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Deriva Continental

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Um blog para terráqueos e terráqueas interessados no que aconteceu nos 4,5 bilhões de anos em que não estiveram por aqui. Feito pela Sociedade Brasileira de Geologia (SBG) em parceria com a Super.
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Turmalina Paraíba: uma das gemas mais caras do mundo é brasileira

Ela foi descoberta na década de 1980 no interior da Paraíba. Entenda por que um pingente com essa gema chega a valer R$3 milhões.

Por Lauro Cézar Montefalco de Lira Santos e Guilherme dos Santos Teles
17 fev 2023, 11h34

Este é o 24º texto do blog Deriva Continental, escrito por Lauro Cézar Montefalco de Lira Santos, da Universidade Federal de Pernambuco, e Guilherme dos Santos Teles, da Universidade Federal de Campina Grande.

O Brasil é protagonista no fornecimento de recursos minerais para a indústria. Basta ver os sucessivos recordes anuais nas exportações de petróleo, ouro e minério de ferro. Já no mercado de gemas (popularmente conhecidas como “pedras preciosas”,), o Brasil sempre foi inovador na produção de águas-marinhas, esmeraldas, ametistas, diamantes, topázios e safiras. Elas são utilizadas na produção de jóias de alto padrão desde a época do Brasil império, com destaque para as gemas de Minas Gerais encontradas nos vales dos rios Doce, Araçuaí e Jequitinhonha.

O município de Salgadinho, localizado no sertão do estado da Paraíba, ficou famoso internacionalmente no início da década de 1980, quando foi descoberta uma das mais belas, valiosas e fascinantes gemas que o mundo já tinha visto: a “Turmalina Paraíba”. Ela pertence ao grupo de minerais genericamente denominados de turmalinas, o que inclui minerais com enorme variabilidade de composição e de cores.  Os minerais do grupo das turmalinas apresentam-se em cristais alongados com uma base triangular. 

A Turmalina Paraíba pertence ao  subgrupo elbaíta, e destaca-se pela cor azul néon (podendo variar para verde ou lilás néon).  Veja alguns exemplos abaixo.

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(a) Exemplares de elbaítas coloridas, apresentando hábito prismático trigonal e estrias longitudinais características – extraído de Trinchillo et al. (2015). (b) Modelo cristalográfico da turmalina elbaíta com vista a partir da sua seção basal triangular. (c) Modelo tridimensional da estrutura cristalina da turmalina elbaíta. (mindat.org e Museu de Minerais, Minérios e Rochas Heinz Ebert. /Reprodução)

A Turmalina Paraíba possui uma fórmula química bem complexa, com quantidades consideráveis de elementos incomuns na crosta terrestre, como lítio, boro, cromo e flúor. O intenso azul turquesa e o brilho “neon” ou “elétrico” são diferenciais que fazem dela uma gema excepcional e única no mundo.  A variação de cor entre os exemplares normalmente depende de elementos químicos denominados cromóforos. Altas concentrações (acima de 2%) de cobre são responsáveis pela sua cor azul peculiar.

Foto da Turmalina Paraíba.
Exemplar de Turmalina Paraíba, com sua cor azul turquesa característica (Robert Weldon/GIA; courtesy of David Bindra, B&B Fine Gems./Reprodução)

A Turmalina Paraíba (assim como outras variedades de turmalinas) é encontrada em pegmatitos graníticos: rochas de origem ígnea  compostas por minerais de grande tamanho, centimétrico a decimétrico. Em geral, os pegmatitos ocorrem em veios ou diques que alcançam metros de extensão; eles são conhecidos por hospedar minerais exóticos, muitos deles com potencial para aproveitamento – como as gemas.

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Cristais de turmalina Paraíba, associadas a quartzo e albita.
Agregado de cristais de turmalina elbaíta em pegmatito granítico – extraído de Beurlen et al. (2011). (Beurlen et al.,2011/Reprodução)
Foto de 8 turmalinas.
Cristais lapidados de Turmalina Paraíba com teores variados de cobre, responsáveis pela variação dos tons de azul – extraído de Katsurada et al. (2019). (Robert Weldon/GIA; courtesy of Gerhard Becker./Reprodução)

A Turmalina Paraíba é rara e só é encontrada na Província Pegmatítica da Borborema, situada entre os estados da Paraíba e Rio Grande do Norte, além da Nigéria e Moçambique, na África. 

