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Perda de biodiversidade é a maior causa de surtos de doenças infecciosas

Análise abrangente de 972 estudos revela que o impacto dos humanos favorece (e muito) o surgimento de novas doenças.

Por Caio César Pereira
9 Maio 2024, 19h00

A pandemia serviu como um lembrete da ameaça constante das doenças zoonóticas – as doenças que são transmitidas para humanos via o patógeno de algum animal. Uma pesquisa, porém, mostrou que infecções do tipo podem aumentar ainda mais por conta de um fator preocupante: a perda acelerada de biodiversidade no mundo.

O estudo, publicado na Nature, foi feito por uma equipe de cientistas da Universidade de Notre Dame, nos EUA, e mostrou que o risco vem dos chamados “impulsionadores de mudanças globais” (ou global change drivers). Esses impulsionadores nada mais são do que os fatores – principalmente de origem humana – que estão causando a destruição dos ecossistemas do planeta.

A pesquisa estudou cinco impulsionadores principais: perda de biodiversidade, mudanças climáticas, poluição química, introdução de espécies não-nativas (as tais espécies invasoras) e perda de habitat. Dentre elas, a pesquisa mostrou que pelo menos três podem servir de estímulo para o aumento de surtos de doenças, com a perda de biodiversidade sendo a principal responsável.

“A conclusão é que a perda de biodiversidade, as mudanças climáticas e as espécies introduzidas aumentam as doenças, enquanto a urbanização as diminui”, explicou ao jornal britânico The Guardian Jason Rohr, pesquisador da Universidade de Notre Dame e um dos autores do estudo.

A pesquisa foi uma meta-análise, um tipo de artigo que pesquisadores revisam tudo o que já foi publicado sobre um tema na literatura científica para chegar a conclusões mais assertivas. No caso, o novo artigo analisou cerca de 972 estudos feitos em todos os continentes do planeta, com exceção da Antártica. Os cientistas examinaram não só a gravidade das doenças, mas também a sua prevalência – e identificaram pelo menos 2.938 observações de mudanças globais aumentando a incidência de doenças.

A pesquisa mostrou ainda que, em áreas urbanas, a tendência de contaminação e disseminação dessas doenças é menor. De acordo com Rohr, isso se deve pelas melhores condições de saneamento e pela difícil adaptação da vida selvagem nas grandes cidades.

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“Nas áreas urbanas com muito concreto, há um número muito menor de espécies que podem prosperar nesse ambiente. Do ponto de vista das doenças humanas, frequentemente há maior saneamento e infraestrutura de saúde do que em ambientes rurais”, explica.

Não fosse isso problema o suficiente, os pesquisadores contam ainda que grande parte desses impulsionadores de mudanças estão conectados um ao outro, em um grande efeito borboleta. “Por exemplo, a mudança climática e a poluição química podem causar perda e alteração de habitat, o que por sua vez pode causar perda de biodiversidade”, diz.

Pesquisas anteriores já mostravam de que forma essa perda de biodiversidade pode afetar a disseminação de doenças. A ação humana no desmatamento e na ampliação de áreas de cultivo reduz a biodiversidade de espécies, e beneficia o crescimento de outras espécies de animais – como ratos e morcegos, conhecidos por abrigar patógenos possivelmente perigosos para humanos.

Em ecossistemas saudáveis, a diversidade de espécies desempenha um papel importante na manutenção do equilíbrio ecológico – pense na dinâmica de presas e predadores, por exemplo, que mantém as populações controladas. Quando essa biodiversidade diminui (devido à extinção de espécies, por exemplo), os ecossistemas se tornam mais suscetíveis a perturbações, como a propagação de doenças.

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Além disso, a degradação do habitat causa uma fragmentação no ecossistema, que pode fazer com que as espécies migrem para novas áreas, entrando em contato mais próximo umas com as outras (inclusive do próprio ser humano). É esse convívio diário que pode aumentar a possibilidade de adaptação e transmissão de doenças entre espécies diferentes.

Pesquisadores das Universidades de Stirling, na Escócia, e da Universidade de Wisconsin-Madison, nos EUA, por exemplo, descobriram que o avanço do desmatamento em florestas tropicais de Uganda, na região da África oriental, está deixando as populações de animais sem alimento.

Com pouca opção para se alimentar, os animais passaram então a comer coco de morcego, ao qual estão repletos de vírus que podem ser extremamente perigosos para outras espécies – inclusive para humanos. Um dos vírus identificados, por exemplo, foi um “parente” do SARS-CoV-2, que causa a Covid-19.

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