O que foi a Guerrilha do Araguaia?
Durante sete anos, quase cem guerrilheiros tentaram combater a ditadura no improviso
Foi a maior tentativa do Partido Comunista do Brasil de instaurar um movimento comunista rural no País. O PCdoB se inspirou na Grande Marcha na China, em que 100 mil combatentes caminharam por 10 mil quilômetros em apoio a Mao Tsé-tung, em 1934.
O plano era mobilizar os camponeses da região do Araguaia, na divisa dos Estados do Pará, Maranhão e do atual Tocantins, e marchar até Brasília para tomar o poder.
Em 1967, depois de passarem por um treinamento na China, os primeiros membros chegaram ao Araguaia. Cinco anos depois, o Exército iniciou o combate aos guerrilheiros, na maior mobilização de tropas brasileiras desde a 2ª Guerra Mundial.
Guerra aberta
1. Os “paulistas”
O Araguaia foi escolhido por ser isolado e marcado por conflitos de terra. Os militantes chegaram aos poucos, compraram lotes e montaram comércios nas vilas ao redor de Xambioá (GO, atual TO) e Marabá (PA).
Os camponeses desconfiaram dos jovens, chamados de “paulistas” porque vinham, em geral, do Sul e do Sudeste. Mas os forasteiros os conquistaram por serem prestativos.
2. Treinamento militar
Os militantes faziam incursões no mato, onde aprendiam a sobreviver carregando apenas munição e um pacote de sal. Jovens universitários urbanos, eles aprenderam a encontrar o lugar mais seguro para dormir na selva e a caçar porcos-do-mato para comer.
Também aproveitavam para mapear a área e encontrar esconderijos, onde guardariam suas armas e se protegeriam quando necessário.
3. Aulas de política
A região tinha 6.500 km2 (pouco mais de quatro vezes o município de São Paulo) e só 20 mil moradores, que viviam na pobreza. Os jovens instalaram salas de aula, onde alfabetizavam crianças e adultos e transmitiam noções de política (com um viés totalmente socialista).
Os padres da região, muitos deles missionários franceses inconformados com a miséria local, passaram a simpatizar com os guerrilheiros.
4. A reação
No início de 1972, parecia que tudo ia bem. O PCdoB estimava que, com mais dois anos de treinamento, poderia deflagrar uma revolta armada. Acontece que, meses antes, dois jovens fugiram do Araguaia. Uma era Lúcia Martins, que estava doente e grávida.
Ela foi presa em São Paulo e torturada. Acredita-se que Lúcia tenha sido a primeira pessoa a revelar ao Exército o que acontecia no Araguaia.
5. Fiasco na mata
Em abril de 1972, tropas do Exército começaram a chegar a Xambioá e Marabá. A Operação Papagaio contou com 3.200 homens e uso de helicópteros e até napalm (arma incendiária que os EUA estavam usando na Guerra do Vietnã).
Os militares tinham mais recursos, só que não conheciam a região. Prenderam alguns militantes, como o futuro deputado José Genoino, mataram outros, mas sofreram mais baixas que os guerrilheiros. Em outubro, recuaram.
6. O massacre meticuloso
Em abril de 1973, uma segunda operação teve início. Dessa vez, eram menos agentes, mas eles conseguiram se infiltrar na região.Aos poucos, prenderam e torturaram camponeses suspeitos de serem aliados dos guerrilheiros.
A partir de outubro, começaram a entrar na mata, em grupos pequenos, bem informados e bem armados. A ordem era não deixar nenhum guerrilheiro vivo.
7. Fim melancólico
Em outubro de 1974, a última militante encontrada na região, Walkiria Afonso Costa, foi presa e morta. Era o fim de uma ação em que o Exército decapitou guerrilheiros e queimou seus corpos. Muitos foram jogados vivos de cima de helicópteros. Estima-se que morreram 20 militares, 67 guerrilheiros e 31 camponeses.
As Forças Armadas negam até hoje as atrocidades, mas as descobertas de ossadas, os documentos e os depoimentos de ex-militares mostram que a guerrilha foi exterminada de maneira cruel.
Fontes: Documentários Camponeses do Araguaia – A Guerrilha Vista por Dentro, de Vandré Fernandes, e Soldados do Araguaia, de Belisario Franca; site Comissão Nacional da Verdade; livros Os Protagonistas do Araguaia, de Patricia Sposito Mechi, Operação Araguaia, de Tais de Morais e Eumano Silva, e A Lei da Selva, de Hugo Studa.