Bactérias com capacidade redobrada de captar açúcar são risco para diabéticos
Uma linhagem da S. aureus evoluiu uma infraestrutura de absorção de glicose mais sofisticada – o que lhe permite se multiplicar mais rápido em ferimentos de pessoas com hiperglicemia.
Conte 60 segundos. Pronto: em algum lugar do mundo, duas pessoas com diabetes acabaram de ter um pé amputado.
A doença dificulta a cicatrização de ferimentos, e as feridas expostas são um parque de diversões para bactérias. Os tecidos da área infectada morrem – e se a necrose ameaça avançar perna acima, é preciso remover a extremidade para salvar a vida do paciente.
Uma equipe de pesquisadores da Universidade de Pittsburgh, nos EUA, descobriu que uma linhagem da bactéria Staphylococcus aureus resistente a antibióticos evoluiu mecanismos para absorver e queimar açúcar mais rápido do que bactérias normais. O artigo científico foi publicado nesta sexta (13) no periódico especializado Science Advances.
Esse superpoder açúcarado torna os micróbios especialmente eficazes em se proliferar no sangue de pessoas com diabetes – o que explica porque as úlceras nos pés saem de controle com tanta frequência. Para piorar, a hiperglicemia impede o sistema imunológico de combater a infecção.
É um bomba dupla para a saúde pública: enquanto as linhagens de bactérias resistentes antibióticos se fortalecem – devido, em grande parte, ao uso exagerado e errado dessas drogas –, o número de pessoas diabetes não para de aumentar. 16,8 milhões de pessoas convivem com a doença só no Brasil – cerca de 8% da população do País. Nos EUA, são 11%.
Além de lidar com is sintomas comuns da hiperglicemia – fortes dores de cabeça, perda de líquidos, visão embaçada, etc. – pessoas com diabetes precisam tomar cuidado ao cortar alimentos, fazer as unhas ou se arriscar em qualquer outra atividade que possa render um corte, mesmo que pequeno.
A equipe de Pittsburgh explica que o aumento nas infecções por S. aureus nas últimas três décadas está diretamente relacionado ao aumento dos casos de diabetes.
A maioria das bactérias do gênero Staphylococcus possui apenas dois transportadores de glicose – uma estrutura microscópica na membrana da célula que permite a absorção da glicose. A S. aureus evoluiu dois transportadores extras, o que lhe dá vantagem sobre as concorrentes na tarefa de usar o excesso de açúcar no sangue dos diabéticos para se proliferar.
No estudo atual, os pesquisadores fizeram testes em ratos de laboratório diabéticos e não diabéticos, comparando a gravidade das infecções causadas por Staphylococcus que possuíam dois ou quatro transportadores.
No primeiro teste, que envolvia camundongos diabéticos e bactérias barra-pesada, a S. aureus se proliferou com violência. O sistema imunológico destes ratinhos respondeu devagar – como era de se esperar –, o que resultou em úlceras graves. A infecção só foi contida quando as cobaias receberam uma droga que reduzia os niveis de açúcar no sangue.
No segundo teste, os roedores foram infectados com a versão mais light da bactéria. A infecção, como era de se esperar, não foi tão grave. Mas as células de defesa continuaram lentas no combate.
Por fim, houve um teste com ratos saudáveis e a superbactéria. Neste, o sistema imunológico dos animais foi capaz de conter e combater a infecção.
Segundo os pesquisadores, eses resultados promissores permitem imaginar tratamentos que envolvam disfarçar uma substância tóxica de glicose. Assim, a bactéria fominha se dá mal. Por enquanto, porém, o melhor jeito de combater as superbactérias é manter o diabetes sob controle – tornando seu sangue o menos apetitoso o possível.