Sérgio Gwercman
Diagnosticado com um tumor cerebral, Anthony Burgess desandou a escrever. Pariu seis livros em um ano para garantir o sustento da viúva. Saiu tudo ao contrário. O tumor não existia – era um diagnóstico malfeito. E dinheiro, que é bom, o inglês só veria uma década depois, em 1971, quando um dos livros foi levado ao cinema por Stanley Kubrick. Era Laranja Mecânica, que ganha nova tradução para o português. Numa das adaptações mais fiéis do cinema, Kubrick retratou uma Inglaterra futurista, onde prisões pretendem usar violência para recuperar criminosos. A cobaia é o delinqüente Alex, que agrediu e estuprou um casal para se divertir. O cinema touxe à tona esse clássico que passara quase despercebido. Pelo menos Burgess sobreviveu ao falso tumor – e pôde desfrutar a consagração como um dos ícones da ficção científica moderna.
• Violência exagerada? Burgess diz que não. Parte da inspiração para a trama saiu de um espancamento que sua mulher (grávida) sofreu nas ruas de Londres.
• Nadsat é o nome do idioma que Burgess criou para escrever Laranja Mecânica. Misturando inglês e russo, o nadsat sai da boca de Alex como gírias saem da boca de um adolescente. O livro vem com um glossário no final, que não existia na primeira edição em inglês. Burgess preferia o estranhamento do leitor desentendido.
• James Joyce, de quem Burgess era fã declarado, tem influência marcante. As palavras em nadsat muitas vezes lembram a escrita do irlandês, autor de Finnegans Wake.
• A primeira edição lançada nos Estados Unidos não tinha o último capítulo do livro – os editores não gostaram do final original. E foi numa edição incompleta que Kubrick baseou seu filme.
LARANJA MECÂNICA
Anthony Burgess
Aleph, 227 páginas, R$ 19