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Sindicato do crime

A verdadeira história da máfia americana

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h25 - Publicado em 29 fev 2008, 22h00

Texto Maurício Manuel

Obem-cortado terno acrescentava certa frieza ao aspecto ameaçador do homem que comandava a reunião. O ar maligno não emanava das armas que costumava carregar – haviam sido deixadas de lado para aquela ocasião especial. Tampouco do porte atlético. O que assustava vinha do olhar. A pequena cicatriz no lado direito deixava sua vista ligeiramente caída e conferia-lhe um quê sombrio. Mas nem precisava do sinal físico para transpirar autoridade. Afinal, por sua influência, chefões do país inteiro vieram à assembléia. Charles “Lucky” Luciano sabia: estava destinado a comandar o show.

As mais famosas marcas da violência, no entanto, pertenciam a outro rosto do encontro. Apelidado de “Scarface” por causa de 3 talhos que exibia na face, Alphonse Capone podia ser considerado uma estrela em ascensão no submundo. O “dono” de Chicago, que se tornaria o mafioso mais conhecido do planeta – ou, pelo menos o mais retratado por Hollywood –, participou, junto com os 36 mais temidos líderes de facções criminosas, da conferência de Atlantic City. Da reunião, surgiu o embrião da Commission, ou Sindicato do Crime, o famigerado colegiado de gângsteres que mudaria para sempre a máfia nos EUA. A organização se consolidaria, na verdade, só dois anos depois, com o fim da guerra de Castellammarese, travada pela supremacia da máfia em Nova York. Mas o círculo formado naquela convocação seria o primeiro passo para a comissão.

Atlantic City reuniu o time dos sonhos da máfia americana: Meyer Lansky (conselheiro de Lucky Luciano e mentor do encontro), Johnny “The Fox” Torrio (ex-chefe de Al Capone em Chicago), Frank Costello, Joe Adonis, Vince Mangano, Frank Erickson, Albert Anastasia, Dutch Schultz e Louis Buchalter, de Nova York, além de Abner Zwillman, de New Jersey, e mais 24 representantes de famílias mafiosas de todo o país. Ficaram de fora da reunião, propositalmente, apenas os dois grandes chefões da época: Joe “The Boss” Masseria e Salvatore Maranzano, que representavam o velho jeito de comandar as organizações criminosas, repleto de preconceitos étnicos e com brutalidade pouco eficiente. Aquele fim de semana, em maio de 1929, parecia sinalizar tempos difíceis para a sociedade americana, como um mau presságio do que estava por vir. No mesmo ano de criação do Sindicato do Crime, o país assistiria, 5 meses adiante, a quebradeira geral provocada pelo crash da Bolsa de Nova York e o início da Grande Depressão, que duraria uma década.

BEBIDAS PROIBIDAS

A Commission representa uma evolução do crime organizado nos EUA, cuja história remonta às gangues do século 19. Até o início dos anos 1900, bandos étnicos, entre os quais irlandeses, judeus e italianos, controlavam a contravenção.

O começo do século 20 assistiu à ascensão da mais conhecida das gangues do submundo de Nova York, a Five Points. O grupo pode ser considerado o berço da máfia americana. Os jovens Johnny Torrio, Al Capone, Lucky Luciano, Meyer Lansky e Bugsy Siegel iniciaram suas carreiras criminosas sob as asas do bando. As próprias crias, no entanto, acabaram por destronar a organização materna. Mais modernas e estruturadas, as quadrilhas de inspiração mafiosa comandadas pelos ex-Five Points, por fim, tomaram o poder nos anos 20.

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Esse momento pode ser considerado a festa de debutante da máfia nos EUA. O grande presente veio, por ironia, do próprio governo. Em janeiro de 1919, pressionado pela porção conservadora da sociedade, o Congresso aprovou a 18ª Emenda, conhecida como Lei Seca, que proibiu a produção, venda, transporte, importação e exportação de bebidas alcoólicas em todo o país.

