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Uma história #semfiltro

Como o paulistano Michel Krieger criou o Instagram e, em apenas 18 meses, vendeu sua rede social ao Facebook por 1 bilhão de dólares

Por Filipe Vilicic
Atualizado em 8 mar 2024, 11h17 - Publicado em 6 out 2015, 14h00

Michel Krieger trabalha de camisa xadrez colorida, calça jeans e tênis. Apesar de bon vivant, prefere bicicleta a carro, o que conta pontos entre seus colegas do Vale do Silício. Nos headphones, bandas independentes, de preferência Arcade Fire e Okkervil River. Na cabeça, neurônios que sempre o fizeram se destacar entre os colegas. “Quando me lembro dele adolescente, sinto que faz muito sentido vê-lo criando o Instagram anos depois”, recorda o americano Wayne Shackefold, que foi seu professor no ensino médio, em São Paulo.

Filho de um alto executivo da indústria de bebidas destiladas, Michel estudou em uma famosa escola paulistana, a Graded. De currículo bilíngue, com aulas em inglês, e grade copiada do modelo de ensino americano, a instituição é povoada por herdeiros de famílias abastadas. Os pais de Michel o matricularam lá para dar continuidade aos estudos do filho que, antes mesmo de completar 5 anos, teve sua primeira vivência internacional: mudou-se com a família para Lisboa. Na Europa, ingressou em uma escola de currículo internacional, similar à Graded, para que seus estudos não fossem interrompidos caso o pai tivesse de ser transferido mais vezes em função do emprego. O que ocorreu: após Lisboa, a família voltou a São Paulo, depois rumou para Miami e então para Buenos Aires, antes de voltar à capital paulista.

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Foi em Portugal, aos 9 anos, que ele começou a mergulhar no mundo dos computadores. “Meu pai me deu um PC velhão, cinza, bem anos 90, e eu passava horas mexendo nele”, recorda Michel. Como a maioria dos meninos, usava o computador principalmente para jogar. Um de seus games preferidos era o Gorillas, que rodava em MS-DOS (aquele de tela preta, pré-Windows). O jogo consistia basicamente de um gorila arremessando bananas, mas também era programável. Isso o ajudou a aprender o básico da arte de escrever software. “Dava para explorar a linguagem de códigos no game para reconfigurar os cenários, por exemplo. Eu adorava fazer isso”, disse.

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Michel gostava da simplicidade de Gorillas. O gosto pelo prático, pela simplificação, o acompanhou pela vida e foi determinante para o sucesso da rede social de fotos que ajudou a criar aos 24 anos. “Quando Kevin (seu sócio no Instagram) me apresentou um app que estava desenvolvendo, logo vi que ele era todo complexo, sujo. Precisava torná-lo limpo, fácil de ser utilizado”, disse. Michel conheceu Kevin depois de sair de vez do Brasil e rumar para os EUA. Quando estava no terceiro colegial, o brasileiro não tinha ideia do que queria ser quando crescesse. Pensava em jornalismo, mas ao mesmo tempo gostava de computação. “Um dia ele veio me procurar, pedindo conselhos”, recorda Jeff Lippman, americano que vivera na Califórnia antes de se mudar para o Brasil e ir dar aulas na escola bilíngue em que estudava Michel. O papo entre aluno e professor rolou em um almoço em uma tenda improvisada no pátio do colégio, que passava por reforma. Enquanto comiam estrogonofe, Michel compartilhava suas dúvidas: não sabia se ficava no Brasil e tentava ingressar na USP, ou se rumava para os Estados Unidos, pois já tinha sido aceito em diversas universidades americanas. O professor o aconselhou a ir para uma delas: Stanford. Michel seguiu a recomendação.

Quando rumou para os EUA, Michel virou Mike. Na universidade, destacou-se. Foi aceito no concorridíssimo curso Sistemas Simbólicos, que agrega disciplinas como psicologia, computação, linguística e filosofia. Tudo a ver, porque Mike tem espírito renascentista – mescla o gosto por exatas com o apreço por arte e ciências humanas.

Também graças ao desempenho acadêmico ele acabou conhecendo o sujeito que mudaria sua vida: Kevin Systrom. É que Mike foi um dos 12 aceitos, dentre centenas de estudantes, no Mayfield Fellows, um programa de estudos que coloca universitários em contato com experiências de empreendedorismo. Kevin, três anos mais velho, também havia passado pelo Mayfield e conheceu o brasileiro em uma das festas promovidas pelos alunos.

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Mike e Kevin estreitariam laços três anos depois. O brasileiro já havia se formado, feito mestrado, e então trabalhava na Meebo, uma startup de mensagens instantâneas (hoje parte do Google). O americano havia seguido trajetória similar, passando pela Odeo (que depois virou o Twitter) e Google. Ambos, porém, não se contentavam em simplesmente trabalhar para os outros. Queriam era fundar um negócio. “Estava imerso nesse mundo de inovação, por todos os lugares que se olha no Vale do Silício há caras sentados criando coisas novas”, disse Mike. Ele era um desses caras. Tanto que quase ficou milionário ainda mais precocemente, quando fora convidado para fundar o Peixe Urbano, bem-sucedido site brasileiro de vendas de cupons de descontos. Ele saiu desse barco e depois foi alvo de piadas de alguns colegas, que diziam “olha aí, perdeu a chance”. Mike, porém, teria uma oportunidade bem maior à frente.

