Porque o Uruguai jogou bem e o Brasil teve uma tarde infeliz. O resto é conversa fiada. Assim como aconteceu quando o Brasil perdeu a Copa de 1998, várias histórias foram criadas para tentar explicar a derrota brasileira naquela decisão – até a lenda de que uma caveira de burro foi enterrada sob a meta onde Barbosa sofreu o fatídico gol. Jogando pelo empate (na verdade, não era uma final propriamente dita e, sim, a última rodada de um quadrangular decisivo que ainda incluía Suécia e Espanha), vindo de duas vitórias acachapantes de 7 x 1 sobre a Suécia e 6 x 1 sobre a Espanha, exibindo-se diante de 200 mil fanáticos torcedores a cada partida, o Brasil parecia imbatível. Pouca gente se lembrava de que, poucos meses antes, as duas seleções haviam se enfrentado num amistoso preparatório e o Uruguai tinha levado a melhor: 4 x 3.
É verdade que alguns erros foram cometidos pela Comissão Técnica brasileira nos dias que precederam a final. O maior deles foi mudar a concentração do tranqüilo Joá para o agitado estádio de São Januário, onde o entra-e-sai de políticos perturbou o time até na hora do almoço antes da partida. Mas os outros episódios aos quais se atribui parte da culpa pela derrota nada justificam.
Por exemplo, afirma-se que os jogadores foram acordados às sete da manhã para participar de uma missa. É verdade, mas apenas parte dos jogadores foi e o mesmo havia ocorrido em outros jogos. Ou que o time tinha comido só sanduíches antes do embarque para o Maracanã. Houve almoço, interrompido por discursos, mas houve. Ou que os jogadores brigaram por causa da premiação ou de terrenos prometidos apenas a alguns membros da Seleção. O único foco de discussão foi no início da Copa, quando Jair ganhou um lustre por ter feito o primeiro gol da Seleção, contra o México. O combinado era que todos dividiriam todos os prêmios, mas foi decidido que não valia a pena discutir por causa de um lustre e Jair ficou com ele. Ou que Bigode se abalou com um tapa de Obdulio Varela no primeiro tempo. O historiador Paulo Perdigão, no magistral livro Anatomia de Uma Derrota (1986), desvendou a lenda.
Na verdade, foi um lance que quase degenerou em briga, em que Obdulio deu uns tapinhas de leve no pescoço de Bigode, para acalmá-lo. Nada que pudesse tirar do sério um jogador. Enfim, toda vez que uma derrota não é bem digerida busca-se qualquer coisa que a explique, como ocorreria novamente 48 anos depois, na França.