Todos os mais notórios gângsteres da época mergulharam no novo negócio. Al Capone logo dominou a cidade de Chicago, após feroz disputa com o descendente de irlandeses George “Bugs” Moran. E Nova York assistiu à consolidação de dois grupos implacáveis que travaram uma das mais sangrentas guerras pelo poder. A facção de Castellammarese, comandada por Salvatore Maranzano, incluía nomes lendários do crime como Joseph “Joe Bananas” Bonanno, Joseph Profaci, Joe Aiello e Stefano Magaddino. E a quadrilha de Joe “The Boss” Masseria tinha em suas fileiras Lucky Luciano, lbert Anastasia, Vito Genovese, Alfred Mineo, Joe Adonis e Frank Costello.

A história dessa guerra tem início em 1925. A hegemonia sobre o crime em Nova York pertencia a Masseria. Mas o crescimento dos negócios escusos nos EUA começou a chamar a atenção dos chefões da secular máfia italiana. Don Vito Cascio Ferro, um dos mais poderosos capi (chefes) da Sicília, resolveu dominar a organização americana. Para tanto, enviou aos EUA seu homem de confiança, Salvatore Maranzano, que se estabeleceu no Brooklyn na metade dos anos 20. Com a força da organização européia por trás de seus movimentos, “Sal” obteve um rápido sucesso e seu clã passou a disputar o controle dos negócios ilícitos com o clã Masseria. Don Vito acabou preso na Itália e morreu no cárcere. Liberado de seus compromissos, Maranzano continuou decidido a submeter as organizações dos EUA, mas sob seu controle.

CÃO COMENDO CÃO

A guerra de Castellammarese entre as famílias de Masseria e Maranzano eclodiu em 1928 e só terminou em 1931. No período, ocorreram dezenas de execuções. O fim do embate começou a se desenhar a partir de uma traição do próprio chefão Masseria. Com medo do crescente poder de um de seus mais destacados colaboradores, o jovem gângster Charles “Lucky” Luciano, Joe “The Boss” enviou um recado ao subordinado. Para assustá-lo, mandou 3 capangas seqüestrarem-no. Luciano foi abandonado inconsciente em uma praia na baía de Nova York. Do episódio, ganhou a cicatriz, a pálpebra caída e o olhar sombrio.

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Naquele tempo, Lucky já contava com a colaboração de seu mais conhecido sócio e conselheiro, Meyer Lansky, o mafioso judeu que se tornaria o cérebro por trás do Sindicato do Crime. Após o seqüestro, os parceiros perceberam rapidamente que estavam na mira do chefão Masseria. Ambos combinaram, então, a jogada que mudaria suas vidas e a história da máfia. Em segredo, reuniram-se com o arquiinimigo Salvatore Maranzano para combinar o fim da guerra: a morte de Joe “The Boss” Masseria.

Àquela altura, a conferência de Atlantic City já havia ocorrido. E o fim do conflito significaria muito mais que o término da matança. A nova geração percebeu a oportunidade de tomar o poder da velha guarda, representada justamente pelos dois chefes em guerra. Bem posicionados no lado vencedor, Luciano e Lansky esperariam o melhor momento para assumir o controle.

A ação ocorreu em 1931. Luciano atraiu Masseria para uma emboscada em um restaurante no Brooklyn. A senha para a execução seria o momento em que Lucky entrasse no banheiro. A morte do rival deu a vitória a Maranzano, que fez do novo aliado seu número dois. Salvatore se proclamou chefe de todos os chefes da máfia americana.

O chefão, no entanto, planejava eliminar Al Capone e tomar conta da crime organizado em Chicago. Também sabia que seus aliados mais influentes, como Lucky Luciano e Vito Genovese, cedo ou tarde, tentariam apunhalá-lo pelas costas. Não esperava, porém, que acontecesse tão rápido. O conselheiro Meyer Lansky, antevendo os movimentos do chefão, tramou seu futuro com os amigos. Enquanto Salvatore ainda contratava um pistoleiro para matar seus subchefes, 4 mercenários dirigiram-se para o escritório do capo O reinado de Maranzano durou 6 meses.

