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Brasileiros descobrem fóssil mais antigo de formiga, de 113 milhões de anos

Ela faz parte das "formigas do inferno", um grupo ancestral com grandes mandíbulas e corpo robusto. Entenda o achado.

Por Manuela Mourão
29 abr 2025, 16h00

“Que dó da formiguinha” foi um meme famoso há mais de 10 anos. No vídeo, uma criancinha chora pela morte de uma formiga pequenina e indefesa. Essa é uma cena que jamais aconteceria há 113 milhões de anos — não apenas pela ausência de humanos na época, mas também porque as formiguinhas do período Cretáceo não tinham nada de inofensivas.

Uma nova pesquisa descobriu, no Brasil, o fóssil mais antigo de uma formiga que se tem registro. O animal é um ancestral das que conhecemos hoje – com a diferença de que era uma predadora bem mais agressiva que as suas primas dos dias atuais.

A formiga fazia parte de uma subfamília chamada Haidomyrmecina, as “formigas do inferno”. Esses animais eram famosos por suas técnicas únicas de caça: o inseto possuía chifres e mandíbulas em forma de foice. Essas estruturas permitiam que elas empalassem suas presas. Além das cabeças ornamentadas, os bichinhos ainda tinham mandíbulas que se moviam verticalmente (como a boca humana), ao contrário das formigas modernas, cujas mandíbulas se movem lateralmente.

As primeiras formigas surgiram nos Períodos Jurássico Superior e Cretáceo Inferior, entre 168 milhões e 120 milhões de anos atrás. Esses insetos se desprenderam evolutivamente das moscas e abelhas e, do chão, começaram a se espalhar e diversificar. Assim, novas espécies de formiguinhas foram surgindo: hoje, estima-se que existam 22 mil espécies do animal. 

Mas vamos à espécie anciã. Ela vem de Crato, uma formação geológica no Araripe, divisa dos estados do Piauí, Pernambuco e Ceará. Seu fóssil estava entre os mais de cinco mil fósseis de insetos que pertenciam à entomologista Maria Aparecida Vulcano (1921-2018). Como homenagem, a formiga recebeu o nome Vulcanidris cratensis.

Antes da Vulcanidris, o fóssil mais antigo de uma formiga era um exemplar de 100 milhões de anos de idade. A descoberta brasileira foi também a primeira encontrada em um pedaço de calcário e surpreendeu os cientistas não apenas pelo tamanho, ou pelo CEP (até então, esse tipo de formiga só tinha sido encontrado no Hemisfério Norte), mas também pela aparência imponente: com mandíbulas enormes e um corpo robusto, a formiga lembrava mais um predador do que os insetos organizados em colônias que conhecemos hoje.

O achado foi resultado de uma pesquisa liderada pelo biólogo Anderson Lepeco, que contou para a Super que a descoberta do fóssil foi uma surpresa: aconteceu quando o pesquisador teve contato com a coleção de Vulcano, que foi doada ao Museu de Zoologia da USP. “Eu procurava por algum grupo de vespas daquela época que poderia existir ali e acabei topando com esse bicho. Eu pensei na hora: ‘isso aí deve ser uma formiga do inferno'”. 

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Para confirmar a hipótese, Lepeco e uma equipe de pesquisadores usaram uma técnica chamada microtomografia computadorizada para observar o interior do fóssil de calcário. Esse tipo de raio-X  permite a criação de uma imagem 3D detalhada do inseto.

“Depois que a gente fez a reconstrução digital, ficou mais evidente ainda que era uma formiga do inferno. Foi quando conseguimos ver a parte de dentro da rocha e vimos aquelas mandíbulas muito doidas. Que é uma coisa característica só desse grupo”, disse Lepeco. 

Além disso, ter encontrado um exemplar desse animal na América Latina reescreve o que se sabia do bichinho até então. O pesquisador considera que esse fato diz respeito a um sucesso evolutivo dessas formigas e que elas estavam bem mais distribuídas no globo do que se imaginava antes. 

Os próximos passos

Lepeco diz que gostaria de estudar o fóssil em um síncrotron, um acelerador de partículas gigante que funciona como um microscópio super potente – o Brasil possui um desses em Campinas, no CNPEM.  

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“Assim, daria para recuperar ainda mais detalhes da morfologia da formiga. E com isso a gente consegue criar uma análise filogenética mais complexa, para entender, por exemplo, quando que elas divergiram das outras espécies”. 

Por fim, Lepeco ressalta que falta incentivo nas pesquisas sobre insetos e por isso existem muitas lacunas a serem preenchidas.  

“Se eu tivesse achado qualquer dinossauro, talvez eu tivesse tido o mesmo impacto dessa formiga, né? Mas, se essa não fosse a formiga mais antiga, provavelmente não atrairia tanta atenção.”

O pesquisador espera que seu estudo inspire novos trabalhos de examinação de coleções já existentes. “Isso traz uma luz, chama atenção para essa área de pesquisa no Brasil”, afirma. “Dinossauro realmente é muito legal. Mas esses insetos também podem ser bem legais, às vezes.”

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