que se assentava a cidade, o que causou um afundamento de cerca de 3,65 metros. Ou seja: primeiro, a cidade foi inundada. Depois, a área central, que já estava cedendo sob o peso do templo, sucumbiu. O solo argiloso transformou-se em líquido em um piscar de olhos, e a cidade foi encoberta de vez.