ASSASSINATO S.A.

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Com o fim do velho regime, a Commission transformou-se na autoridade máxima da máfia americana. O colegiado de criminosos era formado pelos chefes das 5 famílias de Nova York: Lucky Luciano, Joseph Bonanno (que substituiu Maranzano), Joe Profaci, Vincent Mangano e Tommy Gagliano. Também faziam parte desse grupo de elite do crime organizado Al Capone, de Chicago, e Stefano Magaddino, de Buffalo. Juntos, esses criminosos passaram a arbitrar disputas e traçar estratégias para os negócios. Meyer Lansky tornou-se o conselheiro financeiro.

Para proteger os interesses do Sindicato, levar a cabo suas decisões e evitar confrontos, a comissão criou um braço armado. Essa “polícia” do crime ficou conhecida como Murder, Inc. (algo como “Assassinato S.A.”). Dirigida por Lansky, a brigada de assassinos matava mafiosos em nome da manutenção do regime. Supõe-se que centenas de execuções tenham ocorrido.

Com o fim da Lei Seca, em 1933, a máfia se viu forçada a diversificar as atividades. O jogo, o lenocínio e as drogas voltaram ao topo da lista dos negócios. Em 1936, o promotor Thomas Dewey conseguiu a condenação de Lucky Luciano por explorar a prostituição. A sentença de 30 anos parecia significar o fim de sua carreira criminosa, mas, mesmo preso, o capo continuou no comando. Durante seu encarceramento, o controle direto do clã passou para Vito Genovese. Um ano mais tarde, porém, o subchefe de Luciano teve de fugir para a Itália para evitar um julgamento por assassinato. Em seu lugar, assumiu o consigliere Frank Costello, 3º na hierarquia.

A entrada dos EUA na 2ª Guerra Mundial, em 1941, representou uma nova chance para Lucky Luciano. Uma inusitada colaboração do gângster com o Exército acabou por lhe restituir a liberdade no fim do conflito, em 1946. No entanto, Luciano teve de deixar o país e voltar para a Itália. Durante a campanha americana na Europa, o criminoso ajudou os militares, acionando seus contatos entre os mafiosos da Sicília, que se tornaram importantes fontes de informação, além de assegurar salvo-conduto para as tropas aliadas.

Enquanto Luciano permanecia preso, seu amigo Meyer Lansky cuidou de expandir uma rede de cassinos pelas costas leste e oeste. O jogo tinha se transformado num dos grandes negócios do Sindicato, que estendeu seus tentáculos até um país vizinho: Cuba. Lucky Luciano mudou-se para a ilha, ainda em 1946, e passou a comandar as operações de lá.

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NOVO EXÍLIO

Durante sua estada em Cuba, Luciano, pressentindo a perda de poder, conclamou os chefes a saudá-lo como capo di tutti capi. Apenas Vito Genovese, que havia retornado da Itália, recusou-se a reconhecê-lo como o poderoso chefão. O antigo subchefe planejava ele mesmo se tornar o líder supremo. Para neutralizar a manobra de Lucky, vazou a informação sobre seu paradeiro. Ao saber da permanência secreta, o governo americano forçou-o a voltar para a Europa. Com Lucky Luciano longe das operações, a roda de poder começou a girar novamente. E novas transformações apareceram no horizonte da máfia.

A conferência mais significativa da máfia americana na década de 1950 ocorreu – ou melhor, quase ocorreu – em Apalachin, um distrito da cidade de Owego, em Nova York. Mais de 60 chefões do submundo compareceram ao encontro em 14 de novembro de 1957, na casa do mafioso Joseph Barbara.