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Mapa geológico com a indicação da área de abrangência da Província Pegmatítica da Borborema. Os pegmatitos graníticos onde a Turmalina Paraíba é encontrada estão representados pelas estrelas vermelhas – modificado de Soares (2004). (Modificado de Soares (2004)/Reprodução)

A Província Pegmatítica da Borborema possui mais de 750 pegmatitos identificados. Muitos deles representam reservas estratégicas de lítio, berílio, bismuto, nióbio e tântalo, inclusive alguns foram explorados desde a Primeira Guerra Mundial.

As rochas que compõem essa província foram formadas na convergência entre os continentes sul-americano e africano, durante a formação do Supercontinente Gondwana há aproximadamente  510  milhões de anos atrás. Isso explica a ocorrência da Turmalina Paraíba nos dois lados do Atlântico.

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Reconstituição geográfica-geológica da disposição dos continentes sul-americano e africano mostrando a distribuição dos depósitos de Turmalina Paraíba (estrelas vermelhas) no momento de sua formação. (Modificado de Soares (2004)/Reprodução)

 A distribuição da Turmalina Paraíba nos pegmatitos  ocorre comumente na zona intermediária de cristais coloridos de elbaíta, que possuem um núcleo rosa a vermelho (rico em alumínio e manganês) e borda verde a verde escura (rica em ferro e magnésio). Isso indica que a Turmalina Paraíba se formou durante os últimos estágios de cristalização do magma que deu origem aos pegmatitos mineralizados, numa condição em que boa parte do ferro e magnésio havia sido consumida na cristalização de outras variedades de turmalina – como schorlita e dravita, menos apreciadas pelo mercado joalheiro.

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(a) Contato entre o pegmatito Capoeira – único produtor da Turmalina Paraíba em atividade no Brasil – e sua rocha hospedeira, um metaconglomerado. Grandes cristais de turmalina preta (schorlita) ocorrem próximos à zona de contato. (b) Exemplar de elbaíta com variação de cores associada à mudança da composição química. A seta amarela indica uma porção reliquiar de Turmalina Paraíba (PT) – extraído de Beurlen et al. (2011). (Modificado de Soares (2004)/Reprodução)

Atualmente, a maioria das minas de Turmalina Paraíba no Brasil estão exauridas a única ainda em operação está localizada no município de Parelhas (pegmatito Capoeira), Rio Grande do Norte. As turmalinas encontradas na Nigéria e Moçambique, apresentam em geral  qualidades gemológicas inferiores às encontradas no nordeste brasileiro. As gemas brasileiras são reconhecidas por laboratórios internacionais como Gemological Institute of America e Swiss Gemmological Institute.  Dependendo da qualidade da gema, o quilate ( 0,2 gramas) da Turmalina Paraíba pode variar de alguns milhares a centenas de milhares de dólares. Um pingente, brinco ou anel de ouro cravejado com Turmalina Paraíba pode atingir valores superiores a US$600.000 (equivalente a R$3 milhões). 

O Brasil destaca-se então como o principal fornecedor de uma das mais belas e valiosas pedras preciosas já encontradas na Terra.

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Fontes:

Beurlen, H., Moura, O. J. M., Soares, D. R., Da Silva, M. R. R., Rhede, D., 2011. Geochemical and Geological Controls on the Genesis of Gem-Quality “Paraíba Tourmaline” in Granitic Pegmatites from Northeastern brazil. The Canadian Mineralogist 49, p. 277-300.

Katsurada, Y., Sun, Z., Breeding, C. M., Dutrow, B. H., 2019. Geographic origin determination of Paraíba Tourmaline. Gems and Gemology 55, p. 648-659.

Soares, D. R., 2004. Contribuição a petrologia de pegmatitos mineralizados em elementos raros e elbaítas gemológicas da Província Pegmatítica da Borborema, NE-Brasil. Tese de Doutorado, Universidade Federal de Pernambuco, 286 p.

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Soares, D. R., Beurlen, H., Da Silva, M. R. R., Gonzaga, F. A. S., Santos Filho, J. I., Oliveira, H. B. L., 2018. Variedades Gemológicas de Minerais da Província Pegmatítica da Borborema, NE do Brasil: Uma Síntese. Estudos Geológicos 28(1), p. 56-71.

Trinchillo, D., Pezzota, F., Dini, A., 2015. The Pederneira Mine. The Mineralogical Record 46(1), 138 p.

Agradecimentos: Dr. Dwight Rodrigues Soares (professor do IFPB, campus Campina Grande) e Josenildo Isidro Santos Filho (graduando em Engenharia de Minas da UFCG).

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