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Alexandre Versignassi

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Blog do diretor de redação da SUPER e autor do livro "Crash - Uma Breve História da Economia", finalista do Prêmio Jabuti.
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Carta ao leitor: Crie novas memórias. Elas são a sua vida

Dez minutos de conversa no Zoom podem valer por dez meses de Netflix. Não deixe o tempo escorrer pelas mãos.

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Atualizado em 19 fev 2021, 12h49 - Publicado em 19 fev 2021, 12h20

“A diferença entre passado, presente e futuro é uma ilusão, ainda que persistente”, Einstein escreveu. A ideia do físico ali não era lacrar uma discussão. O italiano Michele Besso, seu melhor amigo dos tempos de faculdade, tinha acabado de morrer. A frase foi escrita numa carta à esposa de Besso. Era uma forma de consolar a ela, e a ele próprio, pela perda.

Ninguém jamais teve tanta propriedade para falar sobre o tempo do que Einstein. O alemão descobriu que o tempo passa em ritmos diferentes para coisas diferentes. Do ponto de vista de um buraco negro, caso ele tivesse ponto de vista, o Universo não existe mais. Trilhões e trilhões de anos já se passaram. Todas as estrelas já se apagaram, os prótons decaíram.

A densidade virtualmente infinita do centro do buraco negro “estica” o tecido do espaço-tempo também de forma infinita. O resultado de tal estiramento é uma aceleração igualmente sem fim no ritmo da passagem do tempo, até o ponto em que o próprio tempo, como entidade, chega à última gota. Esse processo de deformação do tecido espaço- tempo por lá começou na própria formação do centro do buraco, provavelmente há bilhões de anos.

Ou seja: do ponto de vista dele, fatos como o nascimento do seu terceiro neto, as eleições presidenciais do ano de 2158 e os resultados de todas as Copas do Mundo, daqui até a última edição do evento na história da humanidade, estão resolvidos há bilhões de anos.

Agora dê uma olhada no céu, no lugar onde fica a constelação de Sagitário. É lá que está o buraco negro supermassivo do centro da Via Láctea, em torno do qual todas as centenas de bilhões de estrelas da nossa galáxia giram. Não dá para ver, claro, mas ele está ali. Agora mesmo. De alguma forma, ele “sabe” como será cada momento do nosso futuro. Tudo o que para nós ainda segue em aberto para ele é parte do passado. Já está resolvido. Não vai mudar. Presente, passado e futuro, portanto, são uma ilusão. Ainda que persistente.

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A maleabilidade do tempo na física inspira olhar com mais carinho para as agruras do tempo em outra área da ciência: a psicologia. A forma como a mente entende o tempo também varia. Você sabe: uma hora na sala de espera do médico demora bem mais para passar do que uma hora de conversa com amigos que não se veem há muito tempo. Por outro lado, a memória dessa hora na sala de espera deixa de existir assim que você é chamado para a consulta. E a da conversa com os amigos fica para sempre, como se tivesse durado 20 horas.

Há uma armadilha nessa lógica, porém. As horas e horas que você passa maratonando séries, jogando videogame ou rolando o Insta também passam rapidinho. Mas não deixam memórias. O que enriquece a vida é a interação com outras pessoas. O resto não rende juros para a biografia.

Estamos há praticamente um ano sob algum grau de restrição na nossa vida social. Pouca gente, a essa altura, está completamente isolada desde lá. Mas a maior parte de nós não voltou à vida como ela era (o que é ótimo do ponto de vista epidemiológico).

Então sempre vale lembrar: dê uma chance extra para aquelas conversas de Zoom que já enjoaram, telefone para os seus pais e avós, não suma dos grupos de Whats, mande DM quando gostar da foto de um amigo; puxe conversa. Senão, quando você olhar para trás, não haverá nada. Cuide bem da formação de suas novas memórias. Porque, sem elas, a vida se converte numa ilusão, ainda que persistente.

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