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Eles vão fundo

Robôs se aventuram a mais de 2 000 metros de profundidade e ajudam o Brasil a bater recordes na perfuração de poços e na extração de petróleo no mar.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h36 - Publicado em 30 set 1999, 22h00

André Santoro, da Bacia de Campos, Rio de Janeiro

Ondas de 2 metros estouram no casco do navio-plataforma. No convés, a tripulação se prepara, apreensiva, para instalar o conjunto de válvulas que irá controlar um poço de petróleo recém-perfurado. A tarefa seria simples, não fosse a profundidade abissal. A mais de 2 000 metros, a temperatura é de 4 graus centígrados e a pressão, 200 vezes maior do que a da superfície. Para piorar, não há luz.

Ligado à embarcação por um grosso cabo acoplado a suas costas, o Veículo de Operação Remota (ROV, na sigla em inglês), um robô-submarino, começa a descer. Em alguns minutos ultrapassa os 300 metros, limite a partir do qual a pressão torna-se fatal para um homem. Lá do fundo, seus sensores transmitem dados para o navio e os técnicos podem posicionar, da plataforma, as válvulas sobre o poço.

O ROV faz parte da equipe metálica que tem ajudado o Brasil a bater repetidos recordes mundiais na perfuração de poços e na extração de petróleo no fundo do mar. No mês passado, a Petrobras atingiu a incrível marca de 2 607 metros abaixo da linha d´água, na Bacia de Campos, Rio de Janeiro. Por trás dessa vitória estão os autômatos silenciosos. Os pesquisadores da estatal já patentearam quinze deles. E outros projetos, mantidos em segredo, aguardam na fila a certidão de nascimento.

asantoro@abril.com.br

Tecnologia que ninguém vê

A máquina trabalha tranqüila onde o homem seria esmagado pela pressão.

Braços fortes e ágeis

Um dos braços do ROV é mais maleável: tem sete articulações que imitam os movimentos humanos. O outro é mais forte e carrega até 100 quilos

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Mergulhador ocasional

Enquanto não é lançado ao mar, o robô fica estacionado no convés das plataformas. Lá embaixo, usa sonar e um sistema de posicionamento por satélites para se orientar

Olhos por todo lado

O robô tem três câmeras. Uma grava em preto-e- branco e é fixa. Outra alcança 25 metros quase sem luz. A terceira, colorida, se move em todas as direções, sempre acompanhada por um farolete. Os sinais seguem para o navio por cabos de fibra óptica

A maior profundidade que o mergulhador pode alcançar é de 300 metros.

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O robô chega a 3 000 metros

Entre outras atividades, o robô-submarino orienta a instalação de equipamentos, como estas válvulas que devem ficar sobre o poço para regular a saída do petróleo mais tarde

No último recorde brasileiro, na Bacia de Campos, Rio de Janeiro, as brocas começaram a perfurar o solo do fundo do mar a 2 607 metros de profundidade. Depois, ainda há mais 500 metros de rocha até atingir o petróleo

Algo mais

O primeiro recorde brasileiro na perfuração de poços petrolíferos submarinos foi alcançado em 1977. Mas, visto de hoje, parece brincadeira de criança: o buraco começava a apenas 124 metros do nível do mar.

Máquinas feitas sob encomenda

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Em águas rasas é muito simples. Um mergulhador de carne e osso desce e conserta os equipamentos em dois tempos. Acontece que 50% das plataformas da Petrobras extraem petróleo de profundidades abaixo de 400 metros. Além disso, 74% das reservas do Brasil também localizam-se nessas regiões. Daí a importância estratégica da robótica.

Como o ROV não consegue resolver todos os problemas, às vezes é necessário criar outras máquinas. Por isso, imaginação e criatividade são obrigatórias no Centro de Pesquisas e Desenvolvimento da Petrobras (Cenpes), no Rio de Janeiro. Em geral, os maiores abacaxis aparecem na fase de produção. Um caso memorável se deu em dezembro de 1992. Um poço do Campo de Marlim, na Bacia de Campos, começou a vazar a 752 metros de profundidade. “Em três semanas, imaginamos a solução, testamos o protótipo e descemos o robô só para apertar um parafuso”, contou à SUPER o engenheiro Ney Robinson Salvi dos Reis, do Grupo de Tecnologia Submarina do Cenpes (veja o quadro na página ao lado).

Em agosto de 1997, os pesquisadores encontraram outro problemão numa das plataformas do Campo de Bijupirá-Salema, também em Campos: o entupimento de uma tubulação. Primeiro, para detectar o bloqueio, inventaram um robô capaz de perceber dilatações de micrômetros (a milionésima parte do metro!) no cano. Depois, desenharam outro, que ainda está sendo construído, para caminhar dentro dele e limpá-lo. Enquanto isso, o entupimento continua dando prejuízo.

