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O que acontece quando cozinhamos alimentos?

E quando fritamos? Assamos? Grelhamos? Entenda aqui.

Por Maria Emilia Kubrusly
Atualizado em 1 dez 2016, 19h26 - Publicado em 31 Maio 2003, 22h00

1. Cozidos

A maior parte dos alimentos não pode ser consumida in natura: precisam ser submetidos a um processamento para se tornarem digestivos. E a água é um meio óbvio para levar esse processo a cabo – é potável, inodora, insípida e, salvo em regiões áridas, abundante e de fácil obtenção. Cozinhar em água (ou vapor, que é água em estado gasoso) tem uma limitação: a temperatura, que, a não ser em condições extraordinárias de pressão, não ultrapassa os 100ºC. Isso não permite a ocorrência de alguns fenômenos, característicos de assados e frituras, que precisam de muito mais calor para dar as caras. Trocando em miúdos, um alimento cozido nunca será crocante como uma batatinha chips. Mas a água é o meio ideal e indispensável para a preparação de certos alimentos: feijoada frita e macarrão grelhado, por exemplo, são coisas impensáveis.

Água ou vapor?

Alguns alimentos ficam perfeitos quando cozidos em água: são aqueles que “participam” do líquido, como o feijão e seu caldo, ou os que se beneficiam de um cozimento lento, em que se apuram aromas e sabores, como a carne ensopada. “Mas verduras e legumes ricos em minerais e vitaminas hidrossolúveis – como a C ou o complexo B – perdem seus nutrientes para o meio aquoso”, diz a nutricionista Pérola Ribeiro, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Para esses, o ideal é o cozimento no vapor – que preserva mais características originais desses alimentos, porém é mais demorado devido às propriedades físicas do vapor. No líquido, as moléculas ficam mais próximas entre si do que no vapor, o que melhora a transferência de calor para o alimento. Isso ocorre devido à convecção: a água circula, pois a parte mais quente, do fundo da panela, sobe, enquanto a mais fria, de cima desce – movimento que aumenta a transmissão de calor.

Na pressão

Se você mora no litoral, a água vai ferver a 100ºC – e esse é o ponto em que ela vai transmitir o máximo de calor ao alimento que está cozinhando. Não adianta aumentar a chama do fogão, pois a temperatura na panela não vai se alterar. A variação de pressão atmosférica, porém, modifica o ponto de ebulição. Quanto mais alto, mais baixa a pressão atmosférica. E mais baixo o ponto de fervura: em São Paulo, a água ferve a 97ºC. Essa diferença ocorre porque, para que suas moléculas se libertem na forma de vapor, elas precisam ter energia suficiente para vencer a maior ou menor pressão exercida pelo ar. A panela de pressão é fechada de maneira que, quando a água se aquece, o vapor se expande, mas não consegue escapar. Assim, a pressão aumenta em seu interior. As moléculas precisam, então, de mais energia para vencer essa barreira mais “pesada”. Isso eleva o ponto de ebulição da água para 120ºC, acelerando o cozimento.

Micro-ondas

A maioria dos cozinheiros despreza o forno de micro-ondas, considera-o somente um instrumento para aquecer comida pronta. Essa é uma das razões prováveis para o pouco conhecimento que se tem a respeito dessa técnica de cozimento relativamente recente. Micro-ondas são ondas eletromagnéticas que se propagam no vácuo a uma velocidade aproximada de 300 000 km/s. Elas atuam especificamente nas moléculas polares – com cargas positivas em uma extremidade e negativas na outra. Assim, são as moléculas de água o principal alvo das ondas. Segundo o físico Cláudio Furukawa, do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), “quando as micro-ondas atingem a molécula de água, um campo elétrico a faz ‘girar’ e oscilar, numa agitação que resulta no aumento de temperatura.”

Tal fenômeno proporciona um cozimento muito mais rápido do que, por exemplo, o ocorrido em um forno a gás. Isso porque o forno convencional precisa, primeiro, aquecer todo o ar em seu interior, para que esse transmita o calor ao alimento. Já as micro-ondas trabalham sem intermediários: fazem vibrar moléculas do alimento diretamente, gerando calor. Mas as micro-ondas não penetram mais que 2 centímetros na comida. Por isso, às vezes é preciso parar o forno e mexer o alimento para continuar a aquecê-lo.

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Metais de facas e baixelas são proibidos em fornos de micro-ondas. Eles possuem muitos elétrons livres, que são bons condutores de eletricidade. O campo elétrico da onda eletromagnética das micro-ondas tende a provocar uma movimentação desses elétrons livres, ocasionando uma corrente elétrica no metal. Aí surgem faíscas e pequenas explosões.

