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O homem que inventou a anestesia geral – ou quase isso

No séc. 19, William Morton abriu caminho para as cirurgias indolores com uma suposta invenção revolucionária (mas que já era usada de outra forma na época).

Por Rafael Battaglia
Atualizado em 13 jun 2024, 12h19 - Publicado em 10 jun 2024, 10h00

Até a primeira metade do século 19, não havia muitas opções para amenizar a dor de uma cirurgia. Alguns médicos e dentistas ofereciam ópio e álcool aos seus pacientes. Os mais ousados se arriscavam com óxido nitroso – o “gás do riso”, sintetizado em 1772, que ajudava, mas não era forte o suficiente para sedar alguém completamente.

Em setembro de 1846, o dentista americano William T. G. Morton realizou a primeira extração dentária indolor. O caso repercutiu nos jornais e, em menos de um mês, Morton recebeu o convite de um renomado cirurgião de Boston para ajudá-lo na retirada de um tumor. Ele colocou um pano sobre o nariz do paciente, que respirou fundo – e apagou.

O pano estava embebido em uma substância que Morton batizou de Letheon (uma referência às águas do rio Lete, que segundo a mitologia grega faziam os mortos se esquecerem de suas vidas passadas). Mas o tal Letheon era só éter etílico, usado até então como droga recreativa.

Morton sequer foi o primeiro a usar o éter como anestésico. O pioneiro foi o americano Crawford W. Long, em 1842. Ele percebeu que pessoas que se machucavam enquanto estavam sob o efeito da droga não se lembravam de ter sentido dor, então resolveu testá-la na mesa de cirurgia. Long, porém, só publicou sua descoberta em 1849 – quando as histórias de Morton já haviam cruzado o Atlântico.

Morton queria registrar o Letheon e faturar com sua “criação”. A comunidade científica foi contra – um rebranding do éter etílico não justificava uma patente. Além disso, Morton comprou briga com Long e outros profissionais que reivindicavam créditos pela descoberta, como o seu assistente, Horace Wells, e o professor de química Charles Jackson, com quem aprendeu sobre o éter.

Morton morreu em 1868, falido e com a reputação manchada. Mas sua importância para a anestesia foi reconhecida décadas mais tarde. É que, apesar da tentativa infame de patentear o éter, ele deu uma contribuição real: o primeiro dispositivo para dosar a inalação da droga durante uma cirurgia, feito com frascos de vidro e bocais de madeira, que regulavam a saída do gás e reduziam as chances de uma overdose.

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A ascensão do éter também impulsionou os estudos com clorofórmio, anestésico usado pela Rainha Vitória durante o parto do seu oitavo filho, em 1853. A monarca britânica curtiu o barato e recomendou a substância, que passou a ser usada em larga escala. Terminava, assim, a era das cirurgias dolorosas.

Consultamos os livros: Medicina dos Horrores, de Lindsey Fitzharris, Medicina Macabra, de Thomas Morris, e A Fabulosa História do Hospital, de Jean-Noël Fabiani.

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