O que deveria ter sido a aclamação do mafioso Vito Genovese como capo di tutti capi acabou virando uma das mais famosas prisões da história do crime organizado. Cercados pela polícia, 58 criminosos acabaram detidos (entre eles o próprio Genovese, Carlo Gambino, Joseph Profaci e Joseph Bonanno). Todos deram a mesma desculpa aos policiais: aquela era apenas uma visita de cortesia ao amigo Barbara, que havia sofrido um enfarto um ano antes e continuava com a saúde delicada. Como crime algum havia sido cometido, as autoridades tiveram de libertar todo mundo.

A história de como a polícia descobriu a conferência tem várias versões. A oficial credita a proeza a agentes locais, que suspeitaram do movimento em Apalachin nos dias anteriores ao encontro – o grande número de reservas em hotéis chamou a atenção, assim como a quantidade de carros com placas de fora circulando pelo vilarejo.

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Mas alguns pesquisadores da história da máfia americana apontam para uma coincidência: a ausência no evento de 3 dos mais importantes integrantes da cúpula do crime. Lucky Luciano, deportado para a Itália, não teria como estar lá. Frank Costello, que havia se retirado do poder após sofrer um atentado, não atendeu o chamado. E Meyer Lansky, amigo pessoal do chefão exilado, também virou as costas para a reunião. Teriam os 3 antigos parceiros conspirado contra a assembléia? Havia muitos motivos para isso. A tentativa de assassinato contra Frank fora orquestrada por Vito Genovese, que se tornou líder da família nova-iorquina depois da renúncia de Costello. Vito também havia manobrado uma década antes para evitar a volta de Lucky ao topo da Commission.

Apesar de malfadada, a conferência de Apalachin representou o fim de mais uma era na história da máfia americana. Após o segundo exílio de Lucky Luciano, em 1947, uma guerra teve início. De um lado, a velha guarda representada por Joseph Bonnano, Joe Profaci, Vicent Mangano e Stephano Magaddino. Do outro, Vito Genovese, Gaetano Lucchese e Carlo Gambino. Quando houve a convocação para Apalachin, o controle da máfia já estava decidido em favor dos liberais. O encontro apenas ratificaria a nova ordem, como havia ocorrido em Atlantic City. Para a geração que sucedeu os fundadores do Sindicato do Crime, em lugar de antigas tradições e princípios, a questão mais importante passava a ser obtenção dos maiores lucros possíveis, sob quaisquer meios.

A NOVA MÁFIA

Com o passar dos anos, os antigos líderes perderam até mesmo as denominações das famílias. O clã de Luciano adotou o nome Genovese; o grupo de Joe Profaci, após manobras de Carlo Gambino, ficou nas mãos de Joe Colombo; Gambino apagou a referência a Vincent Mangano; e a quadrilha de Gaetano Gagliano passou para Tommy Lucchese.

A supremacia de Vito Genovese duraria apenas dois anos. Em 1959, foi preso por tráfico de drogas. Morreu na prisão 10 anos depois. A derrocada do chefão foi tramada pelo trio Luciano, Lansky e Costello em uma última grande cartada. A operação com a heroína que levou Vito às grades teve como mentores os antigos mafiosos. Sob as bênçãos da velha guarda, Carlo Gambino acabou se tornando o chefe de todos os chefes.

Al Capone

O inimigo públiconúmero um da América

Dia de São Valentim, 1929. Aquele 14 de fevereiro ficou marcado por um dos episódios mais sinistros da história da máfia. Assassinos vestidos de policiais dizimaram a tiros de metralhadora 7 integrantes da gangue de George “Bugs” Moran, rival de Alphonse “Scarface” Capone. Bugs sobreviveu. Mas retirou-se dos negócios, abrindo espaço para Al Capone dominar Chicago. O mais famoso mafioso americano de todos os tempos, porém, acabou ganhando com aquele massacre uma notoriedade que seria a sua sina: ele transformou-se no “inimigo público número um da América”. Dali em diante, o cerco a Capone apertou. Graças à implacável perseguição do agente do Tesouro Federal Eliot Ness, o gângster foi julgado por sonegação de impostos e condenado, em 1931, a 11 anos de prisão. Saiu da cadeia em 1939, com a pena reduzida por bom comportamento.Mas já não era sombra do mafioso que havia dominado Chicago. Com a saúde debilitada, passou os últimos anos lutando contra a demência. E morreu em 24 de janeiro de 1947.

