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Frutas do Brasil: o sabor brasileiro

O exotismo e a diversidade das frutas do Brasil, um país que aprendeu a se identificar com ilustres estrangeiras como a banana e o coco-da-baia e conhece pouco suas delícias escondidas nas matas e nos campos.

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Atualizado em 31 out 2016, 19h01 - Publicado em 31 dez 1992, 22h00

Carla Aranha e Paulo D’Amaro

Durante muito tempo, a polpa branca e doce do bacuri foi um sabor proibido para os índios caxinauás, da Amazônia. Na aldeia, um ser maligno, na forma de cabeça sem corpo, impedia que os nativos provassem o fruto. Um dia, no entanto, os índios se rebelaram contra a ordem. “Se ele gosta tanto assim, a fruta deve ser muito boa”, pensaram. Resolveram então quebrar o tabu e se banquetear com o quitute, enquanto a figura do mal, aborrecida, subia ao céu para nunca mais voltar: lá, se transformou na Lua. A ousadia dos caxinauás valeu a pena: ganharam a luz do luar para atenuar a escuridão noturna e descobriram o prazer do sabor de mais um fruto. Um prazer que ficou escondido de boa parte dos brasileiros nos últimos 500 anos.Como o bacuri, dezenas de frutas se escondem nos meandros de nossas matas e florestas. Algumas se tornaram conhecidas e ganharam o mundo, como a goiaba, o guaraná, o maracujá, o abacaxi, o cacau ou o caju. Outras, nem tanto. Buriti, caraguatá, ingá, pequi são apenas alguns dos nomes de docuras genuinamente brasileiras. que alimentavam lendas e estômagos indígenas desde antes da chegada dos portugueses e permaneceram escondidas pelo manto do regionalismo. Hoje, boa parte delas já está catalogada pelo instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e convive lado a lado com frutas estrangeiras que, trazidas em sua maioria pelos invasores lusitanos, acabaram se tornando símbolos nacionais. O coco-da-baía, por exemplo, só chegou ao Brasil porque algum navegante decidiu tirá-lo de seu ambiente natural, nas ilhas do Oceano Índico. O mesmo ocorreu com a laranja, o limão e todas as cítricas, que trazem no passaporte o visto de naturalidade asiática, ou a graviola, a acerola e o abacate, originárias da América Central. E as surpresas não param aí: os fãs de Carmen Miranda podem ficar abismados, mas a banana, que enfeitava seus espalhafatosos chapéus e virou marca registrada da tropicalidade e de muitos regimes políticos, não nasceu no Brasil. Os especialistas acreditam que sua origem seja a Ásia, embora ninguém possa garantir com precisão. O certo é que ela não estava na paisagem quando Cabral aportou por aqui.

Ofuscadas pelo sucesso comercial das frutas trazidas de outros continentes, as brasileiras mantiveram-se sempre em segundo plano. Só não desapareceram por causa de sua íntima ligação com aquilo que, até algum tempo atrás, era uma espécie de terra de ninguém: florestas tropicais, cerrados e até a caatinga. “É o chamado endemismo. As frutas que se perpetuaram espontaneamente em um determinado ecossistema”, explica a pesquisadora Elizabete Lopes,. do Instituto de Botânica de São Paulo, que há sete anos se dedica a pesquisar nossas frutas. Apesar de não serem cultivadas, elas insistem em se reproduzir no Norte, o paraíso das delícias exóticas: a Amazônia é dona do maior índice de endemismo do pais e 68% de sua flora só é encontrada ali.

O curioso desse abandono às frutas nativas é que elas não devem nada em sabor para estrangeiras como a banana a maçã ou a laranja. Ainda na fase de colonização, os bandeirantes paulistas já sabiam disso. Paravam a tropa assim que topavam com um bacuparizeiro, fácil de achar nas margens do Rio Tietê. Em 1600, o jesuíta e cronista português Simão de Vasconcelos esnobou a corte da metrópole ao escrever: “O bacupari não perde para nenhuma fruta que exista em Lisboa”. Mais recentemente, já no século XX, o escritor Guimarães Rosa — genial em observar a verdadeira linguagem popular brasileira — soube também descobrir uma delícia nacional a cabacinha-do-campo, de aparência muito semelhante à da pêra. Nos relatos de suas andanças pelas veredas do sertão, ele se refere não só ao gosto, mas insinua outras vantagens da frutinha: “Tomei o refresco de pêra-do-campo (…) e Nhorinha recebeu meu carinho no cetim do pêlo”.

