Globo de Ouro: 6 vezes em que o prêmio foi acusado de corrupção
Em 2019, jurados da premiação foram convidados para conhecer o set de “Emily em Paris” na França – o que pode ter influenciado na indicação da série ao prêmio. Entenda esse e outros casos polêmicos.
Nesta semana, o jornal americano Los Angeles Times publicou uma reportagem denunciando os casos de corrupção do Globo de Ouro, com foco no escândalo mais recente: a controversa indicação de Emily em Paris, da Netflix, ao prêmio de Melhor Comédia de TV. De acordo com a investigação, os jurados teriam recebido alguns “mimos” e regalias da produção da série – o que pode ter pesado na hora da escolha.
A série protagonizada por Lily Collins (que também foi indicada na categoria de Melhor Atriz em Série de Comédia ou Musical) agradou o público jovem, mas, a julgar pelas críticas mistas, a indicação ao prêmio foi recebida com surpresa. Isso porque seus episódios não levantam debates de interesse público – sem mencionar a falta de representatividade no elenco.
A própria roteirista de Emily em Paris, Debora H. Copaken, reforçou esse posicionamento. Em uma carta aberta publicada no jornal britânico The Guardian, ela questionou a falta de indicações ao Globo de Ouro para a série I May Destroy You, da HBO, que aborda questões como racismo e abuso sexual.
Segundo a reportagem do LA Times, membros da Hollywood Foreign Press Association (HFPA) – a organização sem fins lucrativos formada por 87 jornalistas internacionais responsável pelo Globo de Ouro – teriam sido convidados para conhecer o set de Emily em Paris na França. Em 2019, a Paramount Network, canal que criou a série originalmente, pagou para 30 jurados da HFPA duas diárias no hotel cinco estrelas The Peninsula Paris, onde o preço dos quartos parte dos US$ 1.400 por noite.
Além disso, o grupo foi convidado para uma entrevista coletiva com direito a almoço no Musée des Arts Forains, um museu que só pode ser acessado com reserva prévia – e que foi palco de algumas cenas da série. O problema: o teto da associação para presentes é de US$ 125 por produção. Pegou mal.
O caso recente não é o único. Em quase oito décadas de prêmio, o Globo de Ouro já foi palco para uma série de histórias, no mínimo, controversas. Conheça algumas delas:
1968 – Primeiros Erros
A primeira cerimônia do Globo de Ouro aconteceu em 1944, e a primeira grande polêmica rolou 24 anos depois. Na época, a Comissão Federal de Comunicações dos Estados Unidos descobriu que o público estava sendo enganado quanto à forma de como a HFPA escolhia seus vencedores.
Um dos pontos desvendados pela comissão é que a presença na noite de entrega dos prêmios poderia pesar na hora de escolher os vencedores. Exemplo: suponhamos que Leonardo DiCaprio ganhasse um Globo de Ouro, mas não pudesse comparecer à cerimônia – ele poderia estar ocupado incendiando a Amazônia, afinal. Pelo protocolo antigo, a HFPA poderia acabar dando preferência a outro ator que estivesse presente.
Após a descoberta, a comissão acabou censurando o canal NBC, que transmitia o programa na época. O Globo de Ouro só voltou a ser transmitido em rede nacional dez anos depois, em 1974. A HFPA prometeu consertar a situação e contratou a empresa Ernst & Young para conduzir o processo de apuração das cédulas com mais segurança e confiabilidade.
1982 – Vegas, baby
A entrada da Ernst & Young parece não ter ajudado tanto, já que outras polêmicas voltaram a aparecer. Em 1982, a atriz Pia Zadora recebeu o prêmio de Revelação Feminina do Ano por sua atuação no filme Butterfly. A controvérsia já começava por aí: o longa era considerado trash, trazendo uma relação incestuosa entre um pai com sua filha. Além disso, a atriz era desconhecida, e poucos tinham visto sua atuação. O filme só seria lançado de forma independente uma semana depois da premiação.
Acontece que Zadora era casada com o bilionário israelense Meshulam Riklis, que tinha entre suas propriedades o Riviera Hotel and Casino, em Las Vegas. Poucas semanas antes da votação, ele levou membros da HFPA para uma exibição privada do filme em seu estabelecimento. Outros jurados, que não puderam comparecer em Vegas, foram convidados à casa do casal em Beverly Hills para contemplar o longa. Neste ano, a emissora CBS, que transmitia a premiação pela segunda vez, encerrou o seu contrato com a HFPA.
1996 – Alfinetada
Nos anos 1990, um artigo publicado no The Washington Post trouxe mais acusações à organização do prêmio. O texto narrava, com indignação, os hábitos de alguns membros do comitê, que incluíam, entre outras coisas, “um fluxo interminável de presentes, quartos de hotel e refeições gratuitas nos grandes estúdios”, além de diversas viagens promocionais às quais os críticos tinham acesso.
Até mesmo a credibilidade dos jornalistas membros da HFPA foi confrontada, já que muitos atuavam apenas como freelancers, escrevendo cerca de cinco artigos por ano. Sharon Waxman, autora da reportagem do Post, comentou ainda sobre a vitória de Al Pacino na categoria de Melhor Ator por Perfume de Mulher em 1993. Na época, todos os membros do HFPA foram à Nova York em uma viagem promocional que envolvia entrevistas com o protagonista. Não se sabe se foi o comitê ou o estúdio quem pagou pela viagem – mas a coincidência causou burburinhos.
1999 – Volte o ponteiro
Tempo ruim: naquele ano, a HFPA teve que devolver 82 relógios da marca Coach, avaliados em mais de US$ 400 cada (US$ 628 em valores atuais). O presente havia sido entregue pela produtora USA Films (hoje Focus Feature) como uma possível tentativa de conseguir destaque para a atriz Sharon Stone pelo filme A Musa. Ela foi indicada por sua atuação, mas não levou o troféu.
2016 – Just Do It
Em 2016, Denzel Washington fez uma brincadeira que deve ter deixado a HFPA de bochechas rosadas. O ator recebeu o prêmio Cecil B. DeMille, uma homenagem para aqueles que contribuíram de forma significativa para a indústria do entretenimento.
Durante seu discurso, Washington revelou algo que escutou de Freddie Fields, produtor de Tempo de Glória, filme que levou o ator a ganhar seu primeiro Globo de Ouro em 1990. Ele revelou que, naquela época, Fields o convidou para almoçar com membros da HFPA e explicou o esquema: os jurados chegariam para almoçar com tudo pago, assistiriam ao filme, tirariam algumas fotos e, por fim, Denzel ganharia o prêmio – e ganhou. O tom usado pelo ator foi inofensivo, mas reforçou a antiga teoria de corrupção por trás do show.
Além dos casos acima, a reportagem do Los Angeles Times reforçou que a HFPA tem ainda outros casos de corrupção dentro da própria associação, como pagamentos exorbitantes aos membros da associação. Para além das polêmicas, o comitê se apoia na filantropia, e doa milhões de dólares para causas de apoio às artes e ao jornalismo.
A 78ª edição do Globo de Ouro ocorrerá no próximo domingo (28) às 22 horas (horário de Brasília). Em razão da pandemia de Covid-19, o formato da premiação deverá ser total ou parcialmente virtual. Você poderá acompanhar o show pelo canal de televisão a cabo TNT.
A lista completa de indicados pode ser encontrada clicando neste link.