Joseph Bonanno

O poderoso chefão que inspirou don Corleone

Apelidos sempre foram uma marca registrada dos mafiosos americanos. Mas Joseph Bonanno, um dos mais poderosos chefões de todos os tempos nos EUA, odiava seu nickname. Ele era conhecido como “Joe Bananas” e achava que aquela alcunha era desrespeitosa. Na sua presença, ninguém o chamava dessa forma. Afinal, quem se atreveria a provocar o capo de uma das 5 famílias mafiosas de Nova York? Joseph Bonanno serviu de inspiração para escritor Mario Puzo criar o personagem don Vito Corleone, figura central do romance O Poderoso Chefão – obra que daria origem à celebrada trilogia cinematográfica. Foi um dos fundadores do Sindicato do Crime. Na ativa desde os primórdios da máfia nos EUA, sobreviveu a todas as guerras travadas entre grupos mafiosos rivais. Só morreu aos 97 anos, no dia 12 de maio de 2002 – feliz por não ter caído em combate, mas ainda incomodado pelo desrespeitoso apelido.

Lei acima da máfia

A história do crime organizado não é feita só de bandidos. Heróis arriscaram a vida para desafiar – e vencer – os chefes do submundo

Impossível falar em máfia sem citar Eliot Ness e seus “Intocáveis”. O incorruptível grupo de agentes federais protagonizou um dos mais famosos duelos da época da Lei Seca. Aos 26 anos, Ness liderou a cruzada que levaria à cadeia um dos gângsteres mais perigosos e politicamente blindados da época. De 1929 a 1931, quando Al Capone foi julgado e condenado, a caçada envolveu lances de cinema, como o atentado com dinamite colocada sob o capô do carro, do qual Eliot escapou por pouco.

Após a condenação de Capone, os Intocáveis o escoltaram até o trem que o levaria para a penitenciária de Atlanta. Al teria dito a Ness: “Meu trabalho tem um custo muito alto, despesas o tempo todo, troca de caminhões e equipamentos. Eles [o governo] têm o dever de legalizá-lo”. E o agente teria retrucado: “Se fosse legítimo, você não iria querer nada com isso”.

Na década de 80, outro herói antimáfia ficou famoso por limpar Nova York: Rudolph Giuliani. Antes de virar prefeito da cidade pela primeira vez, em 1994, ele foi promotor de Justiça e levou a julgamento 11 mafiosos, incluindo os chefes das 5 famílias mafiosas locais. Em janeiro de 1987, saiu o veredito – cada chefão foi condenado à pena de 100 anos de prisão. O sucesso credenciou Giuliani a se tornar prefeito, o que significou dias difíceis para o crime organizado até 2001.

Judeus e irlandeses

Eles foram protagonistas na história da máfia

Sem judeus e irlandeses, a máfia americana não teria se transformado numa organização tão poderosa. O judeu Meyer Lansky, por exemplo, mandou mais que a maioria dos ítalo-americanos de seu tempo. Especialistas no assunto consideram-no o gênio financeiro por trás do Sindicato do Crime. Amigo de Lansky e também judeu, Benjamin “Bugsy” Siegel entrou para a história como o “inventor” de Las Vegas, ao inaugurar o primeiro grande cassino da cidade – o Pink Flamingo, em 1946. Siegel acabou assassinado um ano depois, a mando da Comission, por conta das dívidas que ele contraiu para tocar seu empreendimento – um dinheiro emprestado pela cúpula da máfia, mas que nunca foi pago. Durante a Lei Seca, dois mafiosos de origem irlandesa fizeram história: Dean O’Bannion e George “Bugs” Moran, ambos adversários de Al Capone. O primeiro assassinado em 1924. Moran teve melhor sorte: morreu na cadeia, em1957.