Se a cabacinha-do-campo tem realmente algum poder afrodisíaco, não se sabe. Algumas de nossas frutas são pouco conhecidas pelos botânicos. Entre brasileiras e estrangeiras, existem cerca de 200 identificadas pelo IBGE. “Mas é provável que esse número seja bem maior, pois nunca foi feito um levantamento abrangente das frutas silvestres”. adverte a pesquisadora Sílvia Corrêa Chiea, do Instituto de Botânica de São Paulo. Das catalogadas, algumas ainda não foram analisadas em laboratório para se descobrirem seus nutrientes. Quando isso é feito, boas surpresas saem dos tubos de ensaio. O pequi, semelhante a uma pequena laranja e muito comum no interior de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso do Sul, é o campeão em vitamina A entre todas as frutas do mundo.

Embora a maior parte desse tesouro que impressiona os cientistas e encanta o paladar esteja preservada nos campos e matas naturais, seu futuro não está assegurado. A expansão da fronteira agrícola na Amazônia e no Centro Oeste, assim como a destruição da Mata Atlântica no Sudeste, são uma ameaça constante para a existência de muitas espécies. Algumas já sucumbiram à presença humana, como a jabuticaba-branca. em outros tempos abundante na Mata Atlântica, principalmente junto ao litoral fluminense. Ela seguiu o mesmo destino de seu habitat: a devastação reduziu a mata a menos de 5% de sua área original e hoje pode-se contar nos dedos da mão o número de pés dessa fruta, antes tão comum na região.Esse tipo de troca da biodiversidade pelas monoculturas foi denunciado recentemente pela Organização para Alimentação e Agricultura (FAO). Segundo a entidade internacional, cerca de 40 000 espécies vegetais podem ser extintas no mundo nos próximos cinqüenta anos, devido à especialização do plantio. Só se planta aquilo que vende. Certamente foi isso que fez do maracujá, do caju e de outras brasileiras exceções no quadro do nosso exotismo: são todas daqui. mas, como caíram nas graças dos gulosos, tornaram-se vedetes.

Além de prejudicar a cadeia alimentar, o desaparecimento de frutas tão diferentes significa um desperdício. “Estaremos perdendo um grande potencial de alimentação” diz Dalmo Catauli, pesquisador da Empresa Brasileira de Agropecuária (Embrapa). Mais do que isso, também se perde uma chance de bons negócios. Ao contrário das laranjas brasileiras, que para competir no mercado internacional dependem sempre das geada e nevascas nos pomares americanos, frutas nativas como guaraná, babaçu, maracujá e pequi não têm concorrente em nenhum país. A primeira pessoa a perceber isso foi Maurício de Nassau, o holandês que governou Pernambuco durante sete anos no século XVII. Ao ver que o caju alimentava os índios, evitava que seus marinheiros contraíssem o escorbuto — doença causada pela carência de vitamina C — e, principalmente, alcançava bons preços na Europa, onde se transformava em saborosos doces, ele não teve dúvidas: baixou uma lei que multava em 100 florins quem abatesse um cajueiro.

