Mais de um Universo
Primeiro, descobrimos que a Terra não é o único planeta. Depois, que a Via Láctea não era a única galáxia. Agora a física teórica ensaia o passo seguinte.
Eratóstenes é famoso por ter calculado a circunferência da Terra por volta de 240 a.C. Pelas suas contas, ela seria de 252 mil estádios, a unidade de medida da época para grandes distâncias. Dá 39.689 km. Sabemos hoje que a circunferência norte-sul do planeta (a que ele mediu) é de 40.007 km. Ou seja, Eratóstenes acertou – numa época em que mal se cogitava o fato de a Terra ser redonda.
Mas esse não foi o único feito do polímata grego. Ele também produziu o mapa-múndi mais acurado de seu tempo. Eratóstenes era o chefe da Biblioteca de Alexandria. A partir de documentos do acervo, feitos por comerciantes e expedições militares, juntou tudo o que o Ocidente sabia sobre a geografia de lugares distantes e foi desenhando. Para completar, inseriu o mapa no contexto de sua teoria – a de que o planeta era bola com 40 mil km de circunferência.
Surgia ali o primeiro mapa-múndi dividido em paralelos e meridianos. E com cinco zonas climáticas: duas geladas, nos arredores dos polos, duas temperadas e uma faixa tropical no meio. Outro acerto.
Detalhe: todo o conhecimento que a Biblioteca de Alexandria tinha acumulado sobre as terras distantes se limitava a uma parte ínfima do mundo real: Europa, norte da África, Oriente Médio e um teco da Ásia que só ia até a Índia. A terra mais ao sul do mapa de Eratóstenes era o “chifre da África”, onde hoje fica a Somália.
Mesmo assim, ele tinha certeza de que o mundo não terminava ali. Eratóstenes imaginou que a linha central do globo ficaria alguns milhares de quilômetros para baixo do chifre africano. E que dali em diante, quanto mais ao sul alguém fosse, mais frio ficaria – tal como acontecia com quem viajava para o norte da Europa.
Esse modelo de mundo só existia na cabeça de Eratóstenes, e talvez de mais um ou outro iluminado da época que não deixou registro. Seriam necessários séculos e séculos de progresso na ciência para comprovar que a coisa não era só uma hipótese, mas o retrato fiel da realidade.
E fomos além, claro. Com Galileu, no século 17, nosso endereço no cosmos ganhou um complemento. Não morávamos mais só na Terra. E sim no Sistema Solar também, como mera parte de algo maior. Bem mais tarde, em 1924, viria o conceito moderno de galáxia. Foi quando Edwin Hubble concluiu que a então “nebulosa de Andrômeda” também era um disco com bilhões de estrelas. Logo, a Via Láctea não estava sozinha. E nosso endereço cósmico ganhava mais uma linha.
A fronteira agora é o “Universo observável”, uma bola em expansão acelerada com centenas de bilhões de galáxias. Para além disso, seguimos no escuro. Mas cientistas de hoje, tal como Eratóstenes, também têm suas teorias sobre o que pode haver além dessa fronteira. Talvez exista de fato mais de um Universo.
É o que você pode conferir na reportagem de capa desta edição: as hipóteses mais sólidas sobre o multiverso. O jornalista e polímata Bruno Vaiano, mestre em destrinchar conceitos complexos da física, é o seu guia neste passeio pelo infinito. Boa viagem.