Uso frequente de vape pode aumentar o risco de exposição a urânio e chumbo
Os metais aparecem sobretudo nos sabores mais doces e comprometem o desenvolvimento cerebral dos jovens, o maior público consumidor de cigarros eletrônicos.
Criado no começo dos anos 2000, o cigarro eletrônico vaporiza a nicotina (daí o nome) em vez de queimá-la, como acontece com os cigarros convencionais. Como a combustão libera uma série de produtos tóxicos e prejudiciais, a ideia era que os vapes servissem como uma alternativa menos nociva para os fumantes.
Mas não foi isso que aconteceu. Primeiro que, quando introduzidos ao vape, usuários são mais propensos a migrar para o cigarro comum do que seriam se tivessem que partir direto para ele. Segundo, as substâncias do vape podem até ser menos prejudiciais, mas ainda assim não são seguras.
Um novo estudo publicado no periódico Tobacco Control aponta que o uso frequente do aparelho por adolescentes pode aumentar o risco de exposição ao chumbo e ao urânio, potencialmente prejudicando o desenvolvimento do cérebro e outros órgãos do corpo.
Segundo a edição de 2023 do Covitel, relatório elaborado pela Universidade Federal de Pelotas, quatro milhões de brasileiros já experimentaram algum tipo de cigarro eletrônico. Entre os jovens de 18 a 24 anos, 25% já fumaram vape. É mais do que a porcentagem de pessoas da mesma faixa etária que consome cigarros comuns regularmente (12,1%).
Nos EUA, onde foi feito o estudo, os números também são preocupantes: 14% dos estudantes do ensino médio americano relataram usar vape.
Certos metais foram identificados em aerossóis e líquidos de cigarros eletrônicos. A sua absorção é especialmente prejudicial durante os períodos de desenvolvimento. O aumento da exposição está ligado a deficiências cognitivas, distúrbios comportamentais, complicações respiratórias, câncer e doenças cardiovasculares.
Pensando nisso, os pesquisadores tentaram descobrir se uma maior frequência de uso de vape estaria ligada a maiores níveis de metais tóxicos.
Eles convocaram 200 usuários como participantes do estudo, com idade média de 15 anos. Suas amostras de urina foram testadas quanto à presença de cádmio, chumbo e urânio. A frequência com que fumavam foi dividida em ocasional (1–5 dias/mês), intermitente (6–19 dias) e frequente (20 dias ou mais).
Dos 200 participantes, 65 relataram uso ocasional, 45 foram classificados como intermitente e 81 como uso frequente. Nove voluntários ficaram sem informações de frequência.
A análise das amostras de urina mostrou que usuários intermediários tinham níveis de chumbo 40% mais altos do que os fumantes ocasionais, enquanto os frequentes tinham níveis 30% mais altos. Essa discrepância era ainda maior para os níveis de urânio: foram duas vezes mais altos para fumantes frequentes do que para os ocasionais.
Particularmente preocupantes foram os níveis aumentados de urânio encontrados nos vapes de sabores doce, como chocolates, crème brûlée e algodão doce. Os usuários desse tipo tinham níveis do elemento 90% maiores do que quem preferiam sabores de menta ou frutas.
Segundo eles, o sabor docinho desses produtos pode suprimir os efeitos adversos da nicotina e aumentar seus efeitos de reforço, resultando em uma resposta cerebral mais forte ou uso do vape e, potencialmente, mais vício.
“O uso de cigarros eletrônicos durante a adolescência pode aumentar a probabilidade de exposição a metais, o que pode afetar negativamente o desenvolvimento do cérebro e dos órgãos”, escrevem os pesquisadores. “Essas descobertas mostram a necessidade de mais pesquisas, regulamentação dos vapes e intervenções de saúde pública direcionadas para mitigar os danos potenciais do uso de cigarros eletrônicos, especialmente entre adolescentes.”
No Brasil, a venda de cigarros eletrônicos é proibida desde 2009. Mas não há nenhuma lei que impeça o seu consumo.