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Para saber mais:

O Brasil vai à mesa

(SUPER número 7, ano 5)

BACURI

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Família: GUITIFERAE (mesma do bacupari)

Nome científico: Platonia insignis Mart

Origem: Pará, mas é encontrada no Maranhão, Goiás e Mato Grosso

Arvore: com até 35 m de altura e copa em forma de cone invertido

Fruto: com 250 g, é redondo. de polpa branca, doce e suco viscoso

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Frutificação: dezembro a maio

Principais nutrientes: fósforo,. ferro e vitamina C

CARAGUATÁ

Família: BROMELIACEAE (mesma do abacaxi)

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Nome científico: Bromélia antiacantha Bertol

Origem: Brasil, principalmente no Espírito Santo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul

Árvore: herbácea, alcança 2 m de altura

Fruto: ovalado, pequeno, com polpa amarela e ácida

Frutificação janeiro a julho

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JABUTICABA-BRANCA

Família: MYRTACEAE (mesma da goiaba)

Nome científico: Myrciaria aureana Mattos

Origem: Brasil, principalmente Mata Atlântica

Arvore: com até 3 m, tronco de casca amarelada e ramos cilíndricos

Fruto: com 2 cm de diâmetro, tem cor-verde-clara e de 1 a 4 sementes

Frutificação: janeiro

Principais nutrientes: cálcio e ferro (dados referentes à jabuticaba comum)

GOIABA

Família: MYRTACEAE (mesma da jabuticaba)

Nome científico: Psidium guajava L.

Origem: América tropical

Árvore: alcança até 10 m de altura, com caule tortuoso

Fruto: casca fina e papa macia, branca ou vermelha

Frutificação: abril a junho e novembro a fevereiro

Principais nutrientes: cálcio, fósforo e vitamina C

GUARANÁ

Família: SAPINDACEAE (mesma da pitomba)

Nome científico: Paulinia cupana H.B.K.

Origem: Região amazônica

Árvore: arbusto ou cipó lenhoso, de até 4 m de altura

Fruto: com até 2,5 cm de diâmetro, aproveita-se a semente torrada

Frutificação janeiro a fevereiro

CAJU

Família: ANACARDIACEAE (mesma da manga)

Nome científico: Anacardium occidentale L

Origem: América tropical

Árvore: com até 20 m de altura, galhos longos e tortuosos

Fruto: o fruto propriamente dito é a castanha, enquanto a parte macia e suculenta é, na verdade, o pedúnculo

Frutificação: julho a dezembro

Principais nutrientes: caju — cálcio, fósforo e vitamina C; castanha-de-cajú — fósforo, cálcio e ferro

MANDACARU

Família: CACTACEAE (mesma do cacto)

Nome cientifico: Cereus jamacaru DC

Origem: Nordeste do Brasil Árvore: cacto agigantado, com até 10 m de altura e espinhos amarelos

Fruto: com cerca de 8 cm, casca grossa e vermelha, a polpa é branca e suculenta, com muitas sementes pequenas

Frutificação: abril a maio

PINHÃO

Família: ARAUCARIACEAE (tem parentes no Chile e na Austrália)

Nome científico: Araucaria angustifolia (Bert.) O. Kuntze

Origem: Região Sul do BrasilÁrvore: com até 50 m de altura, ramificada só no alto do tronco

Fruto: pinhas que se desfazem, liberando suas sementes, os pinhões

Frutificação: abril a junhoPrincipais nutrientes: proteínas, cálcio e ferro

SAPUCAIA

Família: LECYTHIDACEAE (mesma da castanha-do-pará)

Nome científico: Lecythis pisonis Camb.Origem: natural da Amazônia, pode ser encontrada até o Rio de Janeiro

Árvore: de até 40 m de altura

Fruto: esférico, de 25 cm de diâmetro e até 9 kg de peso, suas paredes grossas têm cerca de 2 cm de espessura. As amêndoas são a parte comestível

Frutificação: agosto a outubro ILUSTRES ESTRANGEIRAS

Elas enchem as bancas de feira mas, ao contrário do que se pense, não estavam na paisagem quando Cabral chegou

NOME ORIGEM

Abacate MéxicoAcerola América CentralBanana Provavelmente ÁsiaCajá ÁfricaCarambola ÁsiaCoco-da-baía Oceano ÍndicoFruta-pão Java e SumatraGraviola América CentralJaca ÍndiaJambo ÍndiaLaranja ÁsiaLimão ÁsiaManga ÁsiaTamarindo ÁfricaTangerina Ásia

PEQUI

Família: CARYOCARACEAE (mesma do pequiá)

Nome científico: Caryocar brasiliense Camb

Origem: Cerrado brasileiro, embora também freqüente em São Paulo, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul

Árvore: alcança até 10 m de altura

Fruto: arredondado, casca esverdeada, polpa pastosa e amarela, com sementes espinhosas e comestíveis

Frutificação: janeiro a abril

Principais nutrientes: é a fruta mais rica em vitamina A até hoje analisada

INGÁ

Família: LEGUMINOSAE (mesmo do feijão)

Nome científico: Inga cinnamomea Spruce ex Benth.

