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Para fotografar o buraco negro em HD, precisamos de um telescópio na Lua

Uma foto mais definida pode revelar subestruturas no borrão laranja. Teoricamente, tal feito é possível – mas precisamos de uma ajudinha do nosso satélite.

Por Carolina Fioratti
3 abr 2020, 17h40

Um feito histórico marcou o ano passado: a primeira foto de um buraco negro. A imagem obtida pelo projeto Telescópio de Horizonte de Eventos (EHT) – uma cooperação entre físicos e astrônomos de dezenas de países – mostra um grande anel vermelho-alaranjado desfocado, que não diz muito para o olhar de um leigo. Embora os astrofísicos consigam ler bem mais informações do que nós naquela donut incendiário, eles também sonham com um registro de alta definição do M87*, que fica a 53,4 milhões de anos-luz de nós. 

Para fotografar algo tão distante, é preciso um telescópio bem grande. Sem problema: o EHT tem o maior que dá para fazer. Ele é do tamanho da Terra. Como não dá para de fato construir um telescópio com as mesmas dimensões do planeta, o jeito foi acionar oito telescópios simultaneamente, localizados em vários países, e juntar os sinais recebidos por eles em uma coisa só. Para isso, cada equipamento passou 12 horas acionado: é o tempo que a Terra demora para dar meia-volta e todos possam captar seu quinhão de luz para compor a imagem final.

Para aumentar a definição da imagem, seria preciso, grosso modo, utilizar um telescópio maior. Como conseguir um? Bem, adicione mais dois telescópios na mistura – um na Lua, o outro instalado em um satélite geoestacionário na órbita da Terra. Bingo: agora o telescópio resultante, mais do que o tamanho da Terra, tem o tamanho do raio da órbita da Lua (vale sempre lembrar que esses telescópios têm o formato de antenas parabólicas e captam ondas eletromagnéticas no comprimento de rádio, longas demais para serem vistas por nossos olhos).
O mais legal dessa história é o quê, exatamente, os especialistas esperam encontrar em uma foto tão nítida. Cálculos feitos pela Iniciativa de Buracos Negros de Harvard mostram que a luz ao redor do círculo escuro central não é uma massa disforme: ela estaria organizada em anéis concêntricos, empilhados. Com um telescópio lunar dando uma mãozinha, nós talvez fôssemos capazes de visualizar essa organização em camadas. (Estima-se que será possível montar esse observatório na Lua dentro dos próximos dez anos.) 
A área em torno do buraco negro que nós vemos brilhar na imagem é o disco de acreção: um anel de gás e poeira que gira em torno do buraco negro em uma velocidade incrível graças à sua intensa atração gravitacional. Esse material particulado sofre tanto atrito que emitem uma radiação inimaginável, milhares de vezes superior à do nosso Sol. Por motivos que são um pouco difícil de explicar sem uma pós em Relatividade Geral, essa radiação também se organiza em anéis (que, na foto original, vemos como uma mancha só).
Quanto mais próximos do buraco, mais fininhos são esses anéis, alargando-se com a distância. Esses fótons – nome das partículas que perfazem a radiação eletromagnética – ficam orbitando o buraco negro e, eventualmente, conseguem escapar e alcançar nossos telescópios. Assim são registrados (lembre-se, a parcela da luz que é engolida pelo buraco naturalmente não nos alcança). 
Medindo o diâmetro dos anéis de fótons, é possível calcular a massa do buraco negro. E analisar o formato do anel – ele pode ser circular ou ligeiramente achatado –, indicaria se o buraco negro está girando ou parado. Buracos negros são astros calvos, nas palavras do lendário físico John Wheeler: não revelam muitos dados sobre si, da mesma forma que uma pessoa careca não tem muitos parâmetros para revelar sobre seu penteado, que não existe – daí vem a metáfora bobinha. Saber com precisão a massa e momento angular (uma grandeza física associada à rotação) do M87 seria um trunfo, pois ele não entrega muito mais do que isso. 

 

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