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Pão bizantino de 1.300 anos com imagem de Jesus é descoberto na Turquia

Artefato raro remete à parábola bíblica do semeador e oferece pistas sobre a liturgia das comunidades cristãs antigas.

Por Luiza Lopes
Atualizado em 14 out 2025, 09h55 - Publicado em 13 out 2025, 18h00

Arqueólogos na Turquia descobriram um conjunto de cinco pães carbonizados datados de cerca de 1.300 anos. Um deles traz uma representação incomum de Jesus Cristo, retratado como “semeador” ou “agricultor”, e uma inscrição em grego que diz: “Com gratidão ao abençoado Jesus”.

A descoberta foi feita durante escavações na antiga cidade de Eirenópolis (atual Topraktepe), na província de Karaman, região central do país. Os pães datam dos séculos 7 e 8 d.C. e foram preservados de forma excepcional graças à carbonização, um processo em que o alimento é exposto ao calor intenso, perde água e matéria orgânica, e tem sua superfície transformada em uma fina camada de carbono. 

Essa camada impede a entrada de oxigênio e bloqueia a ação de fungos e bactérias, conservando a forma e as inscrições originais. É o mesmo tipo de preservação que ocorre em restos vegetais ou alimentos queimados encontrados em sítios arqueológicos, o que explica por que esses pães mantiveram suas marcas por mais de um milênio.

Segundo comunicado do governo local, a escavação foi conduzida sob a supervisão da Direção do Museu de Karaman, chefiada por Ercan Er, com autorização do Ministério da Cultura e Turismo da Turquia.

Fotografia do pão de comunhão de 1.300 anos com imagem de Cristo.
Fotografia do pão de comunhão de 1.300 anos com imagem de Cristo. (Governo de Karaman via Facebook/Reprodução)
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A figura de “Jesus Semeador” contrasta com a imagem tradicional de Cristo no estilo “Pantocrator”, muito comum em ícones e mosaicos bizantinos. Este último representa Jesus como o “Todo-Poderoso”, com olhar solene e a mão erguida em bênção, frequentemente segurando um livro, símbolo da palavra divina e da autoridade sobre o mundo.

Já o “Jesus Semeador” é uma imagem mais humana e pastoral, associada à parábola do semeador, narrada nos evangelhos de Mateus (13:1-23), Marcos (4:1-20) e Lucas (8:4-15), em que Cristo compara a propagação de sua mensagem ao ato de lançar sementes na terra.

Essa iconografia remete à ligação entre fé, trabalho e fertilidade agrícola, refletindo a dependência das comunidades da época em relação à colheita e à bênção divina sobre o sustento.

Eirenópolis, cujo nome em grego significa “Cidade da Paz”, era uma importante localidade bizantina na região histórica da Isáuria. Sob a jurisdição eclesiástica de Constantinopla, então centro da Igreja Cristã Oriental, a cidade tinha o grego como língua dominante e foi moldada por tradições helenísticas e liturgias ortodoxas. As inscrições e símbolos encontrados reforçam a herança cultural e religiosa grega do local.

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Nos outros quatro pães, os arqueólogos identificaram marcas em forma de cruz, algumas em padrão semelhante à Cruz de Malta – uma cruz de oito pontas formada por quatro braços em “V” invertido, símbolo cristão usado desde a Antiguidade tardia e posteriormente associado à fé e à proteção espiritual. Essas marcas indicam que os pães eram usados em cerimônias religiosas.

Fotografia do pão de comunhão de 1.300 anos com imagem de Cristo.
Marcas de cruz identificadas nos outros pães. (Governo de Karaman via Facebook/Reprodução)

Pesquisadores acreditam que se tratava de pães eucarísticos, preparados para a comunhão nos rituais cristãos primitivos.  A tradição do pão eucarístico permanece até hoje, tanto em igrejas católicas, com hóstias sem fermento, quanto em comunidades ortodoxas, que utilizam pães fermentados marcados com o selo ICXC NIKA (“Jesus Cristo vence”).

Em alguns casos, esses pães também podem ser “antidoron”, alimentos abençoados mas não consagrados, distribuídos aos fiéis após a liturgia – costume que ainda é mantido em celebrações ortodoxas.

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De acordo com especialistas, o achado oferece um raro testemunho material das práticas espirituais e do cotidiano das comunidades cristãs bizantinas rurais. Na tradição ortodoxa, o pão fermentado simbolizava a vida e a ressurreição, funcionando como elo entre o sustento físico e o alimento espiritual.

“O pão era ao mesmo tempo alimento e oferenda, um ponto de encontro entre o material e o divino”, afirma o comunicado. “A inscrição grega expressa gratidão a Cristo, associando o trabalho agrícola à bênção divina.”

Os arqueólogos destacam que a preservação é incomum: artefatos orgânicos como pão dificilmente resistem ao tempo. Casos semelhantes já haviam sido registrados em outros sítios da Turquia.

Em 2024, foi encontrado em Çatalhöyük um pão carbonizado com 8.600 anos, considerado o mais antigo já descoberto. Outro exemplar, de 5.300 anos, apareceu em um assentamento da Idade do Bronze no início de 2025.

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O pão de Eirenópolis, contudo, se distingue pelo contexto religioso e pela iconografia. A imagem de Cristo como semeador reforça a ligação entre fé, agricultura e prosperidade – temas centrais no mundo bizantino e na própria simbologia cristã. 

As escavações em Topraktepe seguem em andamento e prometem lançar luz sobre a vida rural e a liturgia cristã nos séculos iniciais do Império Bizantino. Os pães, agora sob guarda do Museu de Karaman, estão entre os exemplares de pão eucarístico mais bem preservados já encontrados.

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