Origem: Região Amazônica, junto aos rios Árvore: de até 30 m de altura Fruto: vagem com até 30 cm de comprimento e polpa adocicada

Frutificação: março a abril

Principais nutrientes: cálcio e ferro

CABACINHA-DO-CAMPO

Família: MYRTACEAE (mesma da goiaba)

Nome científico: Eugenia klotzschiana Berg.

Origem: Brasil, principalmente no sertão de Minas Gerais

Árvore: na verdade, dá em pequenos arbustos, com até 1,5 m

Fruto: formato tipo baga, de polpa ácida e com poucas sementes

Frutificação: janeiro e fevereiro

PITOMBA

Família: SAPINDACEAE (mesma do guaraná)

Nome científico: Talísia esculenta Radlk.

Origem: Brasil, principalmente Pemambuco

Árvore: de até 15 m de altura

Fruto: com 3 cm de diâmetro, a casca é consistente e a polpa carnosa, branca, de sabor agridoce

Frutificação: janeiro e fevereiro Principais nutrientes: cálcio e vitaminas A e C

BURITI

Família: PALMAE (mesma do coco-da-baía)

Nome científico: Mouritia flexuosa L.

Origem: Região amazônica

Árvore: palmeira de até 25 m de altura

Fruto: ovalado, brilhante, com polpa esponjosa

Frutificação: janeiro a julhoPrincipais nutrientes: proteínas, cálcio, fósforo e ferro

BACUPARI

Família: GUTTIFERAE (mesma do abricó)

Nome científico: Rheedia gardneriana PI. & Tr.

Origem: Sudeste do Brasil, principalmente na beira de rios

Árvore: com até 6 m de altura e copa piramidal

Fruto: alaranjado, de polpa banca e adocicada

Frutificação: janeiro a março

BABAÇU

Família: PALMAE (mesma do coco-da-baía)

Nome científico: Orbignya speciosa Barb. Rodr.

Origem: Brasil, ocorrendo no Amazonas, Pará, Piauí, Maranhão, Ceará, Goiás, Mato Grosso e Minas Gerais.

Árvore: palmeira de até 20 m de altura

Fruto: ovalado, casca amarela e verde, polpa oleosa

Frutificação: setembro a dezembro

Principais nutrientes: proteínas, fósforo, cálcio e vitamina B1 e B2

JUÁ

Família: RHAMNACEAE (única fruta identificada da família)

Nome científico: Zizyphus joazeiro Mart.

Origem: regiões áridas do Brasil, do Piauí ao norte de Minas Gerais

Árvore: com até 15 m de altura e copa ampla

Fruto: esférico, com a casca fina, carnoso e adocicado

Frutificação: janeiro e maioPrincipais nutrientes: sais minerais, vitamina C

MARACUJÁ

Família: PASSIFLORACEAE (família só de passifloras)

Nome científico: Passiflora edulis Sims.

Origem: provavelmente Brasil

Árvore: trepadeira

Fruto: esférico, com até 9 cm de diâmetro, a casca dura e a polpa aquosa

Frutificação: durante todo o ano, mas escasso de maio a agosto

Principais nutrientes: cálcio, ferro e vitamina C

CRUÁ

Família: CUCURBITACEAE (mesma da melancia)

Nome científico: Sicana odorífera L.

Origem: América do Sul tropical

Árvore: trepadeira, semelhante ao maracujá

Fruto: formato alongado, de até 60 cm de comprimento, com polpa carnosa e amarelada

Frutificação: o ano todo

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