Como uma banana presa com fita na parede passou a valer mais de R$ 5 milhões
A feira está cara na sua cidade? Conheça a história da obra “Comedian”, que foi leiloada por US$ 1 milhão em Nova York.
O sacolão pode até estar caro na sua cidade, mas não mais do que na casa de leilões Sotheby’s, em Nova York. Recentemente, a casa vendeu por US$ 1 milhão (cerca de R$ 5,74 milhões) uma obra chamada “Comedian”, do artista italiano Maurizio Cattelan. Criada em 2019, a obra inusitada consiste em uma banana presa na parede com silver tape e chamou muita atenção desde o começo.
Os visitantes e os críticos de arte estavam igualmente perdidos: será que era uma pegadinha? Uma crítica social ao mercado de arte contemporânea? Ninguém havia decidido ainda quando outro artista tirou a banana da parede e a comeu. Uma performance conceitual?
Uma banana reserva foi colocada no mesmo lugar, e a história toda viralizou. Logo, a obra começou a receber uma multidão em busca de selfies, e foi mais do que a galeria podia receber. Ainda em 2019, três edições foram vendidas por entre US$ 120 mil e US$ 150 mil (entre R$ 689 mil e R$ 868 mil, aproximadamente).
“Temos plena consciência do absurdo flagrante do fato de que “Comedian” é um produto barato e perecível e alguns centímetros de fita adesiva”, disseram os Coxes, o casal que comprou uma das edições em 2019, em entrevista à AP News. “Na verdade, sentimos que a banana de Cattelan se tornará um objeto histórico icônico.”
Na prática, o que está sendo vendido não é a banana em si, já que a original já pereceu há muito tempo. Tanto a banana quanto a fita foram pensadas para serem substituídas regularmente.
O montante milionário foi dedicado a um certificado de autenticidade que concede ao proprietário a permissão e a autoridade para reproduzir essa banana e a fita adesiva em sua parede como uma obra de arte original de Maurizio Cattelan. O diretor de arte contemporânea da Sotheby’s, David Galperin, a considera profunda e provocativa.
“O que Cattelan está realmente fazendo é virar um espelho para o mundo da arte contemporânea e fazer perguntas, provocando reflexões sobre como atribuímos valor às obras de arte, o que definimos como obra de arte”, disse Galperin em entrevista à AP News.
O título da obra (“O Comediante”) sugere que a peça não pretendia ser levada a sério. Para muitos, ela era apenas uma crítica aos colecionadores abastados que frequentavam a primeira feira em que estreou. Além disso, seu caráter polêmico e inusitado poderia ser um bom chamariz de audiência nas redes sociais.
Mas o autor rechaça essa interpretação. “Para mim, Comedian não era uma piada; era um comentário sincero e uma reflexão sobre o que valorizamos.” disse Cattelan em 2021, em entrevista ao The Art Newspaper. “Nas feiras de arte, a velocidade e os negócios imperam, então eu via as coisas da seguinte maneira: se eu tivesse que estar em uma feira, poderia vender uma banana como os outros vendem suas pinturas. Eu poderia jogar dentro do sistema, mas com minhas regras.”
A obra, que não deixa de ser polêmica, é comparada por alguns críticos à outros fenômenos da arte contemporânea, como as latas de sopa de Andy Warhol (1962) e a obra “Fountain” de Marcel Duchamp (1917). São obras que provocaram discussões profundas sobre o valor e o papel da arte, ao questionar o que pode ou não ser considerado arte.
“As obras de arte mais influentes e radicais do século passado tiveram o poder de mudar fundamentalmente as percepções sobre a natureza da própria arte. Nesse espírito, Comedian é uma obra desafiadora de puro gênio.” disse Galperin, em comunicado. “Se, em sua essência, Comedian questiona a própria noção do valor da arte, colocar a obra em leilão em novembro será a realização definitiva de sua ideia conceitual essencial – o público finalmente terá uma palavra a dizer para decidir seu verdadeiro valor.”