Quem mandou matar o presidente?

Gravação recém-descoberta de uma conversa telefônica entre o assassino de John Kennedy e o empresário mafioso jack ruby sugere que a máfia americana esteja por trás do atentado.

A maioria dos americanos parece acreditar que o mundo todo conspirou para o assassinato do presidente John Kennedy, em 1963. Algumas teorias culpam a CIA. Outras apontam para o cubano Fidel Castro e a KGB (o sombrio serviço secreto soviético). E existem também as que indicam a máfia americana como mandante do crime. Em fevereiro 2008, esta última hipótese tornou-se ainda mais tentadora. No dia 18 daquele mês, Craig Watkins, promotor do condado de Dallas, divulgou documentos guardados a 7 chaves desde o assassinato do presidente. Entre os papéis, uma bomba: a transcrição de uma suposta conversa por telefone entre Lee Harvey Oswald, o atirador que disparou contra Kennedy, e Jack Ruby, empresário ligado à máfia que matou Oswald apenas dois dias depois do atentado.

A conversa teria ocorrido na boate de Ruby na noite de 4 de outubro – ou seja, um mês e meio antes do crime. Na gravação, a dupla negocia o assassinato do presidente com aval da máfia. “De onde o dinheiro vem?”, pergunta Oswald. “Você já ouviu falar a Mão Negra da Morte?”, responde Jack. “Da máfia?”, torna a perguntar o atirador. Jack confirma: “Sim, da máfia”.

Se a peça é um engodo, só uma investigação poderá dizer. Mas o envolvimento da família Kennedy com a máfia é fato. Joseph, pai do presidente assassinado, era ligado a Sam Giancana, chefão que sucedeu Al Capone em Chicago. Giancana teria até interferido na eleição de 1960, assegurando ao candidato John Kennedy uma vitória folgada em Chicago. Depois de eleito, John nada fez para evitar que seu irmão Robert, então promotor, encabeçasse uma grande campanha contra o crime organizado. Furiosa, a máfia teria planejado o assassinato do presidente.

Zoom

Trilha de sangue

Fria e calculista, a máfia americana sempre resolveu suas pendengas na base do assassinato

Texto Maurício Manuel

Conspiração presidencial: a máfia e a morte de kennedy

Lee Harvey Oswald, assassino de John Kennedy, na mesa de autópsia, em 1963. Ele não teve tempo de contar sua história: foi baleado por Jack Ruby, associado da máfia.

FBI aperta o cerco contra os chefes do sindicato do crime

Angelo Bruno, chefão da máfia na Filadélfia, conduzido por agentes federais ao QG do FBI, em dezembro de 1963. O capi sucedeu Salvatore Magaddino no comando da família.

Matadores de aluguel

Harry Straus, Harry Malone e Frank Abbandando (da esq. para a dir.) numa delegacia do Brooklyn, em Nova York. O trio fazia parte da Murder, Inc., o temido esquadrão da morte do Sindicato do Crime.

Las Vegas: uma história de jogatina e violência

O mafioso “Bugsy” Siegel, assassinado em 1947. A ordem para matá-lo partiu da própria cúpula da máfia americana, descontente com os negócios que ele operava em Las Vegas.

Mais um corpo estendido nas ruas de nova york

Corpo de Thomas Bilotti, fuzilado em dezembro de 1985 por integrantes de sua própria família mafiosa – os Gambino.

O “tribunal” da máfia não perdoa ninguém, nem mesmo os poderosos chefões

Carmine Galante, chefe da família Bonanno, crivado de balas em 12 de julho de 1979. A execução, ordenada pela Comission, ocorreu no restaurante Joe and Mary, um dos preferidos da máfia nova-iorquina. Pego de surpresa logo após o jantar, Galante morreu com um charuto na boca.