2. Assados

Um ambiente fechado e quentíssimo é o ideal para o cozimento de grandes peças de carne, massas e pães. O calor é intenso: o ar do interior do forno se aquece e conduz o processo de convecção – o ar quente perto das chamas sobe, enquanto o ar mais frio ocupa o seu lugar, criando uma circulação de calor e aquecimento uniforme. Como o ambiente é fechado, quase não há perda de matéria: os alimentos encolhem pouco. Ao assar uma carne, por exemplo, o calor lhe é transmitido pela irradiação das chamas, pela circulação do ar inerente à convecção e por condução – quando as partes externas aquecidas transmitem calor ao centro da peça. Todo esse calor pode ressecar o alimento. Algumas receitas de carnes assadas proíbem que se abra o forno durante o cozimento, para evitar a perda de vapor – e, conseqüentemente, umidade e sucos do próprio assado. Já outras recomendam o contrário: regar o assado várias vezes com líquidos, o que implica abrir a porta do forno outras tantas vezes.

3. Grelhados

Se você fica com água na boca só de pensar no gostinho típico do churrasco, saiba que o segredo deste sabor único não vem da fumaça ou do tipo de carvão usado – ao contrário do que acreditam muitos churrasqueiros de final de semana. O responsável é o douramento intenso que a alta temperatura provoca na superfície do alimento. E, para completar – aí sim –, a gordura que pinga na superfície quente é vaporizada e se condensa no alimento, completando a operação. Mas é fácil constatar na prática que gordura demais cria labaredas que podem esturricar a carne ou prejudicar seu sabor. A diferença entre assar no forno e grelhar está na perda de material de vapor e umidade nos grelhados: a umidade do alimento se vaporiza e vai embora – permitindo a formação da casquinha crocante e tostada –, o tecido se contrai e reduz. E mais: grelhar sobre brasas possibilita uma uniformidade na temperatura de cozimento, enquanto numa chapa obtém-se uma temperatura muito mais alta nos pontos de contato da mesma com o alimento.

4. Frituras

O método mais rápido de preparar um alimento é a fritura por imersão, na qual o alimento é mergulhado em óleo a uma temperatura em torno dos 160ºC. Embora um forno convencional possa ficar ainda mais quente (acima de 200ºC), o aquecimento nas frituras é mais rápido e intenso, uma vez que as moléculas do óleo estão mais próximas umas das outras do que aquelas do ar do forno. Quando a batata mergulha no óleo fervente, sua água começa a evaporar. Por isso se vê aquele mar de bolhinhas. É um processo de secagem que permite a formação da casquinha crocante. E essa crosta dificulta a saída de vapor: a água em estado gasoso gera pressão dentro do alimento e acaba por cozinhá-lo. Por isso, uma batatinha bem frita é crocante por fora e macia por dentro. Na fritura em pouco óleo, combina-se fritura com cozimento: a alta temperatura da frigideira se irradia para dentro do alimento, cozinhando-o.

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É o que ocorre no salteado. Para quem não é mestre na cozinha, a “tradução” de Paula Lazzarini, chef-proprietária do restaurante Spadaccino, em São Paulo: “Saltear vem do francês sauter, ou saltar, pois se cozinha agitando a caçarola, sem mexer nos alimentos para não machucá-los. É um método usado para coisas delicadas, como legumes”.

A reação do sabor

O segredo do tom corado e do cheirinho irresistível de carne assada, da da casquinha dourada do pão francês ou do leitão pururuca está na feliz combinação de açúcares e amidos com proteínas e aminoácidos, que reagem entre si na presença de muito calor. Estamos falando da reação de Maillard, nome que homenageia o cientista que a descobriu, o francês Louis Camille Maillard (1878-1936). “É um processo químico que provoca a formação de compostos com impacto no sabor, no aroma e na aparência dos alimentos”, afirma Luiz Antonio Gioielli, professor de Tecnologia dos Alimentos na faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP. A reação ocorre entre grupos amino (formado por moléculas de hidrogênio e nitrogênio) de proteínas e grupos carbonila (que contêm carbono, hidrogênio e oxigênio) de açúcares como glicose, frutose, maltose e lactose. Formam-se compostos escuros – geralmente de cor marrom –, compostos voláteis aromáticos e compostos amargos.

A reação ocorre quando o alimento é aquecido em altas temperaturas, no forno e no fogão. “A temperatura é um dos fatores que alteram a rapidez dessa reação”, diz a engenheira de alimentos Ana Lúcia Gabas, da Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos da USP. A 100ºC, ponto de fervura da água, ela ainda não ocorre em intensidade suficiente para alterar o sabor dos alimentos. Já as altas temperaturas do forno ou da fritura douram massas, queijos e carnes (sim, elas têm açúcares em sua composição), mas pode-se dar uma mãozinha a Maillard: é por isso que se pincela melado no peru de Natal.

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