Ele e Kevin se encontravam nos cafés e começaram a papear com constância. Compartilhavam experiências profissionais e um dava dicas para o outro, de como poderiam fazer seus próprios negócios. Em uma das conversas, o americano apresentou o protótipo de um app, chamado Burbn (em referência a sua bebida preferida, o bourbon), que mesclava geolocalização, ao estilo do já famoso Foursquare, com o compartilhamento de fotos e status. Era o precursor do Instagram. Ao ver o protótipo, Mike o considerou “confuso” e “muito igual a outros do mercado”. “Mas eu sabia que poderia melhorá-lo”, disse.

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Kevin levantou US$ 500 mil com empreendedores de risco para dar vida ao projeto. Os investidores o aconselharam a conseguir um sócio, para aprimorar a ideia. Foi então que o americano convidou Mike, muito mais entendido em programação. Assim deram início à trajetória do Instagram.

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A criação do app foi turbulenta. Os primeiros testes não vingaram e logo a dupla percebeu que o programa estava fadado ao fracasso. Sentaram para discuti-lo e veio a ideia de simplificá-lo, cada vez mais. Tarefa que coube ao brasileiro. Após noites insones, Mike e Kevin decidiram desenhar um app dedicado apenas ao compartilhamento de fotos – nada de geolocalização, status com opiniões sobre lugares visitados ou outras funções que apenas acabavam por deixar o programa caótico. Deram, então, o nome provisório de Codename e desenharam os primeiros esboços. Mas não ficaram satisfeitos. Kevin acabou decidindo que precisava de um descanso da rotina desanimadora. Enquanto Mike continuou com os trabalhos em São Francisco, o sócio tirou um período de descanso com a namorada, no México.

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Foi na folga que Kevin teve o que pode ser considerado o momento eureca que os levou ao sucesso. Em uma caminhada em uma praia mexicana com a namorada, pintou uma conversa sobre belas fotos compartilhadas em redes sociais por um amigo do casal. “Como o Greg consegue fazer com que todas as fotos que tira fiquem tão boas?”, questionou a namorada. “Ele usa apps que colocam filtros nas imagens”, respondeu Kevin. “Então vocês deveriam ter filtros também, né?”, retrucou a namorada. E assim surgiram os filtros do Instagram.

Quando Kevin voltou a São Francisco, passou a ideia dos filtros ao sócio. Os dois voltaram a se empolgar com o projeto e logo Mike criou os primeiros esboços do Instagram. O app estreou em 6 de outubro de 2010, e os fundadores não esperavam grande coisa. “Bom, talvez algumas pessoas entrem”, dizia Kevin ao amigo momentos antes de lançarem a rede social na App Store. Algumas centenas de downloads já estaria ótimo. Depois de noites mal dormidas por trabalho excessivo, os dois queriam colocar o programa no ar e rumar logo para suas casas. Só que não deu.

Mais de 25 mil pessoas baixaram o app no primeiro dia. E a dupla teve de virar outra noite na batalha para deixar o app no ar, já que o sistema começava a cair por excesso de usuários. Um ano e meio depois, em 2012, o número de usuários chegaria a 30 milhões. E o crescimento do Instagram logo passou a ser comparado com o de outra rede social, que explodira anos antes: o Facebook.

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Assim como a subida do Facebook abafou sites concorrentes, como o MySpace e, no Brasil, o Orkut, muitos da área apostavam que a ascensão do Instagram poderia representar perigo real ao império de Mark Zuckerberg. Isso despertou a atenção de gigantes da indústria. “Passamos a receber diversas ofertas de aquisição”, conta Mike.

O assédio teve um capítulo final na semana da Páscoa de 2012. Foi uma semana movimentada. Em sete dias, Mike, lançou uma versão do app para Android. Ainda chegaram ofertas de compra vindas de líderes da área digital, como o Twitter e o Facebook. Eles recusaram todas. Afinal, no mesmo período, a dupla focava em outra tarefa: conquistar mais US$ 50 milhões vindos de outros investidores, objetivo que alcançaram nos mesmos sete dias. E, quando achavam que iam descansar da semana atarefada, Mark Zuckerberg convidou Kevin para visitar sua mansão em Palo Alto.

O dono do Facebook não tinha aceitado o “não” como resposta a uma oferta de aquisição, de US$ 500 milhões, que havia feito dias antes. Então resolveu dobrar a oferta para US$ 1 bilhão. Pronto, sem nem consultar os outros investidores, a dupla vendeu a empresa. Na ponta do lápis, investidores e funcionários dividiram metade do valor da compra. Kevin, sócio majoritário, ficou com 40% do dinheiro. Mike, aos 26 anos, levou 10% – US$ 100 milhões. Hoje, ele trabalha no Facebook, à frente do próprio Instagram. E Michel Krieger continua escrevendo sua história no Vale do Silício. Uma história que não precisa de filtro nenhum para ficar impressionante.

*Filipe Vilicic é editor de ciência da Veja, e autor do livro O Clique de 1 Bilhão de Dólares, lançado em 2015, sobre a saga do Instagram.

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