Música e barulho: A bela e a fera
Qual a diferença entre música e barulho? A resposta está na cabeça de cada um.
Lívia Lisbôa
O som que encanta
O filósofo grego Aristóteles já admitia, no século V antes de Cristo, a dificuldade de se determinar o que é a música. O escritor inglês Samuel Johnson (1709-1784) a definiu como o menos desagradável dos barulhos. No início do século XX, predominava a idéia de que a diferença entre a música e os demais ruídos reside na regularidade das vibrações sonoras tonalidades e ritmos arrumados de uma maneira uniforme. Essa definição ainda vale para a música convencional, mas é insuficiente diante das obras de vanguarda, que rompem com os padrões tradicionais de ritmo e incorporam o próprio barulho como um ingrediente na composição. E o que dizer de um CD do Sepultura? A imensa variedade cultural do planeta é outro complicador. O que é um som celestial para um esquimó pode ser insuportável para você e vice-versa. Parece piada, mas a maioria dos musicólogos, hoje em dia, reduz essa definição a algo absolutamente simples: música é tudo aquilo que você disser que é música.
O som que perturba
Uma antiga adivinhação perguntava: O que é, o que é, vem de carroça, vai de carroça, não serve de nada para a carroça e a carroça não pode andar sem ele? Resposta: barulho. Do ponto de vista científico, o barulho é apenas um som indesejável. O volume nem precisa ser muito alto. Uma torneira pingando no meio da noite pode ser um verdadeiro suplício. Mais de uma vez, o cantor João Gilberto já interrompeu seu show porque o tilintar de copos na platéia, ou o zumbido do ar condicionado, quebrou a sua concentração. Nas grandes cidades, a poluição sonora deixou de ser apenas um incômodo para se tornar um problema de saúde pública. Ela provoca estresse e, em casos mais graves, diminuição da audição. O ouvido não foi criado para enfrentar os barulhos da civilização moderna, afirma o otorrino Ricardo Bento, professor da Universidade de São Paulo. Nos ambientes ruidosos, as células morrem mais cedo do que deveriam.
A ciência da melodia
As freqüências sonoras definem as notas.
Aqui, ao lado, estão os tons da oitava média de um piano, com as suas freqüências em hertz, a unidade que mede o número de vezes que uma onda sonora se repete no intervalo de um segundo. Uma oitava é o intervalo entre dois tons, um dos quais é exatamente o dobro da freqüência do outro, como entre o Dó que está lá embaixo, na ilustração, e o Dó acima dele. O intervalo é dividido em notas brancas, que são as notas da escala do Dó maior, e notas pretas, que são os tons intermediários, chamados sustenidos e bemóis. O sustenido (#) está meio grau acima de uma nota branca e o bemol (b), meio grau abaixo.
Uma questão de decibéis
Os sons envolvem você o tempo todo. O silêncio absoluto só existe em câmaras especiais, nos laboratórios de acústica. O volume do som é medido em decibéis (dB), uma escala logarítmica, não linear. A diferença entre 50dB (o ruído em um restaurante tranqüilo) e 100 dB (uma britadeira) é muito maior do que o dobro. O ouvido humano só começa a detectar algum ruído a partir de 10 decibéis, a respiração normal. Sons acima de 120 dB (a decolagem de um jato) podem causar surdez permanente. Os médicos do trabalho recomendam o uso de protetores de ouvidos para os operários que ficam expostos a ruídos de mais de 80 dB (um aspirador de pó). Também o som nas discotecas não respeita o limite do suportável. Por isso, a deterioração da audição é bastante comum entre os jovens.
Quem sabe é super
Foi o monge italiano Guido D·Arezzo, na Idade Média, que criou a escala musical com as sete notas, de Dó a Si, num hino de louvor a São João. O “Si” é uma abreviação de Sancti Ioannes, o nome do santo, em latim.