EUA hoje

As famílias Bonanno, Colombo, gambino, genovese e luchese, todas de nova York, ainda mANDAM no crime organizado. mas estão cada vez mais vulneráveis.

Mais de mil pessoas, entre as quais políticos, empresários e até policiais, compareceram à cerimônia. O funeral do mafioso Carlo Gambino, em outubro de 1976, só perdeu em pompa para o enterro de Charles “Lucky” Luciano, 4 anos antes, que reuniu cerca de 2 mil presentes – foi, na verdade, o segundo sepultamento do chefão exilado, que morreu em Nápoles, na Itália, em 1962, mas teve seus restos trazidos de volta aos EUA 10 anos mais tarde. Apesar do prestígio ostentado, os eventos significaram o ocaso de mais uma era na história da máfia americana. A saída de cena do patriarca da família Gambino coincidiu com o início da inexorável perda da supremacia das famílias mafiosas sobre o crime organizado nos EUA.

Desde a década de 1970, os senhores do crime vêm sofrendo uma implacável perseguição. Dessa época data a Racketeer Influenced and Corrupt Organizations Act (em português, lei Rico), uma arma poderosa nas mãos dos promotores por facilitar o processo e a prisão de mafiosos. Além do reforço legislativo, os agentes federais do FBI ajustaram o foco. Do anticomunismo que predominou nas décadas de 1950 e 1960, as preocupações voltaram-se para o verdadeiro inimigo público número um: o crime organizado.

INFILTRADOS

Quando se deu conta do poder, da influência e da capacidade de corromper das organizações criminosas, o FBI resolveu mirar na bandidagem com tudo o que tinha. O órgão federal formou grupos especiais de investigação e usou até espionagem. Um dos casos mais famosos nos anos 1970 envolveu o agente infiltrado Joseph Pistone. No mesmo ano da morte de Carlo Gambino, o policial conseguiu entrar disfarçado na família Bonanno, sob o pseudônimo de Donnie Brasco. Seis anos de dupla identidade resultaram no indiciamento de 200 mafiosos e na condenação de 100. Em 1987, Pistone ainda testemunharia na condenação do capo Joseph “Big Joey” Massino, do clã Bonanno, tratado pela mídia como o último grande chefão.

PONTE VELHA

O mais recente golpe ocorreu em 7 de fevereiro de 2008. A ação conjunta entre autoridades dos EUA e da Itália, batizada de operação Old Bridge (Ponte Velha)deteve mais de 100 criminosos nos dois países. Na maior ofensiva antimáfia em20 anos, o FBI capturou 77 pessoas em Nova York, entre os quais Frank Cali, considerado atual chefe da família Gambino.

“Hoje, a máfia americana se resume às 5 famílias de Nova York e à organização criminosa de Chicago”, afirma o jornalista Selwyn Raab, autor do livro Five Families: the Rise, Decline, and Resurgence of America’s Most Powerful Mafia Empires (Cinco Famílias: Ascensão, Declínio e Resurgimento do Mais Poderoso Império Mafioso da América, sem tradução para o português). Para ele, o declínio ocorre em função do impacto do trabalho de inteligência, a modernização da legislação anticrime e as delações premiadas.

Apesar da repressão, as estimativas do FBI mostram que a máfia ainda dispõe de um gigantesco poder de fogo. Estima-se que o Sindicato do Crime ainda conte com 3 mil integrantes e movimentaria US$ 90 bilhões por ano nos negócios.

Em dificuldades para manter a supremacia, os ítalo-americanos fazem alianças com a Organizatsiya russa, a Yakuza japonesa e as Tríades chinesas. O ex-diretor do FBI, Louis Freeh, revelou, em depoimento ao Subcomitê de Assuntos Estrangeiros da Justiça Federal, a existência de um pacto de cooperação e divisão de lucros entre a máfia russa com os chefes das cinco famílias de Nova York para operar em território americano.

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