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A ciência dos juros: entenda o que é como funciona a taxa Selic

Como o Banco Central controla a inflação – e por que a manutenção da alta nos juros foi um bom trabalho da autarquia. 

Por Alexandre Versignassi
Atualizado em 16 jun 2023, 09h40 - Publicado em 15 jun 2023, 17h18
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  • Quando sua mãe disse que “dinheiro não dá em árvore”,  ela estava enganada. Existe uma árvore que dá dinheiro, sim. Ela fica no Banco Central. Porque o BC conta com uma capacidade que nenhum outro agente da economia tem. Ele é um banco que não precisa de clientes. Bancos normais são agentes intermediários: pegam dinheiro de quem tem, oferecendo alguma remuneração em troca, e emprestam para quem não tem. 

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    A diferença entre os juros que ele paga a título de remuneração e os que ele cobra pelos empréstimos é o spread. Remunere um depósito de R$ 1 milhão a 13% ao ano; empreste este mesmo milhão a 60% ao ano, e você, banqueiro, fica com a diferença. Vai dar um confortável lucro de R$ 470 mil – operando só com dinheiro dos outros. Por essas, bancos grandes e eficientes lucram coisa de R$ 100 milhões por dia. 

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    Mas vida de banco não é simples. Nos livros contábeis dessas instituições, o dinheiro dos correntistas é considerado um “passivo”, ou seja, uma grana da qual o banco precisa dispor para quem fizer saques ou transferências. Já o dinheiro a receber dos empréstimos que ele concedeu vale como um “ativo”, pois quando os devedores pagarem ele se transformará em caixa. Os outros ativos, vale mencionar, são o dinheiro em caixa para valer e a “poupança” bilionária que a instituição mantém para si mesma na forma de títulos públicos.  

    Para o banco se manter saudável, o montante em ativos precisa permanecer pelo menos igual àquele em passivos. Só que toda hora entra e sai dinheiro adoidado. Às vezes, o banco pode tomar alguns calotes e se ver com menos ativos do que passivos. Acontece o tempo todo. O que o banco faz, então? Senta e chora? Não.

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    Ele pega com outros bancos o dinheiro necessário para fechar o livro contábil. Se uma instituição terminou o dia no vermelho e outra, no azul, esta última ficará feliz em emprestar para a concorrente, pois é o acordo mais seguro que existe. O banco que fechou no vermelho deixa uma parte de seus títulos públicos como garantia. Não há como o banco que fechou no azul levar um chapéu. E o pagamento rola no dia seguinte mesmo, da noite para o dia. 

    Esse mercado de empréstimos rola diariamente e envolve todas as 157 instituições financeiras do país. E não é por WhatsApp e Pix que eles se resolvem, claro. Os pedidos e ofertas de empréstimos com garantia se dão num ambiente controlado pelo Banco Central: o Sistema Especial de Liquidação e Custódia. 

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    Cada instituição decide o quanto cobra de juros uma da outra. Terminado o toma lá dá cá, o Banco Central apura a média das taxas. Digamos que deu 0,051% – uma taxa razoável para um empréstimo de um dia. O BC, então, calcula essa taxa em termos anualizados, contabilizando todos os dias úteis do ano, para ter um número mais sólido. Os 0,051% por dia do nosso exemplo equivalem, fazendo as contas, a 13,7%.

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    Pronto. Essa terá sido a taxa do dia do Sistema Especial de Liquidação e Custódia – entidade mais conhecida por sua sigla: Selic. Esses 13,7%, então, são a famosa “taxa Selic”.

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    Agora pare. E pegue no compasso: se os bancos decidem livremente qual será a Selic, por que o noticiário diz todo dia o que o BC deveria ou não deveria fazer com ela? É que o Banco Central tem mesmo o poder de mudá-la.

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    A Selic acaba funcionando como o juro mais baixo que existe no mercado – pois são empréstimos entre cachorros grandes sob a garantia mais sólida que existe, a dos títulos públicos. Na prática, ela é o preço que os bancos pagam pelo dinheiro que vão emprestar depois. Por isso, é chamada de “juro básico da economia”. Se a Selic subir, os bancos cobrarão mais juros nos financiamentos; se cair, vão cobrar menos. 

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    Como o BC influencia a Selic? Assim: se ele quiser que essa taxa média suba, entra de gaiato no toma lá dá cá interbancário pegando dinheiro emprestado. Vamos dizer que o BC quer a Selic em 13,75%. Aí o Bradesco fechou o dia no vermelho e ofereceu pagar 13% por um desses empréstimos-relâmpago. Nesse caso, o BC faz o seguinte: diz para os outros bancos que também quer emprestado, mas que topa pagar 13,74%. Ao Bradesco, restará aumentar sua oferta para 13,75%, se não qualquer banco que terminou o dia no azul vai preferir emprestar para o BC mesmo. 

    Esse expediente deixa o dinheiro mais caro para os bancos. Para todos os bancos, já que eles se revezam diariamente no papel de credor e de devedor um do outro. Com o dinheiro mais caro, todos vão cobrar mais nos financiamentos que oferecem aos clientes. Aí menos gente pega emprestado, e a quantidade de dinheiro em circulação cai. Com menos moeda girando, os preços param de subir, por falta de demanda.

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    Por um lado, isso freia a economia. Por outro, trata-se da única arma eficaz contra a inflação. Guarde isso.  

    Quando o BC quer que a Selic caia, rola o contrário. Entra em cena a árvore de dinheiro. O Banco Central aparece na ciranda emprestando dinheiro. Se um banco oferece pagar 13%, o BC chega e fala: “que é isso, meu amigo… toma aqui por 12,50% só, de coração”. 

    Até agora, os juros se mostraram altos o bastante para combater a inflação, mas não a ponto de minar a economia.  

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    E o BC não precisa ter nada em caixa para emprestar. Simplesmente “imprime” dinheiro – no caso, emite moeda nova em seus computadores e transfere ao banco que pediu. Nisso, os bancos que quiserem participar da ciranda terão de oferecer juros menores para competir. E o farão – como dissemos, vale a pena de qualquer jeito. Essa emissão de dinheiro coloca mais grana na praça. Bom para a economia, mas dá gás para a inflação. 

    Para balancear as coisas, o BC trabalha com duas metas. Uma é para Selic. Quando sai no noticiário que ela “está em 13,75%”, significa que essa é a meta corrente (revista mais ou menos a cada 40 dias). Outra é a meta de inflação. O alvo para 2024 é de um IPCA em 3%. O índice fechou maio em 3,9% – uma bela queda ante o pico mais recente, de 12,1%, em abril do ano passado.

    Desde 2021, o Banco Central é independente do Poder Executivo. O presidente da República não pode demitir o do BC, que tem mandado fixo (o atual vai até 2024). Lula não digeriu bem o conceito. Há seis meses reclama que os juros estariam altos demais, e deixa claro que preferiria baixá-los na marra. 

    Os fatos porém, mostram que o BC vem fazendo um  bom trabalho. A inflação está convergindo para a meta. Ao mesmo tempo, o PIB não fraquejou: alta de 4% na comparação entre o primeiro trimestre de 2023 e o de 2022. 

    Ou seja: os juros foram altos o bastante para conter a inflação, mas não a ponto de minar a economia. Que o Poder Executivo tenha mais paciência. Porque não há como construir um país menos desigual sem combater a inflação com vigor. Até o último round.

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