Direto do laboratório

Não há dúvida de que sem essas maquininhas todo o trabalho seria mais complicado. Por isso, a Petrobras investe pesado em pesquisa. Cerca de 500 cientistas, em várias universidades, trabalham para solucionar problemas. Dos laboratórios do Cenpes já saiu um cabo sintético de poliéster para substituir o aço na confecção de âncoras para as plataformas. É mais leve e mais resistente à corrosão. Agora, os técnicos se debruçam sobre uma bomba que puxa o petróleo com maior pressão do poço até a plataforma. “Com ela poderemos voltar a extrair petróleo de poços que até já pararam de produzir”, disse à SUPER o engenheiro mecânico Elísio Caetano Filho, do Cenpes.

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Na Coordenação de Pós-Graduação em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe) está sendo construído o primeiro tanque oceânico da América Latina. Com 50 metros de comprimento, 30 de largura e 10 de profundidade, a piscinona vai imitar, usando hélices e placas que chacoalham dentro d’água, as condições que os equipamentos enfrentam em alto-mar, onde há correntes submarinas, ondas e vento. As tecnologias novas são cruciais, mas não superam o charme dos operários metálicos. Pode-se até fazer pouco das funções que eles desempenham – abrir e fechar válvulas, apertar parafusos ou tapar buracos –, mas, ao realizá-las, os robôs estão levando os braços e os olhos humanos aonde eles jamais poderiam ir.

Um recorde brasileiro em três etapas

A operação para extrair petróleo no mar emprega vários tipos de plataformas.

Furadeira

A primeira plataforma só serve mesmo para fazer o poço. Lá de cima, a broca desce por um tubo, atinge o leito do oceano e fura o buraco. Depois, ele é fechado com uma tampa de cimento.

Hora de equipar

Com o auxílio do robô-submarino, a segunda plataforma instala as válvulas que controlam a abertura do poço e a coluna que levará o petróleo.

A produção

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Por último, uma plataforma que pode ser um navio modificado extrai o óleo e o bombeia para a terra ou para petroleiros.

Artesanato moderno

A mesa do engenheiro mecânico Ney Robinson Salvi dos Reis, 49 anos, do Grupo de Tecnologia Submarina do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da Petrobras, poderia ser confundida com a escrivaninha de um estudante de pré-escola. É uma bagunça. Tem papelão, arame, cola, alfinetes, fitas adesivas etc. Mas Ney não brinca em serviço. Seu nome está gravado em todas as patentes de robôs já registradas pelo grupo.

Mineiro de Juiz de Fora, ele mora no Rio desde os 2 anos de idade, mas traz a origem caipira no sangue. Pelo menos no que diz respeito às novidades do mundo moderno. Numa atitude difícil de entender num criador de tecnologias, rejeita a informática. “É possível gerar tecnologia de ponta sem usar bits e bytes”, diz ele, que acha mais fácil trabalhar com as mãos. Nada de modelagem virtual. “Pego um pedaço de papelão, corto, monto a maquete e mostro o aparelho como deve ser”, resume.

Parece fácil. Para ele, é mesmo. A habilidade para criar máquinas originais, acredita, nasceu da união entre a formação acadêmica e o interesse pelas artes. Ney também pinta, esculpe e já foi até dançarino. “Não dá para criar ferramentas inéditas sem sonhar um pouco”, filosofa.

Engraçado é que um dos seus inventos, o robô que irá desentupir tubos de petróleo, veio literalmente do berço. “Quando eu era criança, minha avó construiu uma tartaruga de papelão que ao se mover mexia a cabeça para dentro e para fora do casco”, lembra-se. Foi inspirado naquele brinquedo que ele teve as idéias básicas para fazer o novo equipamento caminhar e ao mesmo tempo limpar o cano. Como isso acontece, porém, Ney só conta depois que obtiver a patente do invento.

Recordista de produção

No alto, o navio-plataforma Seillean, na Bacia de Campos, no Rio, que extrai petróleo a 1 853 metros da superfície. É o poço submarino mais profundo em atividade do mundo. Os demais ainda não produzem. Abaixo dele, o buraco no casco por onde entra o tubo que traz o óleo lá de baixo

Piloto a distância

O técnico Alex Maia, 21 anos, comanda do navio, por meio de computadores, os robôs que trabalham no fundo do mar

Tudo feito à mão

Com jeito de roqueiro heavy metal, Ney Robinson une a arte à tecnologia para desenvolver seus robôs

Brinquedo muito sério

A partir desta maquete de papelão foi feito o robô que solucionou o vazamento de petróleo do Campo de Marlim, em 1992. Ele evitou um desastre ambiental

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